O Brasil sancionou sua primeira política nacional de cotas apenas em 2012, com a Lei 12.711. A adoção dessa política representa um importante modelo para outros países, que possuem sistemas diferentes, adaptados à cultura regional. Em maio deste ano, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou o Projeto de Lei (PL) 1.958, que prorroga por mais 10 anos a política de cotas raciais para concursos públicos e processos seletivos para a administração pública federal, direta e indireta, incluindo fundações privadas e autarquias.
Em entrevista à Alma Preta Jornalismo, Márcia Lima, secretária de Políticas de Ações Afirmativas, Combate e Superação do Racismo (Separ) do Ministério da Igualdade, ressalta que “no Brasil, temos um projeto diferente a respeito de cotas raciais, que os Estados Unidos não têm”.
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Um exemplo é a Índia, que adotou a política de cotas pela primeira vez na década de 1950, para promover ações afirmativas que integrassem a população tradicionalmente excluída nos sistemas educativos, na administração pública e nos cargos políticos. O antigo sistema de castas indiano fazia distinção entre as pessoas com base na origem da família, criando um aparato social de forte exclusão das populações pertencentes à casta mais baixa ou que não possuíssem casta.
Nos EUA, as cotas não se tornaram parte da constituição, como foi feito na Índia. No entanto, desde 1961, sob influência de Martin Luther King Jr, as políticas passaram a ser implementadas, através de empregos para a população negra, criado pelo governo de J. F. Kennedy.
Outros países também adotaram políticas de cotas para incluir as populações vulneráveis e excluídas na educação, no serviço público e em sistemas políticos. No Canadá, por exemplo, as políticas afirmativas foram adotadas em 1986 e aprimoradas em 1995, promovendo a inclusão no mercado de trabalho para mulheres, indígenas, deficientes, esquimós e não-brancos. Na Malásia, as ações afirmativas existem desde 1970 e reduziram a pobreza de 52% para 8,1% em 1999.
Já na África do Sul, as cotas foram implementadas para diminuir os efeitos do apartheid, adotadas desde 1993. A política visa financiamento especial e criação de metas em setores público e privados para pessoas com deficiência, negros e mulheres, além da reserva de vagas nas universidades públicas e privadas. Outros países, como a Austrália – com cotas para os aborígenes – e a Colômbia, também adotam diferentes sistemas para incluir as populações vulneráveis e excluídas.
Brasil
No Brasil, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) foi a pioneira em adotar um sistema de ações afirmativas em 2003. Já em 2004, a Universidade de Brasília (UnB) se tornou a primeira instituição pública federal a implementar um sistema de cotas.
A partir de 2007, o programa de expansão e investimento nas universidades e institutos federais, conhecido como Reuni, ampliou o debate sobre as cotas raciais por meio dos conselhos universitários. A proposta de implementar cotas para estudantes de escolas públicas, com subcotas para negros, pardos e indígenas, foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal, que votou por unanimidade pela constitucionalidade das ações afirmativas. Em 2012, a Lei 12.711 foi sancionada, regulamentando o sistema de cotas em universidades e institutos federais de ensino.
O debate sobre as cotas raciais se intensificou no Brasil após a sanção da lei. De um lado, movimentos sociais, ONGs, intelectuais e juristas defendem a necessidade das cotas sociais e raciais para solucionar os problemas de desigualdade no país.
Eles argumentam que a exclusão social e o racismo estrutural levam a uma necessidade de implantar medidas que promovam a igualdade, reconhecendo que primeiro é preciso estabelecer um sistema de equidade. Isso significa criar ações afirmativas que efetivamente incluam as pessoas excluídas na sociedade, após anos de discriminação resultante da escravização e do racismo estrutural.