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Alma Preta Jornalismo participa da 1ª Conferência de Jornalismos Plurais em Pernambuco

Realizado em Olinda, encontro reuniu mídias independentes que compõem o Programa de Apoio ao Jornalismo (PAJOR)

Elaine Silva, CEO da Alma Preta Jornalismo e cofundadora da Black Adnet, durante a 1ª Conferência de Jornalismos Plurais.

Foto: Imagem: Fran Silva

5 de dezembro de 2022

Diversidade para um jornalismo representativo. Decolonidade para um jornalismo antirracista. Territorialidade para um jornalismo humanizado. Ao longo de dois dias, a 1ª Conferência de Jornalismos Plurais, que aconteceu no Centro Cultural Luiz Freire, em Olinda (PE), se dedicou a pensar os desafios e cenários para o desenvolvimento da mídia independente no Brasil. Pedro Borges, editor chefe da Alma Preta Jornalismo, Elaine Silva, sócia diretora, e o escritor e colunista Akins Kintê participaram da atividade que simbolizou a culminância do Programa de Apoio ao Jornalismo (PAJOR), promovido pelo escritório da Repórteres sem Fronteiras (RSF) para a América Latina. 

A Conferência debateu o cenário da liberdade de expressão no país a partir da perspectiva de iniciativas dedicadas a fortalecer o direito à comunicação. Em parceria com a Marco Zero Conteúdo (PE), Caranguejo Uçá (PE), Alma Preta (SP), Nós Mulheres da Periferia (SP), Fala Roça (RJ), Data Labe (RJ), Rede Wayuri (AM) e Amazônia Real (AM), o evento celebrou a pluralidade e a diversidade de modos e fazeres jornalísticos a partir de painéis de discussão sobre as diversas nuances relacionadas com o desenvolvimento da comunicação independente, além de traçar um panorama e projeções para o Brasil do futuro. 

“Jornalismo na Era Digital: Uma nova hegemonia de comunicação ou alternativa ao monopólio midiático?” foi o tema da mesa mediada por Pedro Borges, que teve como debatedores Lula Pinto (Universidade Católica de Pernambuco), Elena Wesley (Data_labe), e Helena Martins (Universidade Federal do Ceará). A conversa abordou os impactos das redes sociais na produção jornalística e os novos desafios envolvendo imposições de formatos, discussões algorítmicas, assédio digital, usos de dados pessoais, novos oligopólios, desinformação, entre outros. Em sua fala de abertura, Pedro destacou o trabalho desenvolvido por coletivos como o Faça Roça, Marco Zero Conteúdo e Nós Mulheres da Periferia, que também integraram o Pajor ao longo de três anos de incentivo. 

“Será que é possível pensar uma comunicação não hegemônica alternativa dentro de uma sociedade capitalista? É possível sonhar outras possibilidades, outras relações econômicas e sociais? provocou Pedro, que é um dos fundadores da Alma Preta Jornalismo. Para ele, as redes sociais deixaram de ser apenas plataformas para difusão de conteúdos e passaram a pautar também o que é produzido pelos veículos de comunicação em busca de audiência e influência. O jornalista e professor Luiz Pinto  lembrou que, diferente do sistema de concessões públicas para TV e Rádio, a internet funciona de forma aberta, sem muita regulação, o que impõe novos desafios. Para ele, o jornalismo digital precisa contar com a atuação de diferentes grupos sociais, a exemplo do Poder Legislativo, a política institucional, cientistas e sociedade civil organizada. 

“No geral, o que a comunidade acadêmica no Brasil entende sobre o destino dessa relação entre sociedade e tecnologia é um entendimento desencantado, no caso, a impossibilidade de saídas. Muitas das pessoas que teorizam sobre jornalismo digital utilizam de forma equivocada a palavra encruzilhada para se referir a uma situação sem saída. A encruzilhada é mais do que uma disposição arquitetônica e ela é entendida pela branquitude como um signo de falta de alternativas e não é bem assim. A encruzilhada é justamente o contrário. Seria ótimo se estivéssemos em uma encruzilhada porque significaria dizer que teríamos uma série de possibilidades”, pontuou. 

