Ministro da Justiça disse, em audiência no Senado, que a denúncia do movimento negro contra seu pacote é fruto de “incompreensão”
Texto / Simone Freire | Imagem / Pedro Borges
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“Estes grupos que foram reclamar [na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, CIDH] quanto ao projeto, com todo respeito, é fruto de incompreensão. Às vezes, um fruto de preconceito, às vezes, fruto de alguma influência político-partidária”. Esta declaração foi dada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, durante sua participação em uma audiência no Senado Federal, nesta quarta-feira (8).
Para Winnie Bueno, Iyalorixá, bacharel e mestranda em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos e integrante da Rede de Ciberativistas Negras no Rio Grande do Sul, a primeira coisa a se apontar sobre a declaração do ministro é de que ela é racista.
Ela justifica sua avaliação frisando que uma série de outras entidades apresentaram críticas bastante contundentes ao pacote, como é o caso da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), mas que estas, em nenhum momento, foram questionadas pelo ministro. “Moro vai questionar a compreensão das entidades a respeito do projeto de lei quando estes questionamentos partem de entidades e organizações dos movimentos sociais negros”, disse.
A fala do ministro diz respeito ao documento criado por diversas entidades e organizações do movimento negro brasileiro, protocolado e aceito na CIDH, órgão vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), em fevereiro. No documento, os movimentos denunciam diversos pontos que tendem a prejudicar diretamente a realidade dos afrodescendentes no país.
A iniciativa foi citada na audiência do Senado pela deputada Aúrea Carolina (Psol), que pediu uma posição do ministro a respeito dos apontamentos feitos pelos movimentos no documento, e sobre a participação de uma comitiva na 172ª audiência da CIDH, nesta quinta-feira (9), em Kingston (Jamaica).
Para a parlamentar, o ministro agiu de forma leviana e incompatível com o cargo que ocupa, uma vez que desqualificou as entidades que apresentaram a denúncia na CIDH como se o grupo tivesse preconceito e interesses partidários contra o “pacote anticrime”.
“O ministro demonstra que não só desconhece a seriedade do grupo como também a vasta fundamentação em estudos e dados que comprovam a realidade do genocídio da população negra no Brasil. A fala do Moro expõe um governo baseado em mentiras, ataques e desinformação, que persegue a sociedade civil, despreza a democracia e viola tratados internacionais de direitos humanos”, disse.
Winie Bueno é uma das integrantes da comitiva que esteve na Jamaica para denunciar o pacote de Moro. Segundo ela, por mais que o governo de Jair Bolsonaro (PSL) esteja comprometido em cortar e congelar verbas da Educação, as políticas públicas promovidas pela luta do movimento social negro proporcionou que pessoas negras estivesse e estejam nas universidades, inclusive, em cursos de Direito.
“Há pessoas negras formadas em Direito que entendem de maneira bastante técnica o conteúdo deste projetos de lei e que podem dizer, sem nenhuma dúvida, que em uma série de medidas ele é flagrantemente inconstitucional e completamente em desacordo com uma série de tratados internacionais que tratam de direitos humanos nos quais este país é signatário”, disse.
Além disso, ela salienta que, além dos quesitos técnicos suficientes para entender a avaliar as mudanças propostas pelo Ministério da Justiça, todos os representantes dos movimentos e entidades articulados contra o pacote tem um diferencial.
“As vivências das pessoas que compõem estas organizações lhes dá conhecimento para compreender de maneira plena o que está contido nestas propostas de alteração tanto de maneira implícita quanto de maneira explícita”, disse.