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Caso Ricoy: Protesto contra tortura de adolescente fecha as portas do supermercado

Manifestação ocorreu no sábado, 7 de setembro, em frente às duas unidades da rede varejista na Cidade Ademar, bairro da Zona Sul de São Paulo

8 de setembro de 2019

As duas unidades da rede de supermercados Ricoy, na Avenida Yervant Kissajikian, no bairro Cidade Ademar, na Zona Sul de São Paulo, fecharam as portas no sábado, 7 de setembro, após manifestação de organizações do movimento negro contra o caso de um adolescente torturado por dois seguranças.

Um dos objetivos do protesto era ressaltar a importância dos donos da rede de supermercados serem responsabilizados pela violência praticada contra o jovem. Na quarta-feira, 4 de setembro, a Coalizão Negra Por Direitos protocolou no Ministério Público um pedido para que o Ricoy responda judicialmente pelo crime.

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Os manifestantes chegaram no local por volta do meio dia e permaneceram em frente ao estabelecimento onde ocorreu o crime, na altura do número 3.300, até às 15h. Depois, eles seguiram para a outra unidade do Ricoy, na mesma avenida. O ato foi pacífico e nenhum representante da rede de supermercados falou com o público ou com a imprensa.

Elaine Mineiro, integrante da Uneafro Brasil e da Coalizão Negra por Direitos, avalia que o protesto mostrou a força da luta da população negra.

“O Ricoy não se preocupou em colocar alguém para dialogar conosco. Eles estavam cientes de que o movimento negro iria protestar, mas acharam que não ia dar em nada. Nossa ação mostrou que estamos de olho na violência praticada por eles”, afirma.

De acordo com Elaine Mineiro, o crime de tortura praticado contra o jovem não se trata de um caso isolado. “Quem mora na periferia sabe que violências como a sofrida pelo adolescente são comuns em estabelecimentos comerciais. A barbárie está tão generalizada que os seguranças chicotearam o jovem e ainda filmaram”, explica.

No vídeo de 40 segundos divulgado nas redes sociais, o adolescente negro, de 17 anos, é chicoteado por dois funcionários da rede de supermercados. Amarrado e nu, o jovem se contorce de dor a cada golpe recebido nas costas.

O delegado Pedro Luis de Sousa acredita que o vazamento do vídeo seria um “recado” para eventuais praticantes de furtos no supermercado. Segundo o boletim de ocorrência, o adolescente foi torturado porque furtou barras de chocolate da rede varejista. Em seu depoimento, o jovem contou ter ouvido um dos funcionários dizer que se ele o denunciasse iria matá-lo.

O Conselho Tutelar da Cidade Ademar deve buscar assistência psicológica à vítima. O jovem vive nas ruas do bairro periférico da Zona Sul há cinco anos.

Segundo Marilene Maciel, integrante do Comitê de Luta Por Direitos da Cidade Ademar, existem outros jovens na mesma situação no bairro. “Eles não têm o direito à moradia resguardado e, consequentemente, outros direitos também não”, lamenta.

Depois da repercussão do vídeo, a Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Nacional da Advocacia Negra (ANAN) emitiram notas de repúdio ao caso.

As duas entidades destacaram que o chicoteamento praticado contra o jovem se enquadra na lei federal 9.455, de 1997, que constitui crime de tortura. A legislação brasileira estabelece que a tortura ocorre quando uma pessoa é submetida, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental. A pena prevista para o crime é de 2 a 8 anos.

Conscientização

Douglas Belchior, educador social da Uneafro Brasil e integrante da Coalizão Negra Por Direitos, lembra que a manifestação também cumpriu um papel de conscientizar a população local.

“Enquanto protestamos, moradores da região passam por aqui e apoiam porque mesmo que o adolescente negro tenha furtado as barras de chocolate, ele não deveria ter sido torturado”, pontua.

Para o movimento negro, o crime de tortura envolvendo o jovem negro reflete a realidade do racismo no Brasil. O Atlas da Violência 2019 mostra a população negra como vítima de 75,5% dos casos de homicídio registrados no país em 2017.

Douglas Belchior observa que há quem acredite que o caso não se trata de racismo porque a vítima poderia ser uma pessoa branca em vez do adolescente negro.

“A família que teve o carro alvejado por 80 tiros no Rio de Janeiro também poderia ser branca, assim como os mortos decapitados no presídio em Altamira também poderiam ser de maioria branca. Mas não são porque brancos não têm seus corpos violados pela tortura e pela miséria como os negros”, pondera.

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  • Nataly Simões

    Jornalista de formação e editora na Alma Preta. Atua há seis anos na cobertura das temáticas de Diversidade, Raça, Gênero e Direitos Humanos. Em 2023, como editora da Alma Preta, foi eleita uma das 50 jornalistas negras mais admiradas da imprensa brasileira.

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