O projeto ‘Silêncio no Estádio – No País do Futebol, a mudez é fabricada e tem cor’ foi lançado neste mês de julho para debater o apagamento da discussão sobre o racismo no futebol masculino. Jogadores, técnicos, profissionais do esporte, analistas, jornalistas e estudiosos discutem a respeito de suas experiências pessoais em uma série multimídia, dividida em cinco episódios.
“O futebol é mais que entretenimento. Fomos ensinados que futebol não se mistura com política e que as discussões são sempre sobre o que acontece dentro de campo, mas não podemos nos limitar a isso. A luta antirracista é muito maior do que posicionamentos vazios e o futebol deve ter um olhar mais atento para ela”, afirma uma das idealizadoras do projeto, a jornalista Bruna Goularte.
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No site oficial é possível ver relatos dos profissionais ao clicar na imagem de um estádio de futebol. Cada área da ilustração – como arquibancada, campo, cabine de imprensa – traz uma história de como o racismo foi responsável por silenciar vozes negras relacionadas ao esporte.
“Não queríamos apenas trazer o racismo como xingamentos e agressões dentro do campo. O futebol é muito amplo para isso. Espetaculariza-se quando é uma personalidade muito famosa e, muitas vezes, transforma a vítima naquele momento apenas. A carreira do jogador fica marcada”, avalia Bruna.
Relatos
A jornalista e também organizadora do projeto Babi Ferreira explica que o site interativo é destinado a todos que querem entender a construção do futebol no Brasil e também para quem deseja “ouvir, na voz de quem viveu, o que significa ser um negro no esporte mais amado do país”, salienta.
“O nosso objetivo é justamente apresentar como os silêncios são ferramentas que garantem a manutenção da estrutura racista no futebol do país, desde jogadores até membros de federações e pensadores da modalidade”, relata Bruna Goularte.
Hyuri (jogador do Clube de Regatas Brasil), Aranha (ex-jogador do Santos), Léo (jogador do São Paulo), Marinho (jogador do Santos), Grafite (ex jogador e comentarista), Mauro Silva (vice-presidente da Federação Paulista de Futebol) e Márcio Chagas (ex-árbitro e ex-comentarista) estão entre as figuras que participam da ação.
“Quando aconteceu o caso de racismo comigo, uma coisa que me incomodou muito foi que as pessoas falavam mais o meu nome referindo ao caso, do que de futebol. Ninguém mais falava dos gols que eu fazia. A memória do brasileiro é muito curta”, relata o ex-jogador e comentarista Grafite, em um dos textos do projeto.
Futuro
O conteúdo do site e a discussão apresentada serão transformados em um livro com material ampliado, de acordo com a organização do projeto. “Não queremos parar por aqui. Colhemos muitas histórias relevantes e temos um material muito vasto”, ressalta Bruna.
Informações do Observatório Racial do Futebol dizem que os casos de discriminação racial são julgados e punidos pela Justiça Desportiva, legalmente prevista no artigo 217 da Constituição Federal. O Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), diferentemente da legislação criminal brasileira, não diferencia injúria racial e racismo. É possível relatar algum caso de discriminação ou sanar dúvidas no site do Observatório.
Babi Ferreira, no entanto, pondera que os torcedores são peças fundamentais na luta antirracista na modalidade. Ela salienta que os amantes do esporte também são prejudicados pelo racismo que acomete clubes e jogadores e, portanto, é importante exigir posicionamentos dos clubes a respeito.
“É necessário cobrar os times que se coloquem como instrumentos do antirracismo, com diálogo e modificações dentro dos próprios clubes. As equipes de treinamento, os conselhos, diretorias precisam ser compostas diversamente”, finaliza.
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