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Trabalho infantil negro é maior por herança da escravidão

21 de maio de 2019

Números só começaram a ser apresentados nas últimas pesquisas, mas podem ser explicados por um olhar histórico, segundo especialistas que trabalham com o tema

Texto / Guilherme Soares Dias / Reprodução do portal Rede Peteca | Imagem / Marcello Vitorino

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Os dados de trabalho infantil no Brasil mostram que as crianças negras representam 62,7% da mão de obra precoce no país. Quando se trata de trabalho infantil doméstico, esse índice aumenta para 73,5%, sendo mais de 94% meninas. Esses números só começaram a ser apresentados nas últimas pesquisas, mas podem ser explicados por um olhar histórico, segundo especialistas que trabalham com o tema.

“A questão é permeada por um racismo estrutural, uma vez que pessoas negras, escravizadas e libertas, não tiveram inserção de trabalho, de forma digna, com direitos assegurados, com estrutura mínima que permitisse acesso aos demais direitos”, afirma Elisiane Santos, procuradora e vice Coordenadora de Combate à Discriminação no Ministério Público do Trabalho de São Paulo (MPT-SP).

O que Elisiane chama de “falsa abolição” teve e ainda tem impacto sobre várias gerações. Não por acaso, este 13 de maio, data em que a Lei Áurea encerrou o regime escravocrata oficialmente, em 1888, é considerado uma falsidade histórica pelo movimento negro, que hoje celebra o Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo.

Temos cenários de escravização de pessoas negras até hoje. Não é algo formal, mas uma escravidão contemporânea. Isso afeta homens e mulheres, mas também crianças”, observa Elisiane.

Há famílias que conseguiram quebrar esse ciclo, mas, historicamente, quem sofre mais com a situação de desigualdade social é a população negra. “São as pessoas que estão sem trabalho, em condição de pobreza e miséria absoluta. As raízes dessa desigualdade também se assentam nesse racismo estrutural”, diz a procuradora.

Por conta desse contexto, Elisiane defende ações afirmativas para aumento da representatividade negra nos diferentes espaços, além da inserção de jovens negros na faculdade. “Quando falamos de legalidade, ações afirmativas não significam reparação histórica, mas sim reconhecimento dos direitos fundamentais. E nós teríamos que ir muito além disso, com distribuição de terra, indenizações. Isso é que é reparação e não é discutido”, ressalta.

A procuradora lembra do tratamento que o Estado Alemão deu às vítimas do nazismo, condenando empresas privadas que exploraram o trabalho forçado de judeus a pagarem indenizações. No Brasil, o acerto de contas com o passado nunca aconteceu, pelo contrário: no fim do regime escravocrata, a legislação previa indenização aos proprietários de escravos.

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Menino deixa casa a caminho da escola no Jardim Ângela, um dos distritos mais pobres da capital paulista. Crédito: Tiago Queiroz

Hoje, o Estatuto da Igualdade Racial, instituído em 2010, traz a responsabilidade do governo de incentivar a iniciativa privada a contratar negros e brancos em condições de igualdade:

ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL

Art. 39. O poder público promoverá ações que assegurem a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho para a população negra, inclusive mediante a implementação de medidas visando à promoção da igualdade nas contratações do setor público e o incentivo à adoção de medidas similares nas empresas e organizações privadas.
1o A igualdade de oportunidades será lograda mediante a adoção de políticas e programas de formação profissional, de emprego e de geração de renda voltados para a população negra.
2o As ações visando a promover a igualdade de oportunidades na esfera da administração pública far-se-ão por meio de normas estabelecidas ou a serem estabelecidas em legislação específica e em seus regulamentos.
3o O poder público estimulará, por meio de incentivos, a adoção de iguais medidas pelo setor privado.
4o As ações de que trata o caput deste artigo assegurarão o princípio da proporcionalidade de gênero entre os beneficiários.
5o Será assegurado o acesso ao crédito para a pequena produção, nos meios rural e urbano, com ações afirmativas para mulheres negras.
6o O poder público promoverá campanhas de sensibilização contra a marginalização da mulher negra no trabalho artístico e cultural.
7o O poder público promoverá ações com o objetivo de elevar a escolaridade e a qualificação profissional nos setores da economia que contem com alto índice de ocupação por trabalhadores negros de baixa escolarização.

