A deputada federal Talíria Petrone (PSOL/RJ) protocolou nesta quarta-feira (7) o projeto de lei (PL) 4.327/2021 que visa proibir a justiça de retirar os filhos do convívio dos pais ou responsáveis por motivos religiosos. A proposta decorre de mães de diferentes regiões do país terem, recentemente, perdido a guarda dos filhos por causa do culto a religiões de matriz africana.
“Nenhum genitor ou ascendente poderá ser excluído do convívio de criança e adolescente por motivo de crença religiosa, sendo resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, conforme determinado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90)”, diz o texto.
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O projeto de lei ressalta ainda a laicidade do Estado, prevista na Constituição Federal. Agentes do estado não podem interferir, subvencionar, promover ou embaraçar instituições religiosas; utilizar de motivação religiosa para restringir direitos; usar as instituições públicas, inclusive suas instalações imobiliárias, por instituições religiosas; determinar a aprovação de leis e códigos coletivos a partir de valores religiosos.
“Num Estado laico, todos podem professar crenças, mas elas não podem influenciar nas decisões de nenhum servidor ou agente público. Temos visto estudos e reportagens demonstrando a influência de determinadas correntes evangélicas neopentencostais no Conselhos Tutelares, várias das quais abertamente perseguem religiões de matriz africana. Por isso, o projeto determina também explicitamente a aplicação do princípio constitucional da laicidade como corolário da atuação de conselheiros e conselheiras tutelares”, complementa o texto.
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Perda de guarda
Casos de intolerância contra religiões de matriz africana têm pautado disputas na justiça pela guarda de filhos de pessoas adeptas a essas crenças. Ainda neste ano, uma mãe foi denunciada por “lesão corporal com violência doméstica agravada” pelo Ministério Público de São Paulo por levar a filha a um ritual do Candomblé onde a menina de 11 anos se submeteu a um ritual de escarificação, que consiste na realização de pequenas incisões na pele para aposição de compostos de ervas. A mãe foi absolvida por decisão proferida pelo juiz Bruno Paiva Garcia, da vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da comarca de Guarulhos/SP.
Em sua sentença o juiz, com base no laudo médico juntado aos autos, classificou as lesões como insignificantes. O magistrado destacou o exercício da liberdade religiosa, e considerou, após análise de laudo médico, que as lesões constatadas na criança eram insignificantes.
Outro caso ocorreu em João Pessoa, na Paraíba, há cerca de dois anos. Uma mãe de santo perdeu a guarda de dois filhos, de 11 e 15 anos, para a irmã. Em entrevista à Alma Preta Jornalismo, a advogada Thais Dantas, do Instituto Alana, que acompanhou o caso, afirmou que “o Estado não pode reproduzir nenhuma prática discriminatória, seja em relação à situação familiar, ao ambiente em que essa criança está ou à etnia, especialmente quando envolve religiões de matrizes africanas”.