O furto de dois bolos e um achocolatado do mercado Carrefour fez a juíza Luciana Scorza pedir a prisão preventiva de Francisco*. O fato ocorreu no dia 17 de maio, terça-feira, na Avenida Doutor Gentil de Moura, em São Paulo (SP). Com suspeita de tuberculose e desempregado, Francisco alegou não se alimentar por dois dias para pegar os produtos, avaliados em R$ 23,57.
Francisco efetuou o furto e saiu da loja, quando foi avistado por dois policiais militares, que o abordaram. Ele foi questionado acerca dos produtos que carregava consigo e admitiu ter efetuado o roubo por conta de fome. Um funcionário do Carrefour, que seguia Francisco, se juntou aos policiais, confirmou o ato e reiterou não ser a primeira vez.
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Francisco diz estar em situação de rua na região do Ipiranga, mas apresentou um endereço fixo em audiência de custódia. Ele tem 32 anos e se autodeclara como branco. Francisco é reincidente no crime de furto, com outras condenações pelo mesmo crime.
Como justificativa para a sentença, a juíza Luciana Scorza alegou que Francisco* cumpria pena em regime aberto acerca de um delito similar. A Defensoria Pública, contudo, nega a informação e sinaliza que a previsão de encerramento da pena era o dia 7 de abril de 2022. A informação da defensoria foi confirmada pelo Ministério Público, responsável pela acusação.
A prisão em flagrante, a ausência de emprego, e de endereço fixo foram os argumentos utilizados pela juíza Luciana Scorza para o pedido de prisão preventiva. Ela também alega que a decisão é uma forma de garantir a “ordem pública”.
Por estar em situação de rua e não ter emprego, a juíza diz que não há como garantir a “vinculação de culpa”, e “eventual aplicação da lei penal”. Qualquer medida de relaxamento da prisão preventiva poderia gerar “presumível retorno às vias delitivas, meio de sustento”, diz o texto do Tribunal de Justiça de São Paulo, assinado por Luciana Scorza.
A Defensoria Pública refutou os argumentos apresentados para justificar a prisão preventiva. O órgão aponta que o dia 17 foi tratado como o mais frio de São Paulo dos últimos 30 anos, com temperaturas na casa de 6°C, que Francisco apresentou um endereço fixo, e que estava empregado recentemente. Rebateu também qualquer associação de que a falta de emprego possa induzir o sujeito para a prática do crime.
“Além disso, ao utilizar a referida fundamentação, a magistrada está basicamente afirmando que todos aqueles que não possuem ocupação lícita devem ser detidos, desconsiderando completamente a situação de vulnerabilidade social em que se encontra a grande parcela da população brasileira – que, em sua maioria, ou está desempregada, ou possui empregos informais. Por óbvio que o fato de alguém não conseguir comprovar documentalmente possuir atividade remunerada não pode ser usado como elemento a fazer presumir que a pessoa se dedica a atividades ilícitas”, diz o pedido de habeas corpus.
A juíza se opôs ao princípio da insignificância, que pode flexibilizar ou anular uma pena quando o fato tem baixa “ofensividade”, “nenhuma periculosidade social”, “grau reduzido de reprovabilidade” e “inexpressividade da lesão jurídica”. Ela sinalizou que a reincidência descaracteriza o critério da insignificância. A defensoria discorda e indica que o valor dos produtos furtados está dentro do princípio e que não houve qualquer ato de violência por parte do acusado e, por isso, não coloca em risco a ordem pública.
A defensoria também entende a prisão preventiva como aplicação desproporcional de pena para um crime, como de furto, que pode gerar no mínimo um ano de reclusão e no máximo quatro, em situação de reincidência. O órgão pede uma medida cautelar, para que Francisco se apresente de maneira periódica para a justiça e responda ao processo em liberdade, ou que ele responda ao processo em regime domiciliar, em face da tuberculose.
O caso foi registrado no 16° Distrito Policial da Vila Clementino e foi acompanhado pelo delegado Stefan Uszkurat. A prisão foi efetuada pelos policiais militares Leandro dos Santos e Rafael Alcântara.
*Francisco é um nome fictício, adotado para preservar a pessoa.