A mesa também contou com as contribuições de Elena Wesley, da Data_Labe, que apresentou a atuação do projeto, um laboratório de dados e narrativas na favela da Maré, no Rio de Janeiro, criado em 2016 nas dependências do Observatório de Favelas. Em 2018 o Data_labe se tornou uma associação autônoma e sem fins lucrativos. As ações estão divididas nos eixos jornalismo, formação, monitoramento e geração cidadã de dados. Elena falou sobre as implicações éticas relacionadas com o acesso aos dados dos usuários da internet e como até organizações da mídia independente precisam estar atentas ao tipo de informação que colhem via cookies, arquivos de texto enviados por sites aos usuários que navegam por eles, que contêm informações necessárias para identificá-lo na próxima visita. Ela também apresentou ferramentas, campanhas e recursos utilizados pela Dala-Labe para compreender os problemas que vulnerabilizam a população da Maré. 

Independência e sustentabilidade

Os caminhos possíveis para autonomia financeira das mídias independentes foram abordados na mesa “Políticas públicas para o jornalismo local. Como descentralizar recursos e viabilizar o alcance”. O momento reuniu Michel Silva (Fala Roça), Elaine Silva (Alma Preta Jornalismo) e Edgard Patrício (Universidade Federal do Ceará), que falaram sobre suas experiências e olhares sobre as estratégias que promovam maior sustentatibilidade para projetos de comunicação. 

Michel Silva, do Fala Roça, apresentou um panorama sobre a história da democratização da mídia no Brasil revelando dados que demonstram o monopólio e a concentração de poder para alguns grupos econômicos. Ele também destacou a importância de articulações em rede para pressionar legisladores e destacou algumas medidas importantes já previstas no plano de Governo do recém eleito presidente Lula. Para Michel, buscar mecanismos de “defesa da liberdade de expressão é fundamental para o fortalecimento da Democracia e dos Direitos Humanos”. “Precisamos prestar atenção em quem está compondo o governo de transição. É importante ter acesso aos recursos para ter acesso a diversas possibilidades”, comentou.

Com uma experiência ampla em assessoria contábil, Elaine Silva, que faz a gestão financeira da Alma Preta Jornalismo, levou um pouco de sua visão empresarial para a roda de conversa. Ela comentou sobre o cenário que encontrou quando iniciou seu trabalho na agência. Uma realidade muito parecida com a de diversas mídias do país, que possuem muito potencial produtivo, mas pouca estrutura para funcionar. “Nosso tempo é muito precioso, as nossas ideias são preciosas e não podemos admitir que ninguém se aproprie das nossas ideias porque elas têm valor. A minha missão é fazer com que as organizações se enxerguem de forma potente e de que, sim, ela precisa de recursos para se diversificar e se auto sustentar também”. Elaine também ressaltou a importância do fortalecimento das mídias de fora do eixo Sul/Sudeste por meio de linhas de financiamento.

Escrita criativa

A partir do uso da técnica de “aliteração”, Akins Kinte, escritor, músico, poeta e colunista da Alma Preta Jornalismo iniciou sua oficina recitando a poesia autoral “Pelos planos”, do seu livro Muzimba. Autor de outros títulos como “Eu tenho punga”e “InCorPoros”, Akins falou um pouco sobre gêneros literários como possibilidades para a construção de textos mais criativos. O artista dividiu um pouco sobre as referências que influenciam seu trabalho e defendeu a importância do jornalismo se apropriar de outras linguagens para dialogar com a população. 

