Voltada para o acolhimento de mulheres em situação de vulnerabilidade e violência, a Casa Preta Zeferina, em Salvador, completa um ano nesta sexta-feira (25), data que marca o Dia Internacional da Não-Violência contra as Mulheres. Criado pelo Movimento de Mulheres Olga Benário, o espaço foi o primeiro núcleo do movimento no Norte-Nordeste e já realizou mais de 100 atendimentos desde o ano passado.
O nome Preta Zeferina é uma homenagem à líder quilombola e ex-escravizada que organizou a população negra e indígena na luta contra a escravidão em Salvador. A ocupação, localizada na Ladeira do Baluarte, no Centro Histórico da capital baiana, oferece atendimentos gratuitos com auxílio de uma rede de profissionais voluntárias que atuam como psicólogas, advogadas, assistentes sociais, entre outros.
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
Segundo Milena Rocha, uma das coordenadoras da Casa, a iniciativa se deu a partir da necessidade de montar um local de acolhimento para as mulheres vítimas de violência na Bahia. Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2020, a Bahia foi o estado que mais registrou mortes de mulheres no país. Em 2021, foram contabilizados 88 casos de feminicídio no Estado.
“A gente percebeu uma política pública que não é suficiente para atender a demanda das mulheres, políticas muito precárias fornecidas pelo Estado, então a gente sentiu a necessidade de se organizar e de construir uma ocupação de mulheres para nos fortalecermos”, comenta Milena Rocha, integrante do movimento Olga Benário e uma das coordenadoras da Casa Preta Zeferina.
Desde o ano passado, a Casa Preta Zeferina já realizou 150 atendimentos e cursos para formação política e econômica para mulheres em situação de vulnerabilidade. De acordo com Milena Rocha, o perfil das mulheres atendidas é de mulheres negras, mães, oriundas de bairros populares, desempregadas e que sofrem violência doméstica.
À Alma Preta Jornalismo, a coordenadora Milena Rocha conta que a maioria das mulheres atendidas relatam que se sentem inseguras em pedir ajuda pela falta de acolhimento nas delegacias.
“A maioria dessas mulheres já foram na delegacia e não se sentiram acolhidas e elas procuram a casa para ter esse acolhimento, tanto psicológico quanto jurídico. São mulheres que se sentem muito desacreditadas com o atendimento ofertado pelo Estado e muitas vezes elas ficam até ressentidas em procurar ajuda”, ressalta.
Por se tratar de um movimento popular e coletivo, o movimento Olga Benário organiza a Casa Preta Zeferina com ajuda de doações e voluntários. Recentemente, o fim da Lei do Despejo Zero, decretado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), tem se tornado uma das preocupações do movimento, que constrói os espaços de acolhimento através da ocupação de imóveis abandonados pelo Estado.
“Esse é um momento para a gente acirrar ainda mais a nossa resistência. A gente se preocupa porque estávamos um pouco mais asseguradas por causa da lei do despejo zero e agora estamos em um processo de que essa lei está chegando ao fim, mas a gente também entende que a gente sempre resistiu e vai seguir resistindo”, diz Milena Rocha.
Giovana Ferreira, integrante da coordenação nacional do movimento Olga Benário e da Casa Preta Zeferina, ressalta a necessidade do poder público tratar as questões de ocupações fora da lógica policial.
“A está numa situação de alerta porque a qualquer momento pode vir a acontecer, mas não deixaremos de resistir porque entendemos que é fundamental uma casa como a Preta Zeferina para acolher as mulheres vítimas de violência e também entendemos que é fundamental a luta pelos movimentos de moradia para poder denunciar a questão do déficit habitacional que existe no nosso país”, completa Giovana.
Samba da Zeferina
Como forma de comemoração pelo um ano da Casa Preta Zeferina e para ampliar a luta pelo enfrentamento à violência contra a mulher, a Casa Preta Zeferina realiza, neste sábado (26), o “Samba da Zeferina”. O evento irá contar com a venda de feijoada e a participação do grupo Samba de Pretas e das cantoras baianas Tamara Lopes e Isis Valentini.
De acordo com Milena Rocha, uma das coordenadoras da Casa Preta Zeferina, o objetivo do evento também é promover o acesso à cultura local e a formação política para mulheres e movimentos populares.
“A gente entende a importância do samba para a população negra, para a população pobre e vamos fortalecer a cultura na cidade de Salvador porque a gente entende que a população mais pobre não tem acesso à cultura, além de estar fortalecendo as bandas que não tem tanta visibilidade na produção popular da cidade”, ressalta.
Já a coordenadora Giovana Ferreira pontua que o evento visa ampliar as políticas de enfrentamento à violência contra a mulher, além de auxiliar no financiamento da Casa.
“Esse evento é principalmente para fazer um ato político para falar sobre a importância da Casa Preta Zeferina. Dizer que nós precisamos de mais espaços como esse, que sejam financiados pelo Estado, pela prefeitura, e que tenha uma estrutura e infraestrutura confortável para essas mulheres”, finaliza.
Os ingressos e a programação do evento estão disponíveis nas redes sociais da Casa Preta Zeferina.
No canal do Youtube da Alma Preta Jornalismo também é possível assistir uma entrevista com a coordenadora da Casa Preta Zeferina, Giovana Ferreira. Confira abaixo:
Leia também: Neurodivergentes: a luta de pessoas negras para além do racismo