O rapper Djonga acionou sua equipe de advogados para tentar recurso contra a decisão judicial que decretou a retirada de um post com a frase “Fogo nos Racistas” da conta pessoal de uma enfermeira negra no Facebook. Ela ainda foi condenada a pagar uma indenização de danos à imagem de uma loja, em Mogi Guaçu, no interior de São Paulo, onde sua irmã sofreu racismo.
Os advogados de Djonga, Ariel Chacão, Karina Galvão e Aristides Chacão se uniram às advogadas Elaine Gázio e Adlya Gázio Papandréa, que já vinham fazendo a defesa da enfermeira, entraram com um embargo de declaração (recurso) contra a decisão do desembargador Schmitt Corrêa, da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, responsável pelo julgamento em 2ª instância. O pedido de recurso baseado em contradições, vícios e pontos obscuros na decisão foi feito na última sexta-feira (29), prazo máximo para contestar a decisão.
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O juiz avaliou que um post de desabafo feito pela enfermeira que descrevia como a sua irmã tinha sido humilhada, xingada e agredida fisicamente pela dona da loja deveria ser retirado e que ela ainda deveria pagar uma indenização por ter danos à imagem do estabelecimento.
“É como se dissesse que a imagem de uma loja, onde aconteceu um caso emblemático de racismo que causou traumas numa família inteira, é mais importante do que o sentimento e a liberdade de expressão de uma mulher negra”, pontua a advogada Karina Galvão, que representa o rapper Djonga.
Na decisão, o desembargador destacou que a loja teve prejuízos porque foi organizado um protesto popular antirracista na frente do estabelecimento e, na madrugada, alguém pixou a frase “Fogo Nos Racistas”. A mesma expressão estava na imagem de um cartaz no post da enfermeira, reproduzindo um slogan da luta antirracista no Brasil e um dos versos da música “Olho de Tigre”, de Djonga.
“O racismo estrutural também tem está presente no sistema jurídico e afeta cada vez mais as decisões, gerando uma jurisprudência enraizada na discriminação. A condenação que estamos tentando reverter é muito perigosa para a luta antirracista. É uma forma de silenciar a comunidade negra que se posiciona contra o racismo. Aliás, o racismo é crime”, afirma o advogado Ariel Chacão.
A Alma Preta Jornalismo entrou em contato com a enfermeira. Ela contou que ficou muito triste com a decisão e quer que a justiça seja feita. “Minha irmã sente muita vergonha e está triste. Ela não vai mais ao centro, mudou até de cidade, porque ela foi muito humilhada”, compartilha.
O caso aconteceu em setembro de 2019, segundo a enfermeira, a irmã tinha sofrido um problema capilar e estava careca, por isso foi até a loja e comprou um adereço para a cabeça que custava R$100. No entanto, ao chegar em casa, ela notou que deram para ela um produto que custava R$70, então ela voltou na loja para fazer a troca, quando a dona da loja recusou-se.
Ela conta que a dona da loja teria dito que não era problema dela que a irmã era “negra, careca e uma cadela”. A proprietária do estabelecimento teria pego um ferro e bateu na cliente, além de fazer ofensas como “sai daqui sua cadela” na frente de funcionários e de outros clientes.
A dona da loja teria expulsado a moça, puxado sua peruca, deixando ela constrangida diante das pessoas. A polícia foi chamada, porém, o caso acabou sendo arquivado porque as testemunhas eram a própria dona da loja e sua funcionária.
Nove meses depois, decepcionada com a ação da polícia e da justiça, a enfermeira fez o post na sua conta do Facebook. Na época, a música do Djonga já era considerada um hino antirracista e a frase “Fogo nos Racistas” tinha viralizado em diversas redes sociais. Só no Instagram, o rapper tem 3,5 milhões de seguidores.