“O jornalismo precisa ser mais do que literal, precisa ser literato. Eu acredito que utilizar algumas ferramentas, conhecer as estruturas da literatura possibilita que o jornalismo chegue a mais pessoas. A gente entendendo as quebradas, entendendo o linguajar, os lugares onde a gente mora para chegar mais no nosso povo. É importante que a informação chegue de uma forma mais simples para que uma criança ou uma senhora possam ler”, pontua ele que, além de recitar, leu textos de autores consagrados como Manuel Bandeira, além de indicar títulos da Literatura africana. Os/as participantes foram provocados/as a escrever textos jornalísticos a partir de gêneros como crônica, prosa e até rimas e convidados/as a compartilhar com o coletivo suas produções.   

Além da oficina de Escrita Criativa, a Conferência abordou temas como a geração e a divulgação de dados para a cidadania; mecanismos de proteção para jornalistas e comunicadores; bastidores das investigações jornalísticas; e produção de rádio e podcast, entre outros assuntos. Entre os debatedores e oficineiros estiveram integrantes das oito iniciativas participantes do PAJOR, integrantes de vários coletivos de mídia independente e de comunicação periférica que estão presentes no Mapa da Mídia Independente e Popular de Pernambuco e pesquisadores da área.

Apoio à mídia independente 

A conferência exaltou a pluralidade e a diversidade de formatos e modos do fazer jornalístico da mídia independente, promovendo painéis de discussão sobre os desafios, os avanços e o futuro da atividade no Brasil. O direito à comunicação interseccionou debates sobre a produção jornalística dos povos originários; as novas hegemonias das plataformas digitais; a relação entre jornalismo, gênero e liberdade de expressão; a descentralização de recursos de financiamento ao jornalismo independente; e a convergência de mídias na comunicação das periferias.

Provocados/as por Daiene Mendes, do Repórter sem Fronteiras, os/as participantes foram convidados/as a protagonizar o encerramento da Conferência compartilhando reflexões sobre “O futuro do jornalismo no Brasil”. Palavras como “responsabilidade”, “ética”, “diversidade”, “antirracismo”, “democracia”, “territorialidade”, “ancestralidade”, “pertencimento” apareceram nas falas. Entre previsões, análises de conjunturas e desabafos, todas tinham algo em comum: o desejo de continuar usando o jornalismo como ferramenta de educação para a construção de sociedade com justiça social.  

Artur Romeo é diretor do escritório regional do “Repórter Sem Fronteiras” da América Latina e acompanhou os oito coletivos que integraram a PAJOR. Ao longo de três anos, as iniciativas foram beneficiadas com ações de desenvolvimento institucional, capacitação em proteção e segurança, promoção de redes de intercâmbio e produção colaborativa, e mobilização das lutas em defesa da liberdade de expressão e imprensa.

Para ele, o caminho para a consolidação da mídia independente no Brasil passa pela democratização do acesso aos meios de comunicação. “Dentro do Direito à liberdade de expressão o pluralismo é um aspecto fundamental. O que a gente vê no Brasil e nos países da América Latina é um processo de concentração excessiva da propriedade dos meios de comunicação de massa na mão de poucos grupos. Então é fundamental fortalecer e poder contribuir com os movimentos históricos que estão lutando pela democratização da Comunicação”.

Romeo avalia que a conferência se insere dentro de um processo histórico de luta pelo direito à comunicação no país em um momento decisivo. “Tem uma efervescência de coletivos, mídias independentes que estão produzindo jornalismo como ação, comunicação de diferentes formatos, a partir de diferentes lugares, usando o jornalismo como produção de identidades coletivas, de construção de vínculo com territórios. 

É obrigação do estado criar condições políticas para fortalecer tanto a comunicação pública quanto a comunicação independente, local. Garantir que a sociedade brasileira tenha acesso a uma diversidade de vozes dentro do horizonte midiático para que a gente possa superar os desafios que estão colocados”.

Leia também: Alma Preta é a primeira mídia negra com um estande no Congresso da Abraji

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