PUBLICIDADE
PUBLICIDADE

Gigante na indústria musical, Ludmilla não se intimida com racismo e tentativas de boicote

24 de junho de 2020

Aos 25 anos, cantora construiu uma carreira sólida e significativa; recentemente, a artista premiada, negra e LGBT tornou público desafetos na música e foi alvo de ofensas racistas

Texto: Anna Laura Moura | Edição: Nataly Simões | Imagem: Reprodução

Quer receber nossa newsletter?

Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!

O nome da cantora Ludmilla tem circulado pelos veículos de comunicação e pelas redes sociais mais do que o comum. Após expor desafetos no meio musical, Ludmilla foi alvo de ataques racistas. Intitulado “Carta Aberta”, o vídeo contém prints e áudios da cantora Anitta e a explicação da funkeira sobre os fatos.

Após a exposição, a premiada cantora negra e LGBT recebeu uma chuva de ofensas de cunho racial em suas redes sociais, e vem sendo atacada desde então. É preciso lembrar que, aos 25 anos, Ludmilla construiu uma carreira sólida e significativa.

Cria de Duque de Caxias, município da Baixada Fluminense (RJ), Ludmilla é filha de Silvana Sales Oliveira e foi criada pela mãe, pelo padrasto e com a ajuda da avó e de um tio. De origem pobre, viveu momentos difíceis com a família após a prisão do pai biológico, quando ela tinha somente um mês de vida. Até hoje, o relacionamento da cantora com o pai ainda é estreito e distante, tendo o tio e o padrasto como referências de afeto e paternidade.

Os primeiros anos de vida foram duros. Segundo Silvana, sua mãe, foi preciso passar fome para que Ludmilla pudesse comer. Em meio às dificuldades da infância, havia um ponto de conforto: a música, e foi aí que o talento da artista foi descoberto. Aos oito anos, já cantava nas festas de família e também flertava com o pagode ao lado de seu padrasto. A partir desse marco, a família percebeu que a cantora tinha jeito para a vida artística.

O ciclo de MC Beyoncé

Inicialmente, Ludmilla tentou se inserir na indústria musical com a publicação no YouTube de vídeos cantando, mas seu material não tinha alcance relevante. Até que um dia, em uma festa, o DJ do evento precisava de alguém que rimasse. Ela era única no local que sabia e arriscou: obteve não só aplausos, mas sua influência no ramo aumentou.

Através de seu tio, a artista conheceu o empresário e MC Roba Cena, que trabalhava com o gênero do funk. Foi através do single “Fala Mal de Mim”, em maio de 2012, que nasceu a MC Beyoncé, com pseudônimo inspirado na artista global Beyoncé. A funkeira tem a cantora estadunidense como sua maior inspiração. Em entrevista ao programa Domingo Espetacular, exibido pela Record TV, Ludmilla disse que indo a uma feira viu Beyoncé dançando e cantando em um DVD e ficou admirada.

O single “Fala Mal de Mim” ficou mundialmente conhecido e foi um divisor de águas na carreira da cantora. O pseudônimo de MC Beyoncé, no entanto, logo caiu por terra. Um ano depois, a artista publicou um vídeo no YouTube, em que, aos prantos, alegava ter sido ameaçada de morte pelo empresário MC Roba Cena. Ludmilla disse que foi roubada pelo MC e que, quando tentou “andar com as próprias pernas”, ele a atrapalhou. Após o ocorrido, a cantora anunciou que começaria a utilizar seu nome de batismo e abandonaria o nome artístico, pois estava ligado ao empresário.

A decolagem de Ludmilla

Em 2014, começava um novo ciclo para a artista. Ao assinar contrato com a Warner Music Brasil, em janeiro do mesmo ano lançou o single “Sem Querer”, atendendo pelo nome de MC Ludmilla. Este seria seu primeiro trabalho após aposentar o “MC Beyoncé”. Depois do lançamento do videoclipe da música, a cantora afirmou que passaria a se auto intitular somente como Ludmilla. O motivo é que os MCs sofriam muito preconceito, e acreditava que chamar-se somente pelo nome seria mais benéfico.

