Organização denuncia a histórica ausência de políticas públicas para as milhares de comunidades quilombolas do país
Texto: Flávia Ribeiro | Edição: Simone Freire | Imagem: Thiago Gomes / Agência Pará
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) fez 24 anos de existência nesta semana diante do maior desafio: a pandemia de Covid-19, o novo coronavírus. “O Covid-19 é um desafio para todo o mundo, mas é mais acentuado para as populações que historicamente são excluídas de políticas públicas”, comenta Givânia Silva, membro-fundadora da entidade.
A Constituição Federal de 1988 foi fundamental para o estabelecimento e organização do movimento quilombola no país. Ainda assim, das mais de três mil comunidades quilombolas presentes nas cinco regiões do país, pouco mais de cem possuem o título de terras. “Outro elemento é o Estado brasileiro nunca ter feito um recenseamento sobre as comunidades quilombolas. Era uma promessa para 2020, que ficou para 2021. Os dados preliminares, do Censo, que é feito antes de inserir uma categoria censitária, indica que ultrapassa seis mil comunidades quilombolas no Brasil”, destaca Givânia.
Ela pontua que falta de políticas públicas que amparem as comunidades quilombolas faz com que o enfrentamento à pandemia seja um grande desafio. “A Covid vem aflorar essa situação porque os quilombolas não conseguem fazer muitas das medidas de prevenção, uma vez que há um déficit grande de políticas públicas nesses lugares. Como posso pedir que uma pessoa fique em casa se o território que ela vive não é regularizado e, por isso, ela não consegue produzir seus alimentos ou produz em pequenas quantidades e precisa ir às pequenas feiras para vender? E essa mesma pessoa não tem internet, não tem energia elétrica, logo não consegue acessar o aplicativo disponibilizado pelo governo federal e não tem como acessar o auxílio emergencial. Como peço para uma pessoa lavar as mãos várias vezes, se ela não tem água nem para beber?”, indaga.
Givânia fala que, apesar das dificuldades historicamente impostas e da violência do impacto do coronavírus, a organização não poderia deixar de marcar mais um aniversário de existência e resistência. “Decidimos fazer uma intensa programação como oportunidade de denunciar um crime de racismo institucionalizado e naturalizado a que são submetidos os quilombos e os negros do Brasil”, relata.
História
Segundo Ivo Fonseca, do quilombo Frechal no município de Mirinzal (Maranhão), a história da instituição está junto com à história da luta de sua, e com a luta da criação da ACONERUQ (Associação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Maranhão) com o apoio do Centro de Cultura Negra, o MNU (Movimento Negro Unificado), o Cedenpa (Centro de Estudos e Defesa do Negro – Pará) e o Movimento Negro do Rio de Janeiro.
“A luta da Conaq é feita com um monte de companheiros e companheiras que idealizaram essa estrutura que temos hoje. Mas ela se dá desde quando as organizações do movimento negro perceberam que as comunidades quilombolas estavam com muita dificuldade, e têm até hoje, na sua retomada, na sua estruturação de seu território, perca de território. A partir de 1986 a gente – o MNU – começa a fazer as assembleias estaduais em prol da constituinte”, destaca Fonseca, que é um dos co-fundadores da articulação.
A instituição foi se estruturando a partir de 1995, no primeiro encontro, e hoje tem representante em 23 estados. “Eu espero que a Conaq tenha a sua mobilidade política cada vez maior. Que hoje os nossos netos, bisnetos – quem já tem – sobrinhos que estão crescendo, que tomem de conta dessa estrutura que nós criamos. Eu digo que foi um espelho dos nossos antepassados. Tudo o que a gente faz não é nada atoa. Nossos antepassados que dizem, que nos guiam, porque nós contribuímos com a letra, que é muito”, afirma.
Boletim epidemiológico
A Conaq termina a semana contabilizando 21 óbitos, 128 casos confirmados, 36 casos monitorados. Os óbitos estão ocorreram nos estados do Amapá, Bahia, Goiás, Maranhão, Pará, Pernambuco e Rio de Janeiro.
*Fotos internas: Ana Carolina Fernades – Ivo Fonseca e Divulgação – Givânia Silva