Já avançamos no ingresso na universidade, agora temos que avançar nessa questão da igualdade racial no trabalho”, considera a procuradora do MPT-SP, relacionando a situação ao trabalho infantil negro. “Os trabalhadores infantis são oriundos de famílias em condição de pobreza ou baixa renda, mas que estão mudando de mentalidade: em vez verem o trabalho infantil como algo bom, desejam que os filhos tenham excelente formação.”

Isso ocorre, segundo Elisiane, em contraponto a uma cultura construída para sustentar o sistema desigual, em que o trabalhador é explorado e aqueles que se beneficiam continuam com seus privilégios. Nesse contexto, ela reforça que a pessoa negra é colocada em condição de inferioridade. “São pessoas sem acesso a informação. Têm essa visão de baixar a cabeça”, considera.

As tragédias cotidianas vão sendo naturalizadas também ancoradas nesse racismo estrutural. “Há uma diferença de tratamento no imaginário social como é vista criança branca e como é vista criança negra. A criança negra na rua é menos contestada, aquele local é visto como seu local. Ela é vista com um indivíduo que não tem direito a ter direito, enquanto a sensibilização com a criança branca no mesmo contexto é maior”, resume.

Situação precária

A maior presença de crianças e adolescentes negros trabalhando em detrimento de brancos é vista porDaniel Teixeira, diretor de projetos do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades(Ceert), como uma conexão com a precarização da situação econômica da população negra no Brasil, aliada à ausência de direitos trabalhistas de forma geral.

“São paradoxos que empurram as pessoas negras para além das fronteiras da legalidade. Isso é histórico”, pontua. Daniel, que também atua como advogado, lembra que na época da escravidão as crianças negras não podiam frequentar as escolas e tinham a previsão de trabalhar já a partir dos oito anos, conforme previa a Lei do Ventre de Livre:

LEI DO VENTRE LIVRE (LEI Nº 2040 de 28.09.1871)

A Princesa Imperial Regente, em nome de S. M. o Imperador e Sr. D. Pedro II, faz saber a todos os cidadãos do Império que a Assembleia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:

Art. 1.º – Os filhos de mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei serão considerados de condição livre.
1.º – Os ditos filhos menores ficarão em poder o sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão a obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de oito anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá opção, ou de receber do Estado a indenização de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos. No primeiro caso, o Governo receberá o menor e lhe dará destino, em conformidade da presente lei.
2º Qualquer desses menores poderá remir-se do ônus de servir, mediante prévia indemnização pecuniária, que por si ou por outrem ofereça ao senhor de sua mãe, procedendo-se à avaliação dos serviços pelo tempo que lhe restar a preencher, se não houver acordo sobre o quantum da mesma indemnização.

“Há uma contradição entre o primeiro e o segundo parágrafo da lei. Isso mostra a cultura que se espelha até hoje de exploração do trabalho infantil da criança negra. Temos garantias de direitos, mas não para pessoa negra, que não é integrada no cuidado pelo Estado”, enfatiza Teixeira.

Nessa época, além das doenças, o trabalho era causa de morte dessas crianças. “O nível de mortalidade das crianças negras era muito alto, pois trabalhavam à exaustão, desenvolvendo tarefas de adultos, sem um olhar mais atencioso sobre esse corpo negro infantil”, reforça a doutora em educação Kiusam de Oliveira.

Marcos Santos Usp Imagens

Adolescentes internados na Fundação Casa, responsável pelo cumprimento de medidas socioeducativas de internação e liberdade assistida no estado de São Paulo. Crédito: Marcos Santos/USP Imagens

Nos anos que seguiram a abolição, a situação não mudou muito. Outras práticas como a adoção à brasileira, em que famílias pegavam meninos e meninas vindos geralmente do interior, de áreas rurais ou mais pobres para cuidar, mas que serviam para os trabalhos domésticos. “Isso ocorreu principalmente com crianças negras”, pontua Teixeira.

