“Primeiro jogador a fazer gol em cinco Mundiais”, a frase estampa as manchetes de diversos jornais de abrangência nacional e internacional. A afirmação se refere a Cristiano Ronaldo, o camisa 7 da seleção portuguesa de futebol, que balançou a rede, ao todo, oito vezes em Copas do Mundo. Porém, essa posição de artilheiro na história das copas não é apenas uma característica de Ronaldo. Marta Vieira da Silva, a camisa 10 da Seleção Brasileira de Futebol Feminino, contabiliza 17 gols marcados em cinco edições da Copa do Mundo da categoria (2003, 07, 11, 15 e 19) – sendo a maior artilheira de todos os tempos, inclusive se considerar o torneio masculino.
Nos últimos dias, o jornal espanhol Marca noticiou que Cristiano Ronaldo recebeu uma proposta do Al Nassr, clube da Arábia Saudita. Caso se confirme, Ronaldo se tornaria o jogador mais bem pago do mundo, com vencimentos anuais girando em torno de 200 milhões de euros (R$ 1,1 bilhão). Atualmente no Orlando Pride, dos EUA, Marta recebe aproximadamente 380 mil euros por temporada. Para efeito de comparação, o valor que ela recebe anualmente é menor que o valor que CR7 receberia por dia no Al Nassr (548 mil euros).
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
A discrepância da valorização entre o futebol masculino e o feminino é conhecida. Em 2019, quando houve a última Copa do Mundo feminina, a Organização das Nações Unidas (ONU) ressaltou a diferença de pagamento entre as categorias masculina e feminina do esporte.
Em julho deste ano, o time comandado pela técnica sueca Pia Sundhage contou com 24 atletas na disputa da Copa América que aconteceu na Colômbia. Destas, 9 eram negras, de acordo com o comparativo feito pela Alma Preta: Letícia Oliveira, Luciana, Tainara, Kerolin, Duda, Ary, Geyse, Bia Zaneratto e Rafaelle.
Cabe destacar que a avaliação considera apenas atletas cis-gênero. Caso a pauta abrangesse, também, mulheres trans no esporte, a discussão seria atravessada por uma série de debates, desde a .
Lutando por igualdade
Leila Salvini e Wanderley Marchi Júnior analisaram relatos acerca das dificuldades e motivações enfrentadas por jogadoras de futebol no Brasil. Eles conversaram com quatro jogadoras de um clube de futebol amador da cidade de Curitiba (PR) que em algum momento de suas carreiras defenderam a seleção brasileira. Após análise das informações, constataram que o preconceito – seja de gênero ou pela falta de incentivo – é recorrente no discurso delas, assim como, o adjetivo “guerreiras” aparece como sendo uma característica “nata” das mulheres que buscam a prática do futebol e depositam nele seu ensejo profissional.
A Alma Preta Jornalismo conversou com Layane Bento, jogadora amadora que atua em equipes brasilienses. De acordo com ele, a frase que mais ouviu era que “mulher não entende, não joga e não deve opinar em futebol.”
A atacante, que começou no futebol há 10 anos, acredita que o termo ‘guerreiras’ representa o empoderamento feminino no futebol. Porém, deve-se lembrar que as mulheres podem ter as mesmas habilidades de homens, mas não têm o mesmo reconhecimento.
“Temos a nossa craque feminina Marta, camisa 10 da seleção feminina do Brasil, onde não é reconhecida pela sua habilidade por ser mulher, vemos a diferença salarial comparada com o camisa 10 da seleção masculina”, apontou.
Como forma de enfrentamento, Marta procurou evidenciar a luta pela igualdade de gênero na Copa do Mundo de 2019. Ao fazer gol contra a Austrália, na segunda rodada da fase de grupos, ela mostrou o símbolo da campanha ‘Go Equal’, que levava na chuteira.
Tendo sido abordada por patrocínios das gigantes do mercado esportivo com valores muito abaixo dos oferecidos para os homens, ela então, trocou as chuteiras brancas por chuteiras pretas, sem nenhum patrocínio, mas com o símbolo pela equidade de gênero nos esportes, iniciativa das Nações Unidas.
Este ano, a luta pela equidade salarial ganhou um novo e importante capítulo. O acordo envolvendo as jogadoras de futebol nos Estados Unidos e a U.S. Soccer – a federação de futebol dos EUA – foi um embate de seis anos. O sucesso se consolidou ao ser definido que as atletas receberão 24 milhões de dólares, com base nos cálculos feitos em relação à diferença salarial quanto aos homens.
Entretanto, essa luta está longe de terminar. Segundo informações da BBC, estima-se que Leah Williamson, capitã da Inglaterra e campeã da Euro, tenha ganhado £ 200 mil (R$ 1,28 milhão) ao longo da última temporada (2021/22). Enquanto isso, Harry Kane, capitão da seleção masculina, ganha a mesma quantia em apenas uma semana.
Para Layane, a equidade salarial é apenas um detalhe. A luta das mulheres no futebol perpassa por reconhecimento, visibilidade, quebra de preconceitos, luta contra todo tipo de assédio. Ela dá um recado para as atletas mais jovens que queram entrar no mundo do futebol:
“Acredite sempre que seus objetivos serão alcançados, nenhum sonho é impossível. Exercite sua mente, a excelência física vem da excelência mental. Persista, e prove para todos a sua capacidade”, conclui.
Leia mais: Maioria no elenco atual, jogadores negros foram excluídos da Seleção há 100 anos