Denúncias sobre a condição de trabalhadores da Zona Rural do município de Bezerros, em Pernambuco, levaram Auditores Fiscais do Trabalho, a Procuradoria do Ministério Público e a Polícia Federal a desvendar situações de exploração e mão de obra escrava na última semana. Entre os dias 15 e 17 de março, os órgãos realizaram uma operação em uma fazenda de criação de gado e cavalos, que funcionava sem registro dos profissionais, sem garantia trabalhista ou previdenciária e em condições insalubres.
Segundo o coordenador da operação em Bezerros, o Auditor Fiscal Trabalhista Carlos Silva, em entrevista exclusiva para a Alma Preta Jornalismo, uma identificação prévia foi feita para a garantia da eficácia da ação durante a investigação in loco por toda a equipe responsável. O espaço de trabalho foi avaliado durante os dias de operação, que levou à identificação de três pessoas em situação de vulnerabilidade. Segundo o auditor, locais de difícil acesso são perfis comuns em situação de exploração.
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Dentre as irregularidades constatadas durante a operação, destacam-se: ausência de pagamento de salário (por pelo menos oito meses de trabalho ininterruptos); ausência de água potável; inexistência de instalações sanitária (chuveiro, pia e vaso), levando o trabalhador a fazer suas necessidades fisiológicas a céu aberto; ausência de local adequado para a conservação e preparo de alimentos, como também ausência de espaço para consumo das refeições diárias.
Os agentes de investigação ressaltam um quadro que agrava a situação de um dos profissionais que foi encaminhado para o Serviço de Assistência Social do município de Caruaru, localizado a cerca de 20 km da localidade onde foi encontrado, e imediatamente submetido a cuidados médicos e ao serviço de orientação para reinserção social. Para a surpresa da equipe, o empregado teria um benefício assistencial ativo pelo INSS, atestado de um quadro de deficiência mental.
Para Carlos Silva, o estado de saúde mental do empregado resgatado abre espaço para uma leitura de uso de má fé em ambiente de trabalho ainda maior por parte do empregador. “Situação como essa é o que transforma o favorecimento da exploração da mão de obra das pessoas, por este trabalhador, por exemplo, não conseguir discernir o que é ou não uma condição de trabalho correta”, pontua.
Como resposta às condições de trabalho, a equipe da operação avalia a aplicação de verbas rescisórias (cerca de R$11.825,00), além da prisão do empregador e pagamento de indenização a título de dano moral individual.
Enquanto via judicial, a operação foi respaldada pelo Artigo 149 do Código Penal Brasileiro referente à Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940, que prevê a proibição de reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.
Para o auditor, o combate a estes cenários deve ser uma constante. “Esse compromisso precisa continuar ativo para aqueles que praticam atividades econômicas. Quando estamos no enfrentamento ao trabalho escravo, fazendo o recorte pelas desigualdades, como a racial, identificamos que a raiz desse tipo de exploração está nessas vulnerabilidades sociais. O preconceito, a fome, e outras formas de exclusão da sociedade são causas dessa problemática”, finaliza.
Resgates
Em 25 anos de operação da equipe responsável pelo combate à exploração no trabalho, ao todo 846 pessoas foram resgatadas em 62 estabelecimentos só em Pernambuco. Em proporcionalidade em relação aos anos, a média é de 33 pessoas retiradas de cenários de precariedade para a execução de atividades profissionais. No Brasil, 2.228 pessoas são retiradas dessa situação por ano, já em 6.601 estabelecimentos. Um número bastante alarmante quando traz-se o total de casos: 55.712.