Burundi, por exemplo, solicitou aos antigos colonizadores, Alemanha e Bélgica, 36 bilhões de reais pelo período de exploração
Texto: Guilherme Soares Dias | Edição: Nataly Simões | Imagem: Reprodução
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Burundi, pequeno país da região central da África, anunciou que vai solicitar a seus antigos colonizadores, Alemanha e Bélgica, uma indenização de 36 bilhões de euros ― cerca de R$ 225 bilhões ― e a devolução de objetos roubados. De acordo com informações do El País, um grupo de especialistas composto por historiadores e economistas trabalhou desde 2018 para avaliar os danos econômicos sofridos pelo país durante o período colonial (1890-1962). Com base nesse relatório, o governo burundês prepara uma queixa formal, conforme anunciou o presidente do Senado local, Reverien Ndikuriyo.
Os acadêmicos burundeses levaram em conta não só “os trabalhos forçados” e as penas “desumanas, cruéis e degradantes” impostas à população local durante a colonização, como também as consequências das políticas colonizadoras em longo prazo, com efeitos posteriores à independência. Especialmente, o decreto de 1931, que classificou a população em três grupos étnicos e é considerada a semente dos massacres e da guerra civil (1993-2005), que assolaram Burundi depois da sua independência, em 1962, informa o periódico.
Durante e depois da Primeira Guerra Mundial, a Alemanha perdeu todas as suas colônias, e Burundi passou às mãos belgas em 1917. Foi nesta segunda etapa de domínio que a Bélgica, muito mais ativa, instaura a categorização dos colonizados segundo sua etnia: hutu, tutsi ou twa. Isso é aplicado tanto em Burundi como em Ruanda, país vizinho, em uma clivagem étnica que é apontada como a origem dos conflitos atuais: o genocídio de Ruanda (1994), as guerras no Congo e os massacres e guerra civil em Burundi.
As reivindicações para que os países europeus administrem a herança colonial são crescentes, mas nos últimos 10 anos houve apenas gestos simbólicos como a devolução de alguns objetos (uma espada restituída ao Senegal, e uma bíblia e uma chibata à Namíbia), alguns pedidos de desculpas (de Reino Unido, Bélgica e Itália) e uma só indenização (os R$ 144 milhões ao povo mau-mau, no Quênia, pagos pelo Reino Unido).
Tanzânia e Namíbia
A Tanzânia também aumenta a pressão sobre o governo alemão para que assuma a responsabilidade por crimes de guerra cometidos durante o período colonial na África Oriental, informa a agência de notícias Deutsche Walle (DW). No rol de ações brutais estariam o massacre de vários grupos na Revolta de Maji-Maji. O embaixador tanzaniano em Berlim, Abdallah Possi, lançou um apelo no início de 2020 para “negociar reparações”.
O diretor do Museu Nacional da Tanzânia, Achilles Bufure, considerou que essas negociações são urgentes. Como tem especial interesse no acervo cultural do país, Bufure está também preocupado com a devolução de inúmeras obras de arte e bens roubados.
A Alemanha negocia com a Namíbia um pedido formal de desculpas. Representantes dos hereros e namas exigem compensações financeiras e recentemente consideraram inaceitável uma alegada proposta de 10 milhões de euros do governo alemão.
Quênia, Líbia e Congo
O Reino Unido, no entanto, agiu por ordem judicial. Em 2013, depois de perder nos tribunais britânicos, teve que indenizar 5 mil sobreviventes quenianos, além do primeiro pedido de perdão. A Itália anunciou em 2008 um “pacto de amizade” com a Líbia, no qual pediu desculpas “pelos assassinatos, destruição e repressão contra os líbios durante o governo colonial” e se comprometeu a pagar US$ 200 milhões por ano, durante 25 anos, como indenização. Mas o dinheiro do acordo entre Muamar Gaddafi e Silvio Berlusconi na verdade estava destinado à luta contra a imigração irregular, e o pacto se rompeu com a queda do ditador líbio, em 2011.
A França, que continua exercendo influência sobre seus antigos territórios no âmbito econômico, político e militar, anunciou em 2018 que começaria a devolução de 90 mil obras de arte africanas expostas nos museus franceses. Só a partir de julho, quando houve uma mudança legislativa, se tornou possível executar o que foi anunciado.
Em 2018, o Museu Real da África Central em Tervuren, na periferia de Bruxelas, reabriu as portas como Museu África, após seis anos de reformulação para poder apresentar uma “uma visão crítica” sobre o passado colonial. As críticas continuaram já que as peças expostas foram roubadas por missionários e militares durante a época colonial, além da lembrança de que seres humanos foram expostos no começo do século passado nos mesmos museus.
No fim de junho, o rei Philippe, em um reconhecimento histórico e como presente pelos 60 anos de independência da República Democrática do Congo, apresentou um pedido público de desculpas e manifestou o “profundo remorso” pelo passado colonial naquele país, duas semanas depois de estátuas de Leopoldo II serem atacadas na Bélgica durante uma onda de protestos.