Nos anos que se seguiram a abolição, os Códigos de Menores de 1927 e 1969 colocavam as crianças e adolescentes em “situação irregular”, que demandavam ações socioeducativas. Em 1964, mesmo ano do Golpe Militar, é criada a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem). “Alguns pais levavam os filhos até lá, achando que era um internato. Essa era a propaganda da ditadura”, lembra. A mudança legal na ideia de menoridade só vem em 1988, junto com a Constituição, e na sequência em 1990 com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

“Essa é uma mudança significativa, pois até então essas crianças eram vistas como de segunda classe, sem os mesmos direitos”, considera o coordenador de projetos do Ceert. Os avanços não impedem que até hoje crianças negras sejam identificadas como “menor” e as brancas apenas como “crianças”. “Menor é uma figura que não tem os mesmos direitos, mas deveres. Está em situação irregular”, reforça.

Daniel Teixeira acredita que o trabalho infantil de crianças negras exista por conta desse racismo estrutural em que essa parcela da população tem ausência dos direitos à infância. “Há uma maior exclusão do que a população branca”, lembra, apontando ainda outros cenários como maior evasão escolar e alta taxa de homicídios de jovens negros.

“A escola não dialoga com a cultura e história negra, isso corrobora para uma evasão maior das crianças negras. A escola é desinteressante para elas, que acabam sendo ‘expulsas’ de lá”, ressalta. Isso traz como efeito pessoas que vão ingressar no mercado de trabalho de forma mais precária, recebendo menos e precisando da ajuda dos filhos para complementar a renda. “Daí vem uma maior taxa de crianças e adolescentes negros trabalhando”, conclui.

Histórico

A dissertação de Elisiane Santos ressalta que “as crianças filhas dos escravos libertos ocupavam as ruas, lutando pela sobrevivência por meio de mendicância, pequenos trabalhos ou atividades ilícitas. Essa realidade social marca a base de sustentação da sociedade paulistana, ancorada numa desigualdade no acesso ao mercado de trabalho, penalizando sistematicamente a população negra, a par de estigmatizar ou tornar invisíveis atividades informais, nas ruas, como formas de trabalho”.

Em outro trecho ela lembra que “a história da infância pobre é uma história de trabalho. O Brasil, desde a colonização, utilizou a mão de obra infantil”.

André Araújo, pedagogo e coordenador da equipe multidisciplinar do Centro de Referência Integral dos Adolescentes (Cria), lembra que o desafio é tentar compreender os fatores que antecedem as relações de trabalho infantil.

“Não é por acaso que as crianças e adolescentes pobres são, na maioria, negros. É preciso compreender que isso é desdobramento histórico e estrutural. O problema não está posto pelo fato em si, mas pelo que gera o fato”, contextualiza.

Araújo emenda lembrando que o fato de o Brasil ter passado mais de 300 anos como país escravocrata, ter sido o último país do mundo a realizar a abolição e jamais ter feito políticas de reparação corrobora essa situação. “Tivemos uma pseudolibertação. O 14 de maio, dia seguinte da abolição, foi um dos mais duros da história, pois os negros estavam libertos, mas não tinham para onde ir, não eram bem quistos. O que sobrou foi ocupar os lugares que ninguém queria”, afirma.

“O 14 de maio, dia seguinte da abolição, foi um dos dias mais duros da história, pois os negros estavam libertos, mas não tinham para onde ir”
André Araújo – pedagogo

Esse processo de miserabilidade gerou uma mentalidade de subserviência, de acordo com Araújo, uma vez que os negros libertos não tinham estrutura para estar na sociedade de outra forma. “A ausência de oportunidades se desdobrou em miséria e na impossibilidade de gerar renda e ter condições de cuidar dos filhos de forma digna. É uma vida pautada na ausência que joga essas pessoas para situação de subemprego e mão de obra barata. A sociedade vai naturalizando a violação de direitos dessa parcela da população”, considera.

O pedagogo ressalta que, por conta desse histórico, há um recorte que coloca sempre o negro como ofensivo, como se estivesse pegando o que é dos outros.

