Após 116 anos de existência, o centro acadêmico XI de Agosto da Faculdade de Direito da USP elegeu, neste mês, pela primeira vez uma estudante negra como presidente.
Letícia Chagas faz parte da primeira turma de alunos que ingressou em uma das universidades mais elitizadas do país por meio da política de reserva de vagas do Sisu.
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O centro acadêmico é responsável pelo repasse de verbas e manutenção de entidades como a Casa do Estudante, moradia estudantil da faculdade, e o departamento que presta auxílio jurídico para a população de baixa renda. Ao longo de sua história, o XI de Agosto também esteve envolvido em uma série de lutas sociais.
A estudante de direito está à frente do movimento “Travessia” e deve ficar no cargo por um ano, a partir de dezembro. “Fizemos uma campanha que discutiu a questão financeira do XI de Agosto e questionou a problemática de uma pessoa negra nunca ter chegado à Presidência antes”, conta Letícia.
“O centro acadêmico esteve presente na luta contra a ditadura militar e, mais recentemente, realizou discussões sobre a importância da manutenção de um estado democrático de direito”, relembra.
Resistência e renovação
O movimento “Travessia” foi criado em 2018 e é composto majoritariamente por estudantes negros. Um dos objetivos do coletivo é criar um ambiente acolhedor para os alunos que fazem parte de minorias sociais, como negros e gays.
Letícia Chagas destaca que a Faculdade de Direito da USP passou a ter mais alunos negros após adotar o sistema de cotas raciais. A instituição de ensino foi a última do estado paulista a introduzir políticas afirmativas em seu vestibular, em 2018. A Unesp oficializou a medida em 2014, devido à pressão estudantil e de movimentos sociais. Por sua vez, a Unicamp fez o mesmo em maio de 2017.
Há mais de 30 anos o tema era discutido pelo Núcleo de Consciência Negra da USP. Segundo Letícia, a ausência de alunos negros era perceptível.
“Antes de eu decidir me mudar de Campinas para São Paulo para estudar na USP, eu via fotos de turmas anteriores e havia, no máximo, uma ou duas pessoas negras. Isso me aterrorizava bastante. Em 2018, porém, várias pessoas negras entraram comigo. Grande parte dos meus amigos da universidade são parecidos comigo e, por isso, eu não me sinto sozinha”, afirma a estudante.
Em menos de dois anos de atuação, o movimento “Travessia” se destacou na universidade por promover debates voltados a ações afirmativas, o que ajuda a explicar a vitória na eleição do centro acadêmico neste mês.
“No ano passado, fizemos uma boa campanha eleitoral, mas não chegamos nem no segundo turno. Em 2019, realizamos diversos eventos na faculdade e mobilizamos os estudantes para a importância da discussão sobre cotas para pessoas trans. O resultado do nosso trabalho foi muito positivo”, complementa Letícia.