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Saúde pública brasileira é tema de discussão em encontro de estudantes negros

25 de maio de 2018

O 2º Encontro de Estudantes Negras e Negros da União Estadual dos Estudantes de São Paulo teve discussões sobre saúde, indústria farmacêutica e psicologia 

Texto e imagem / Thalyta Martins

Durante a tarde de 19 de maio, jovens negros discutiram sobre saúde da população negra, violência obstétrica, psicologia e indústria farmacêutica no 2º Encontro de Estudantes Negras e Negros da UEE-SP (União Estadual dos Estudantes de São Paulo) com Lázaro Souza, da Associação Brasileira das Estudantes de Psicologia (ABEP), e Aline Paixão, estudante de medicina na Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA).

O Encontro foi organizado pela Diretoria de Combate ao Racismo da UEE-SP, em conjunto com o Ilê Axé de Iansã, localizado no Sítio Quilombo Anastácia, que por sua vez está dentro do Assentamento Rural Araras 3.

Duas das participantes da roda que acontecia simultaneamente com outras conversas, entre elas uma sobre negros LGBTs, conversaram com o Alma Preta sobre suas impressões.

Racismo estrutural

Wandersa Martins, estudante de Letras da Universidade de São Paulo (USP), conta que a área da saúde pública e da psicologia não acolhem o negro nas suas questões. “As equipes médicas são formadas por homens e mulheres brancos. [Com isso] a demanda dos pacientes negros que exigem que se discuta o racismo ou coisas relacionadas às suas vivências são enormes, mas não são atendidas.” 

corpodessaWandersa Martins no Encontro de Estudantes Negras e Negros da UEE SP

A pedagoga Crisley Caroline entende que profissionais brancos não dão conta de estabelecer esse diálogo, muitas vezes porque não estão capacitados e por não quererem lidar com a problemática do racismo.

Outra questão discutida pelos presentes dizia respeito à ligação que a educação tem com o racismo e, consequentemente, com a saúde das vítimas. “Uma das questões levantada foi em relação à educação, [sobre] como cuidar da saúde psicológica das nossas crianças e como as instituições de ensino devem olhar para as nossas crianças negras sem o olhar de ‘criança bagunceira, hiperativa e problemática’ quando, por exemplo, ela agrediu um colega de sala por ser chamado de ‘macaco’”, disse Crisley.

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Crisley Caroline no Encontro de Estudantes Negras e Negros da UEE SP

Segundo a pedagoga, isso não significa que o aluno seja problemático. “Ele está sofrendo racismo e afetará a saúde psíquica e física dele, porque a partir dessas falas, o aluno não quer mais ir à escola e se autoagride. De modo geral, o fato de a escola não pensar em uma educação antirracista é um mecanismo para afetar a saúde dessa população”, disse.

Uma outra questão foi a indústria farmacêutica, que, segundo os debatedores, não se preocupa em curar, mas deixar a pessoa que sofre com doenças em estado funcional. “Existem certos remédios baratos para pressão alta e glaucoma que a população negra não pode tomar, porque não têm efeito, mas ainda são passados – a intenção é deixar [a pessoa] funcional. Se ela morrer, não faltará mão de obra, pois há um monte de gente para substituí-la. A aliança entre os hospitais e a indústria farmacêutica coloca na linha principal essa questão de não-cura”, disse Wandersa.

Soluções

Wandersa aponta como uma saída possível a saúde municipal ter mais autonomia e começar a olhar para a população periférica, que é composta, inclusive, por maioria negra. “Eu acho que deveria mudar o sistema, no sentido de haver gestão mais independente por parte dos municípios. Os hospitais são unidades municipais, mas nem toda população tem acesso a eles. Aspectos que resultariam em melhorias seriam trazer mais unidades e mais profissionais para essas áreas mais afastadas”.

Crisley Caroline disse que entender o racismo como estruturante é essencial para entendermos como ele mediará todas as relações humanas e como isso passará pela saúde. “Os dados nos mostram que quem mais morre por mortalidade materna, diabetes e hipertensão é a população negra. Essas são doenças que poderiam ser evitadas com diagnósticos antecipados em 92% dos casos. Se isso não acontece, é porque existe um projeto que nos impede o acesso a esses meios, que são direitos”, afirmou.

Outra solução discutida na roda é a inclusão de mais psicólogos negros, o que, segundo Wandersa, iria atingir a raiz do problema dos pacientes negros que, já com dificuldades, vão até um psicólogo.

Sobre o racismo dentro do consultório, “é necessário haver a denúncia para haver mudança”, disse a estudante. “A orientação do psicólogo Lázaro é que façamos a denúncia, já que, inclusive, existe uma política antirracista na área da psicologia”, completou Crisley.

O documento final do encontro citou também a saúde da população negra como um desafio no Brasil. Segundo o registro, profissionais brancos da saúde não são capazes de compreender o sofrimento de um negro que sofre racismo. Há também um grande impacto sobre a saúde mental das crianças, porque lhes é imposto um discurso de igualdade ao mesmo tempo em que observam e sofrem o racismo o tempo todo.

“Doenças como anemia falciforme, sífilis, hipertensão e tuberculose são consideradas “doenças de preto” e a cura da doença não é objetivo devido ao lucro da indústria farmacêutica, de modo que a medicina se contenta em nos deixar funcionais e aptos para o mercado de trabalho ao invés de saudáveis.”, completou o registro.

A morte de jovens negros por suicídio é apontada também como problemas a ser superado. O documento aponta como solução o acesso e permanência nas universidade brasileiras para que, formados, esses profissionais negros possam, cada vez mais, ocupar o mercado de trabalho formal e possibilitar condições de vida dignas para si e suas famílias.

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