Temas que fazem parte das reivindicações do Movimento Negro organizado foram tocados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante discurso em 10 de março. A coletiva de imprensa ocorreu após o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), anular as condenações contra Lula, o que o tornou elegível novamente.
No discurso, Lula, de 75 anos, falou sobre problemas que o país atravessa e que preocupam a população, como os efeitos da pandemia na economia. Nesse ponto ele acertou, segundo Regina Lucia dos Santos, da coordenação estadual do Movimento Negro Unificado (MNU) de São Paulo.
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“A parte sobre economia é de grande relevância. O desemprego, por exemplo, afeta uma maioria de pessoas negras e periféricas. O aumento da miséria e da fome afetam diretamente os negros. Ele acertou ao dizer que precisa aumentar os investimentos, incentivar o mercado consumidor, melhorar o capital produtivo é uma esperança para o povo negro”, avalia.
Para Regina, também foi positivo o posicionamento do ex-presidente contra as políticas de armamento e ao citar diretamente o genocídio dos jovens negros. “Achei que ele falou de uma forma incisiva que o mercado não precisa temer as políticas que estão em seus planos para o campo social. Por outro lado, o Movimento Negro organizado precisa se posionar para que esse discurso se materialize em propostas nos debates que deverão acontecer na frente ampla que deve ser criada”, explica.
A militante observou que a fala de Lula foi alinhada com o que os debates de ativistas negros têm proposto nos últimos dois anos, desde a posse do presidente Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019. “Ele se posicionou preocupado com as coisas que nos afetam. Podem parecer generalistas, mas se olhar os números da pandemia e da crise econômica, veremos que os negros morrem mais, passam mais fome e estão expostos à violência”, salienta Regina.
Por sua vez, o educador Douglas Belchior, da UneAfro Brasil, organização que compõe a Coalizão Negra por DireitoS, destaca que a fala de Lula foi direta em pontos cruciais e aponta para uma evolução de uma visão racial, porém ainda precisa de uma aproximação com as demandas da sociedade sobre as tensões raciais.
“Lula é um líder popular que sempre será uma opção nas eleições por ser um estadista e um democrata. No entanto, do ponto de vista do debate racial, ele não foge muito do que é a média de aprofundamento da esquerda. Tem limitações que ele próprio reconhece e diz que está lendo mais sobre o tema. Ele precisa conhecer mais sobre a contribuição do movimento social negro para a Justiça no nosso país e o acumulo de conhecimento das lideranças negras históricas, que foi importante para a construção do campo progressista no Brasil e os partidos de esquerda”, considera.
De acordo com o educador, a contribuição do Movimento Negro Organizado é fundamental para entender a realidade do Brasil. “É o caminho também para chegar nas soluções. Não há nenhuma política de Justiça social que pode ser feita sem um profundo recorte racial, visto que é demanda primeira da sociedade. O racismo estrutura as relações políticas do país gerando os problemas e a desigualdade”, reforça Belchior.
Sobre o trecho do discurso de Lula a respeito do desarmamento da população, a militante Simone Nascimento, do MNU, reparou que o ex-presidente deveria ter feito um aprofundamento na proposta. “Ele disse que era para desarmar a população e armar a polícia. Faltou aí um avanço do debate sobre Segurança Pública, que precisa muito ser debatido com o movimento negro organizado. Sabemos que a violência policial e a brutalidade são ferramentas do Estado contra a população negra e o genocídio dos jovens negros”, pondera.
Embora Lula já seja apontado como o principal adversário de Bolsonaro na disputa eleitoral de 2022, o ex-presidente não foi inocentado das acusações feitas pelo ex-juiz Sérgio Moro na Operação Lava Jato. A decisão de anulação do ministro Fachin retirou a competência de julgamento da esfera estadual, do Paraná, para a federal, em Brasília. A suspensão de atual do ex-ministro da Justiça, Moro, também tramita no STF.