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Bairros com maioria negra de Salvador têm menos acesso a políticas públicas

Pesquisa inédita da Iniciativa Negra mostra quais os territórios e população mais atingidos pela política de "Guerra às drogas"; bairros nobres, que possuem maior apreensão de entorpecentes, registram poucos casos de violência 

Texto: Dindara Ribeiro | Edição: Lenne Ferreira | Foto: Divulgação/SSP-BA

Violência

22 de novembro de 2021

Mesmo representando mais de 80% dos habitantes de Salvador, a população negra é a mais atingida pela desigualdade territorial e de violência na capital baiana, tendo os bairros com maioria negra como os territórios mais afetados pela violência. A falta de políticas públicas e da garantia de direitos básicos, como cultura e educação, também forarm identifiados pelo estudo inédito “Mesmo que me negue sou parte de você: Racialidade, territorialidade e (r)existência em Salvador”, da Iniciativa Negra Por uma Nova Política Sobre Drogas.

O estudo analisou os indicadores raciais e territoriais para identificar como a violência se organiza em Salvador sob argumento da política de combate às drogas. Com base nos dados coletados em noticiários pela Rede de Observatórios da Segurança, os bairros de maioria negra tiveram maiores índices de violência entre junho de 2019 e fevereiro de 2021, como os bairros de São Cristóvão, com 118 casos; Sussuarana, com 71; e Itapuã, com 62.

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Na chamada “guerra às drogas”, a pesquisa evidencia como essa política atinge de forma violenta territórios específicos, especialmente aqueles ocupados pela população negra.

Leia também: Mortes violentas no Brasil: mais de 90% das vítimas são meninos e 80% são negros

Enquanto o bairro da Pituba, área nobre de Salvador composta por maioria branca, possui altos índices de registros de uso e porte de substâncias entorpecentes, nenhuma morte violenta foi identificada no bairro no período analisado. Já no Nordeste de Amaralina, bairro majoritariamente negro, o número de mortes violentas é maior enquanto o registro de uso e porte de entorpecentes é menor.

Segundo o historiador e co-fundador da Iniciativa Negra, Dudu Ribeiro, a pesquisa é essencial para se pensar em novos modelos de segurança pública, levando em consideração as desigualdades raciais e socioeconômicas que atingem os territórios.

“A pesquisa demonstrou que, apesar da política de guerra às drogas ter CEP, endereço, lugar para onde se dirige as políticas de repressão, não é verdade que todo território onde existe consumo ou porte de substâncias é um ambiente violento, como ficou nítido nos números dos bairros mais embranquecidos”.

Abuso de força da segurança pública lidera os eventos de violência em Salvador

Ao todo, o estudo considerou 3.040 eventos de violência ocorridos na capital baiana, excluídos os casos cujas localidades não foram identificadas. Metade dos eventos violentos em Salvador está relacionado com abuso e excesso por parte de agentes do Estado, totalizando 1.447 casos monitorados. O segundo maior número de casos se refere às ações de policiamento (663), eventos envolvendo armas de fogo (244) e mortes em ações de policiamento (212), evidenciando a presença constante de agentes da segurança pública em casos de violência.

A Iniciativa Negra também alerta para a falta da disponibilização dos dados oficiais pela Secretaria da Segurança Pública, que, segundo o estudo “os referenciais valorados como mais relevantes para a política de segurança pública elencam, em geral, os delitos contra à vida, ao patrimônio e o uso/porte de substâncias entorpecentes”.

A pesquisa também mostrou como a atuação midiática reforça os estereótipos de marginalização dos territórios ocupados pela população negra. Apesar da Pituba registrar altos índices de apreensão de entorpecentes, o bairro não é classificado com estigma de violência.

“No que se refere às notícias, cotidianamente as imagens de pessoas negras são expostas e associadas à criminalidade, sem qualquer preservação do seu direito fundamental à imagem, enquanto a exposição de pessoas brancas na condição de autoras de delitos é inexpressiva e quando acontece, normalmente vem cercada por cuidados não são direcionados aos demais”.

Acesso à cultura e direitos básicos são limitados a regiões centrais de Salvador

A restrição a equipamentos de cultura e direitos básicos, como saúde e educação, também surgem como parte do controle social e racial na cidade, conforme cita o estudo.

Em toda cidade, apenas duas regiões contam com mais de um equipamento público de cultura: nos Barris (4), região central de Salvador; e na Barra (3), área nobre. Já as localidades apontadas com maiores índices de violência não contam com nenhum equipamento público de cultura, como as regiões do Cabula/Tancredo Neves, Pau da Lima e Nordeste de Amaralina.

Em relação aos equipamentos de saúde, o estudo cita que os dados, coletados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), são difusos e sem maiores detalhamentos. O que se identificou foi que os bairros com maior número de notícias sobre violência sofrem com a baixa cobertura de equipamentos e políticas públicas, limitando o acesso à direitos básicos apenas em pontos específicos da cidade.

“A restrição ao acesso de direitos básicos é significativo da distribuição racialmente desigual de oportunidades para as pessoas nos territórios de Salvador. Fora isso, ele fortalece os sentidos estigmatizantes sobre o território a partir da restrição de oportunidades de existência para as pessoas viventes naqueles bairros”, completa o historiador.

  • Dindara Paz

    Baiana, jornalista e graduanda no bacharelado em Estudos de Gênero e Diversidade (UFBA). Me interesso por temáticas raciais, de gênero, justiça, comportamento e curiosidades. Curto séries documentais, livros de 'true crime' e música.

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