“Negro é sempre vilão até meu bem provar que não. É racismo meu? Não”, diz, citando a música Ilê de Luz, do Ilê Aiyê. André Araújo classifica a relação que coloca crianças e adolescentes como trabalhadores como perversa: “Tira a dignidade, coloca em não-lugar, cidadão de segunda classe.”

“Isso é o oposto do que deveria ocorrer, uma vez que criança tem prioridade absoluta no desenvolvimento, primazia na atenção à saúde”, considera. O Cria existe há 25 anos e trabalha com arte e educação para garantia dos direitos de crianças dos jovens. “Utilizamos a arte educação para incidir na vida dos jovens, fortalecendo e provocando-os a transformar sua própria realidade”, diz Araújo.

Racismo estrutural

Já a doutora em educação Kiusam de Oliveira, que é professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), ressalta que o olhar preconceituoso, fragmentado e violento lançado sobre o corpo negro tem sido há séculos o pilar que dá fundamento à estruturação naturalizada do racismo.

“A criança negra ainda é percebida como um adulto negro em miniatura. Os brasileiros foram entendendo e praticando o ser criança de forma mais acolhedora com relação à descoberta recente das especificidades infantis, o mesmo não se deu com relação à criança negra. Mesmo após a abolição, ela continuou a sofrer perseguições racistas. Foi mantida prisioneira em seu próprio corpo negro outrora escravizado e agora preso à estagnação do olhar racista, que o manteve nos porões da história”, afirma.

A professora também ressalta que o país vive uma abolição inconclusa em que o corpo da criança negra tem sido, insistentemente, violado naqueles espaços que se dizem educativos, como os escolares. “O território escolar tem sido historicamente um espaço em que as profissionais da educação têm lançado um olhar preconceituoso, fragmentado e violentíssimo sobre os corpos das crianças negras”, afirma, lembrando que o racismo sofrido por essas crianças nesses espaços é negligenciado ou minimizado.

Além disso, Kiusam pontua que o corpo da criança negra é considerado, na prática, corpo de propriedade daqueles adultos que estão encaminhando ações educativas ou trabalhistas com elas. “O corpo da criança negra, além de ser lido como o corpo de um adulto negro é visto efetivamente como propriedade de algumas pessoas sem que a mãe e o pai estejam no topo desta lista. Em última instância, o corpo da criança negra ainda pertence ao Estado, que é soberano”, reforça.

Setores críticos

O Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) destacam pesquisas que apontam o trabalho infantil ainda na lavoura por parte de empresas processadoras de cacau para a produção de chocolate e indústrias do varejo, mantidas em sigilo.

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/2017) de 2014, cerca de 8 mil crianças e adolescentes de 10 a 17 anos trabalham em plantações de cacau no Brasil. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os números de trabalho infantil aumentaram 5% entre 2000 e 2010 nas regiões produtoras de cacau, apesar da tendência de queda de 13,4% no uso de mão de obra de crianças e adolescentes na soma geral das atividades econômicas brasileiras.

Perfil urbano

O trabalho nas ruas é majoritariamente exercido por meninos negros, como lembra Elisiane Santos, em sua dissertação de mestrado na Universidade de São Paulo intitulada “Trabalho infantil nas ruas, pobreza e discriminação: crianças invisíveis nos faróis da cidade de São Paulo”. “No cenário urbano, em grandes cidades como a capital paulista, a população infantil nas ruas se intensifica, exercendo trabalhos informais em condições perigosas e precárias, nos faróis da cidade, principalmente no comércio ambulante e apresentações artísticas circenses, atingindo massivamente meninos negros, que estão invisíveis tanto nos dados do trabalho infantil quanto nas políticas sociais para o seu enfrentamento”, informa.

O trabalho nas ruas é considerado como uma das piores formas de trabalho infantil, conforme estabelece o Decreto n° 6.481/2008, que regulamenta a Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2000.

“O jovem negro cooptado pelo tráfico está em relação de trabalho. Está na ‘correria’ para levantar grana. Avisa soltando o foguete, sendo aviãozinho. Além disso, há os vendedores ambulantes, engraxates, aqueles que alugam cadeiras na praia. As meninas são usadas na exploração sexual e no trabalho doméstico”, aponta André Araújo, do Cria.