Não foi somente a mudança de nome artístico que marcou a nova fase de Ludmilla: com uma equipe estruturada de músicos, bailarinos, DJ, técnico de som, personal stylists e duas assessoras, Ludmilla triplicou o seu cachê e fazia, em média, 30 shows por mês. Tudo isso sempre com a mãe e o tio, agora como empresário, acompanhando de perto.

A partir daí, o nome Ludmilla ficaria cada vez mais conhecido, com singles famosos e presentes nas caixas de som. Seis meses depois, o álbum “Hoje” seria lançado, com participações de grandes artistas como Belo e Buchecha. Houve espaço para clipes, como o próprio single “Hoje”, “Te Ensinei Certin” e, no ano seguinte, “Não Quero Mais” e “24 Horas Por Dia”, essa última o quinto single do álbum. Essa canção, em especial, chegou na 46ª posição na parada musical Billboard Brazil Hot 100 Airplay, e também entre as 10 melhores posições de estações de rádios do país.

Ludmilla não parou por aí: os anos seguintes continuariam bombando com seus singles. Em Outubro de 2016, a cantora lançou o álbum “A Danada Sou Eu” com a participação de Felipe Ret, Jeremih e Gusttavo Lima. O primeiro single dessa produção traria ousadia e o outro lado da artista sempre ligada ao funk: a música com um ar mais pop e R&B gerou surpresa e críticas positivos. “Cheguei” também foi recebida pelo público com sucesso.

Os anos de 2017 e 2018 também foram de produções com grandes nomes, como “Só Vem”, ao lado de Thiaguinho. “Din Din Din”, por exemplo, foi o marco de junho de 2018. No mês seguinte, participou do single “Meu Baile”, do produtor musical Papatinho. Ao mesmo tempo em que em setembro foi a artista convidada na canção “Batom”, com MC Kekel.

Em 2019, cantou ao lado de Simone & Simaria, Jão, Ferrugem e Léo Santana. O álbum lançado, “Hello Mundo”, rendeu muitos frutos para a artista, com grandes músicas como “Favela Chegou” e “A Boba Fui Eu”.

Além disso, Ludmilla também consolidou sua participação na televisão brasileira, sendo campeã do quadro Dança dos Famosos, no Domingão do Faustão. No fim do ano, a artista lançaria a polêmica “Verdinha”, que despertou reações tanto positivas quanto negativas.

Na época, o Partido Social Liberal (PSL) do estado de Minas Gerais, entrou com uma representação contra Ludmilla na Polícia Federal e no Ministério Público Federal, além de pedir uma nota de repúdio da Câmara dos Deputados por conta da canção. De acordo com um parlamentar do partido, a letra de “Verdinha” é “infeliz”. faz “apologia à maconha”e “incentiva adolescentes a praticarem condutas criminosas”.

A cantora rebateu e recordou que existiam problemas sociais no país que exigiam mais atenção das autoridades do que a canção. “Milhões de brasileiros desempregados, sem moradia, hospitais sem vagas, a violência predominante, poluição, a questão ambiental, a rede pública de educação miserável, mas o maior problema que o Brasil tem no momento é uma música que fala de alface”, afirmou.  Ludmilla explicou que a música e o videoclipe foram inspirados na canção “Pour It Up”, de Rihanna.

No final de 2019, Ludmilla surpreendeu o público com o lançamento de um EP de pagode chamado “Numanice”. O álbum foi resultado de uma promessa feita por Ludmilla no Twitter. A cantora havia afirmado que caso ganhasse o Prêmio Multishow gravaria o EP. As canções do gênero foram bem recebidas como todos os outros trabalhos da artista.

