Por: Verônica Serpa
A professora de gramática Larissa Alves, da Escola Estadual Profª Leico Akaishi, em Ribeirão Pires (SP), foi demitida após denunciar um caso de brutalidade da Guarda Civil Metropolitana (GCM) do município contra um aluno adolescente. Larissa foi afastada após trabalhar o assunto pedagogicamente com seus alunos em sala, e prestar apoio à mãe do jovem.
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Na ocasião, dois agentes da Guarda Civil Municipal colocaram o jovem contra a parede, sob a mira de uma arma. Gabriel* havia acabado de sair da sala de aula quando foi abordado, fato testemunhado por outros alunos do turno da manhã. “Entrando no carro, eu vi a viatura da GCM se aproximando bem lentamente e o agente já saindo do carro com a arma apontada para o aluno”, conta Larissa Alves.
A professora questionou em grupo de mensagens com outros professores e a diretoria da escola sobre a naturalização de violências desse gênero com alunos, mas não teve resposta. “Eu mandei um monte de mensagem no grupo da escola, onde questionei isso. Perguntei até quando a gente vai naturalizar que seja normal um aluno sair da escola e ter uma arma apontada para a cabeça dele, ninguém respondeu”.
Em contato com nossa equipe, a Secretaria de Comunicação (SECOM) de Ribeirão Pires diz que a abordagem da GCM com adolescentes deve se dar “Quando tiver fundada suspeita de que a pessoa está com armas de fogo, drogas ou objetos que serão usados para a prática de crimes”.
A atuação da Guarda Civil Municipal como força policial é vedada pelo STJ, de acordo com decisão de 2022. Em julgamento de recurso, o colegiado entendeu que a GCM só pode realizar buscas pessoais e revistas em casos “absolutamente excepcionais”.
O caso
O jovem saiu da escola perto do meio-dia, quando foi parado pela GCM. Os dois guardas o renderam sem maiores explicações, já com a arma apontada para o adolescente, segundo as testemunhas ouvidas. A Secom também informou que os guardas municipais pararam os jovens, pois teriam identificado um “volume” na cintura dos rapazes.
Após render os estudantes, a GCM constatou que o “volume” era um aparelho celular, e dispensou os jovens. Larissa relata que o adolescente estava em aula durante a manhã toda, não havendo motivo para tê-lo como alvo. Outros estudantes também comentam que a diretora da escola, não só observou a ocorrência, como também acompanhou a situação aos risos. Até a denúncia da professora, a diretoria não se manifestou sobre a abordagem armada em momento algum, nem notificou a mãe do jovem.
Após a falta de resposta da diretoria, Larissa Alves entrou em contato com o aluno para prestar apoio e, com o aval do adolescente, escreveu uma crônica denunciando o caso nas redes sociais. Larissa ainda levou o texto para sala de aula, onde trabalhou com as turmas sobre o tema de violência policial e racismo.
Segundo testemunhas ouvidas pela reportagem, após a denúncia da professora, a diretora exibiu a gravação da abordagem nas salas, onde negou que a abordagem tivesse sido armada. Além da exposição do adolescente, a diretora ainda teria negado se tratar de um caso de racismo, pois para ela, não se tratava de um aluno negro.
No fim de semana seguinte à denúncia, a professora foi demitida junto à Diretoria Estadual de Ensino da região de Mauá. O afastamento veio por meio de um termo, no qual a defesa da professora relata não ter tido acesso.
O advogado responsável pela defesa da professora, Eduardo Cabral, relata as dificuldades enfrentadas na defesa do caso. O documento retido era peça crucial para a organização da defesa de Larissa, que tinha apenas 3 dias úteis para recorrer à exclusão do contrato. O termo só conseguiu ser acessado no segundo dia útil, após a diretoria informar o local errado para retirada do mesmo.
A Secretaria Estadual da Educação (SEDUC) alega no termo de demissão, que Larissa expôs a imagem dos alunos em seu texto de denúncia, além de “incitar os adolescentes a protestar”.
*A equipe de reportagem adotou um nome fictício para preservar o adolescente
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