Eugenio Marques, que é fiscal do trabalho, da Secretaria de Trabalho e Previdência do Ministério da Economia, lembra que entre os vários fatores que influenciam o trabalho infantil um dos mais determinantes é a pobreza e miséria. “Por isso, o alto índice de crianças negras”, afirma.

Marques ressalta que essas crianças e adolescentes trabalhadores fazem parte de “estatísticas invisíveis”, pois são vítimas do trabalho infantil doméstico e exploração sexual, no caso das meninas negras, além do trabalho de ambulante e o tráfico de drogas, no caso dos meninos negros. “Hoje, o trabalho infantil tem esse perfil muito urbano”, diz.

Trabalho infantil em meio urbano
5 a 13 anos – 58%
14 a 17 anos – 78,6%

Eugenio Marques cita ainda o documentário Profissão Criança , 1993, de Sandra Werneck que retrata o tema. “Ela mostra o trabalho na cana-de-açúcar, olarias e cerâmicas, que permanece de forma residual. Hoje, o trabalho infantil é muito mais no mercado informal, em que não é possível detectar o empregador”, afirma. Nessa nova realidade, o fiscal do trabalho lembra que há desafio da rede de proteção atuar para avançar no combate ao trabalho infantil.

“A gente afastava o empregador, agora precisamos ter programas de transferência de renda eficiente para garantir que criança não chegue na rua”, diz.

Outro desafio é a redução dos quadros de fiscais e a transformação do Ministério do Trabalho em secretaria, diminuindo a autonomia e as verbas do órgão.

Alternativas: música x trabalho infantil

Em São Paulo, uma das instituições que faz o combate do trabalho infantil na base é o Instituto Favela da Paz. A organização não-governamental fica no Jardim Nakamura, distrito do Jardim ngela, no extremo sul de São Paulo, e funciona como um guarda-chuva de projetos para capacitar crianças, adolescentes e jovens. Entre as atividades, está o Plano Jovem, que atende 25 adolescentes que moram em Paraisópolis e trabalhavam como vendedores nos faróis do Bairro Morumbi.

“Eles ganham bolsa de R$ 600 e aprendem questões ligadas a tecnologia, sustentabilidade, noções musicais, a produzir o próprio alimento, além de prepará-los para a vida”, diz Claudio Miranda, coordenador do instituto. Os jovens têm entre 12 e 20 anos e deixaram o trabalho de lado para participar do projeto.

A iniciativa mais conhecida do Instituto Favela da Pazé o Samba da 2, que ocupa com música e atividades de lazer a Rua 2, do Jardim Nakamura aos segundos domingos de cada mês. A organização mantém ainda um projeto de percussão com 50 crianças de 5 a 12 anos, chamado Pequeninos da 2. Há ainda um estúdio audiovisual; projetos de manejo sustentável; de andar e consertar bicicletas; e o Quebrada Filosófica, que promove encontros, rodas de conversa, formação política e exibição de filmes.

“A intenção é causar reflexão na comunidade, promover cultura de tocar o instrumento, fazer esse despertar de dentro para fora, manter o lúdico com eles. É um espaço livre e aberto”, afirma Claudio. Cerca de 20 mil pessoas são impactadas pelas ações a cada ano. “Nós viajamos para o exterior e levamos os meninos da quebrada para tocar conosco. Abrimos espaço para fazer o que que quiserem”, diz.

O próximo passo é transformar a sede em um prédio de quatro andares, um centro de cultura e educação para os pais. “Fazemos o que chamamos de economia da dádiva, ou seja, compartilho tudo que ganhamos com a banda, palestra e projetos sociais com a comunidade. Temos apoiadores na Europa”, diz.

O trabalho é feito na comunidade desde 1989, época em que o lugar era considerado um dos mais violentos de São Paulo. Em 2010, a instituição ganhou vida formal. “Hoje temos crianças que nunca viram gente morrendo na frente. Isso é uma mudança grande”, afirma Claudio.

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