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Acampamento do MST sofre ataque a tiros em Pernambuco

Há duas décadas, trabalhadores rurais sem terra do município de São Joaquim do Monte (PE) lutam pelo direito ao território em área considerada improdutiva de fazenda; desde a ocupação, famílias seguem sob constante ameaça de conflitos violentos

Imagem de trabalhadores rurais sem terra com a bandeira do MST.

Foto: Imagem: Juliana Adriano/MST

5 de julho de 2022

Na madrugada do último dia 29, um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no município de São Joaquim do Monte, no estado de Pernambuco, foi alvo de tiros. Segundo os relatos, quatro homens armados, em duas motos, entraram na ocupação por volta das 3h e atiraram contra as casas dos acampados junto à Fazenda Jabuticaba, no Agreste do estado. Nenhuma pessoa ficou ferida.

Ainda de acordo com os trabalhadores rurais, na véspera dos disparos, ameaças contra os sem-terra foram proferidas publicamente por um homem que se identificou como empregado de um dos proprietários da fazenda.

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A Alma Preta Jornalismo teve acesso ao ofício assinado por integrantes do Setor de Direitos Humanos do MST e que foi encaminhado à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco para denunciar e pedir providências quanto ao quadro de ameaça e violência sofrida pelos trabalhadores rurais sem terra do Acampamento Jabuticaba. Um boletim de ocorrência também foi registrado por um dos acampados na Delegacia de Polícia Judiciária de São Joaquim do Monte.

Como um desdobramento do pedido de providências, nesta segunda-feira (4), o acampamento recebeu a visita do Programa de Prevenção de Conflitos Agrários Coletivos de Pernambuco, que coletou depoimentos dos trabalhadores para entender o ocorrido e mobilizar as instâncias estatais em torno de uma solução.

O acampamento existe na região há quase 23 anos e vários conflitos sobre a terra já se seguiram desde a sua implementação em 1999, na fazenda considerada improdutiva. Segundo o ofício do MST, o conflito agrário na área já contou com episódios de violência e criminalização. Além disso, de acordo com o movimento, a formação ilegal de milícia privada em torno da Fazenda Jabuticaba já foi objeto de inquérito policial instalado e conduzido pela Delegacia de São Joaquim do Monte, em que se indiciou alguns proprietários da fazenda.

Segundo o professor universitário Roberto Efrem Filho, integrante do setor de Direitos Humanos do MST de Pernambuco, o território onde as famílias estão é de uma área de latifúndio muito tradicional na região, pertencente a uma família conhecida como Família dos Guedes”.

“Os proprietários originais faleceram e as terras foram deixadas aos herdeiros, sendo repartidas. Esse conflito já teve episódios bastante violentos com mortes de trabalhadores sem terra e mortes de pistoleiros também”, pontua o integrante do MST.

Atualmente há cerca de 40 famílias na ocupação, que vivem da agricultura familiar e de subsistência no território.

“Eles são um acampamento, então eles não têm casa de alvenaria, vivem em barracos. Eles plantam macaxeira, inhame, feijão de corda, maracujá, banana. Alguns poucos possuem galinhas e bodes. Eles não têm acesso a água potável e não têm acesso a energia elétrica”, conta Roberto Efrem Filho, que destaca que relatos de trabalhadores pontuam que energia elétrica foi cortada há mais de dois anos pelos proprietários da fazenda.

Leia mais: SP: jovem denuncia pressão de policiais para assumir roubo de celulares

Histórico de conflitos na região

Desde o estabelecimento do acampamento na Fazenda Jabuticaba, os trabalhadores rurais já passaram por situações de despejos, inclusive violentos, restabelecendo novamente a ocupação pouco tempo depois. As ameaças por parte de pistoleiros e milícias é constante.

Em fevereiro de 2009, houve um conflito violento com pistoleiros junto às famílias acampadas. De acordo com informações do MST, um grupo de pistoleiros armou uma tentativa de massacre contra os acampados das fazendas Jabuticaba e Consulta, ambas localizadas no mesmo município. No desfecho do conflito, quatro pistoleiros morreram e um trabalhador ficou ferido. Quatro dos acampados foram presos e um grupo de trabalhadores rurais teve a prisão preventiva decretada. Um dos envolvidos, absolvido em Tribunal de Júri, chegou a ser recentemente assassinado.

Em março deste ano, as famílias precisaram protestar pela retomada do transporte escolar até o acampamento, depois que o serviço havia sido interrompido após requerimento de um dos proprietários da fazenda pela suspensão do direito.

De acordo com Efrem Filho, o Instituto de Terras e Reforma Agrária do Estado de Pernambuco (Iterpe) chegou a proceder pela desapropriação da área pelos proprietários por estar em território considerado de interesse público, mas os herdeiros da fazenda ajuizaram uma ação de anulação dessa desapropriação.

“Então a solução que havia sido encontrada pelo Governo de Estado de Pernambuco através do Iterpe, que foi desapropriar a área, acabou sendo impedida de acontecer”, explica.

Com a decisão que anulou a desapropriação, é possível que haja agora o despejo das famílias do acampamento do MST, que só não ocorreu por conta da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (APDF) 828, que suspende reintegrações de posse durante a pandemia até outubro.

Segundo Roberto, enquanto a situação não se resolve, as famílias do acampamento permanecem em situação de constante ameaça, com receio inclusive de produzir lavouras maiores e acabar perdendo tudo em reintegrações de posse.

“Os adiamentos do STF favorecem os trabalhadores que permanecem nas terras com a suspensão das reintegrações de posse. Eu imagino que essa situação de espera pelo despejo esteja fazendo com que os proprietários fiquem mais ansiosos, o que acaba acirrando o conflito, que novamente gera violência”, finaliza o integrante do Setor de Direitos Humanos do MST.

Leia também: Suspensão de despejos até outubro deve proteger mais de 42 mil famílias em SP

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