O Projeto de Lei (PL) que aumenta os gastos públicos com publicidade institucional em ano eleitoral, inclusive durante o período da campanha, desequilibra o pleito desfavorecendo, ainda mais, as candidaturas negras. É o que aponta Nailah Veleci, cientista política e Consultora de Inteligência Eleitoral em Raça e Gênero e Diretora de Pesquisas da organização Elas no Poder.
A especialista afirma que o PL 4059/21, aprovado na Câmara, beneficia os políticos que já têm mandato, principalmente os da ala governista. A proposta aumenta o montante de gastos com publicidade permitidos atualmente pela legislação no primeiro semestre de anos eleitorais. O texto, que agora tramita no Senado, passou com 309 votos favoráveis e 121 contrários.
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Apenas cinco partidos votaram contra – PT, Novo, PCdoB, PSB e Psol. O projeto autoriza órgãos federais, estaduais e municipais a reservarem seis vezes a média mensal dos valores empenhados nos três anos anteriores – primeiro e segundo semestres. A proposta também permite que a administração pública tenha gastos com publicidade para o combate à Covid-19, no segundo semestre deste ano.
Por meio da mudança na Lei de Licitações de Publicidade (Lei 12.232/10), o governo poderá ter regras específicas de contratação de publicidade para licitar serviços de comunicação digital (mídias sociais e canais digitais) e de comunicação institucional (relações com a imprensa e relações públicas).
Para Nailah, as candidaturas que já possuem mandato começam as eleições com a vantagem da visibilidade e publicidade proporcionada pela máquina pública, pois o eleitor liga as ações e as políticas dessas publicidades institucionais ao governo. Ela ressalta que a população atrela as campanhas principalmente aos políticos dos cargos do Executivo, devido a falta de conhecimento do eleitorado sobre os papéis específicos do Executivo e do Legislativo na construção de políticas públicas.
Por outro lado, de acordo com a consultora, novas candidaturas precisam de um investimento maior em publicidade para se tornarem conhecidas pelo eleitorado e dependem, para isso, do financiamento dos partidos, recursos próprios, das doações, de uma rede de contatos políticos e de bons profissionais para suas campanhas.
“Acontece que as candidaturas negras entram nessa disputa desfavoráveis, pois a sub-representação de negros na política já nos ilustra que os políticos com mandato que se beneficiarão dessa publicidade da máquina pública serão majoritariamente brancos, porque são eles que tem a maioria dos mandatos”, argumenta Nailah, que carrega os títulos de doutoranda em Sociologia, mestra de Direitos Humanos e especialista em Gestão Pública.
Dados do estudo Desigualdade Sociais por Cor ou Raça, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que a quantidade de candidaturas de pessoas negras não condizem com o número de eleitos. Em 2018, os autodeclarados pretos e pardos eram apenas 24,4% dos deputados federais e 28,9% dos deputados estaduais. No entanto, o percentual de candidaturas chegou a 41,8% para federal e 49,6% para estatual.
Nailah aponta ainda que os algoritmos de algumas redes sociais invisibilizam pessoas negras. “Então pré-candidatura e posteriormente candidaturas para burlar esses algoritmos terão mais gastos com impulsionamentos e isso acaba impactando também no acesso a possíveis novos doadores”, enfatiza a consultora.
A vereadora Iza Lourença (PSOL – BH), pré-canditada a deputada federal, afirma que o impacto negativo que pode ser causado por esse PL se relaciona diretamente com a chance de eleger candidaturas comprometidas com a classe trabalhadora e povo negro. Para ela, isso é uma estratégia para facilitar que, em ano eleitoral, “utilize-se a máquina pública em favor da campanha do atual presidente à reeleição e seus aliados nas outras instâncias”.
“As nossas campanhas financiadas a partir de recursos coletivos, já sem acesso a financiamentos particulares de origem duvidosa, ficarão ainda mais em desvantagem diante das que se beneficiarem do uso do dinheiro público para as suas campanhas”, comenta a parlamentar.
Em pronunciamento na Câmara dos Deputados, a deputada Celina Leão (PP – DF), relatora do projeto, negou a intenção de deturpar a legitimidade do pleito. A congressista afirmou que há um equívoco na leitura sobre o aumento da média de gastos com publicidade em seis vezes.
“Trata-se do cálculo da média. O cálculo da média era feito nos primeiros três semestres. Hoje o que prejudica é que todos os estados concentram esses recursos nos primeiros seis meses e ficam sem recursos para fazer suas campanhas institucionais durante todo o ano”, diz.
E reforçou dizendo que o plenário da Casa já havia aprovado algo semelhante nas eleições municipais. “Nós aprovamos esse mesmo texto para as eleições municipais para não termos essa média também mal calculada. E essa média não está sendo ampliada em seis vezes. Ela é dividida mensalmente, fazendo-se o cálculo durante os 12 meses, e não em seis meses, como era na legislação anterior”, argumenta.
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