Bissexualidade, racismo e o marco do Prêmio Multishow

Não é somente do sucesso na música que Ludmilla é feita. Em 2018, a cantora assumiu ser bissexual e tornou público o relacionamento com Bruna Gonçalves, dançarina de sua equipe. No ano seguinte, o casal oficializou judicialmente a relação. Uma atitude significativa para a luta LGBT.  Durante a participação no programa Altas Horas, da TV Globo, a artista afirmou que não assumiu sua orientação sexual, mas sim o relacionamento em si. “Resolvi tornar público porque muitas pessoas perguntavam, e também porque quando íamos a lugares não respeitavam a gente”, explicou.

Como todo casal LGBT, Ludmilla e Brunna tiveram medo mas não se intimidaram com as acusações de oportunismo para alavancar a carreira, partindo de algumas partes do público. A artista contou, no programa, que se sente bem por estar sendo ela mesma. “Toda decisão que vou tomar, sempre tenho receio de qualquer coisa, porque hoje está tudo muito louco”, desabafou. “Sejam independentes! Porque, quando vocês são independentes, podem fazer o que quiserem da vida”, concluiu.

Todo o sucesso, esforço e resistência de Ludmilla resultaram não só no sucesso e alcance de suas músicas, mas também na conquista de dois troféus no Prêmio Multishow, são eles: “Cantora do Ano” e “Música Chiclete”, com o hit “Onda Diferente”. Recebida por aplausos e também com algumas vaias e gritos de “macaca”, Ludmilla fez um discurso históricos em meio a lágrimas.

“É o choro de uma luta muito grande, muito longa. Eu só queria dizer para todas as meninas, todas as mulheres que nunca mesmo deixem alguém falar o que você é ou o que você pode ser na vida “, disse. “Obrigada pelas vaias, elas me fazem sempre pensar no que eu gostaria ou não que fizessem com as pessoas”, ressaltou.

As vaias e os xingamentos foram repudiados, e o ocorrido surgiu depois de, Ludmilla, no Twitter, agradecer Ivete Sangalo por ter cantado a música no Rock in Rio. Depois, a cantora esclareceu que a música foi escrita apenas por ela e que a gravadora só quis produzir depois que Anitta demonstrou interesse.

Após esse fato, Ludmilla expôs sua insatisfação com relação à Anitta em seu Instagram, conforme citado no início deste texto, e os ataques racistas se intensificaram. Ela alegou, também, que a cantora pop a chamava de “Projetinho de Alcione”, em tom pejorativo.

Apesar das ameaças e das ofensas, Ludmilla não se intimidou com nenhum dos ataques. “É uma honra ser comparada com a Alcione, uma das minhas maiores inspirações”, afirmou a cantora durante o vídeo que postou. A artista também problematizou o tratamento que recebia, sempre que se envolvia em algum atrito com Anitta.

Segundo ela, diziam que deveria ficar quieta, pois jamais seria capaz de defender-se. “Ouvi que tinha que ficar em silêncio, afinal nem deveria estar ocupando o lugar que ocupo. Eu, como mulher preta, sinto isso. As pessoas querem que eu fique no meu canto”, desabafou.

No dia 18 de junho, também no Twitter, Ludmilla afirmou que não irá se calar e que pretende denunciar todos os ataques. “Não vou me esconder. Há muito para ser transformado e estou cada dia mais atenta”, reforçou.

Apoie jornalismo preto e livre!

O funcionamento da nossa redação e a produção de conteúdos dependem do apoio de pessoas que acreditam no nosso trabalho. Boa parte da nossa renda é da arrecadação mensal de financiamento coletivo.

Todo o dinheiro que entra é importante e nos ajuda a manter o pagamento da equipe e dos colaboradores em dia, a financiar os deslocamentos para as coberturas, a adquirir novos equipamentos e a sonhar com projetos maiores para um trabalho cada vez melhor.

O resultado final é um jornalismo preto, livre e de qualidade.

Leia Mais

PUBLICIDADE

Destaques

AudioVisual

Podcast

papo-preto-logo

Cotidiano