Pesquisa conduzida pelo Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp apontou que 65,7% das mulheres entre 18 e 49 anos no Estado de São Paulo já passaram por uma gravidez não planejada. A proporção é ainda maior entre mulheres negras e pardas, alcançando 74% dos casos.
O levantamento foi feito com 534 gestantes residentes em diferentes regiões do estado. Os dados fazem parte da pesquisa de doutorado do sociólogo Negli Gallardo-Alvarado. O artigo com os resultados foi publicado no periódico The European Journal of Contraception & Reproductive Health Care.
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Fatores associados ao risco de gestação não planejada
A pesquisa identificou outros fatores associados ao risco de gravidez sem planejamento. Entre as mulheres com menor escolaridade, o índice atinge 77%. Entre as solteiras, chega a 85%, e entre as amasiadas (relacionamento de convivência íntima sem o vínculo formal do casamento), 72%. A situação muda para quem está legalmente casada, na qual os índices são menores.
Além de etnia, escolaridade e estado civil, o estudo apontou como fatores contribuintes a falta de renda própria, a baixa escolaridade do parceiro e a paridade — número de filhos já tidos.
Metodologia e diferencial do estudo
Gallardo-Alvarado utilizou um questionário desenvolvido com base no London Measured of Unplanned Pregnancy, buscando mensurar com mais precisão as intenções em relação à gravidez. A maioria das participantes respondeu ao questionário online; uma parte foi entrevistada presencialmente no Cemicamp, em Campinas.
Segundo o orientador da tese, o médico Luis Bahamondes, a abordagem adotada torna os dados mais fidedignos. Ao aplicar o questionário durante a gestação, o estudo evitou distorções comuns em pesquisas feitas após o nascimento da criança, quando memórias podem se alterar por fatores emocionais.
Gravidez não planejada no contexto da desigualdade racial
Os dados revelam a persistência de desigualdades estruturais no acesso ao planejamento reprodutivo, especialmente entre mulheres pretas e pardas. Para Gallardo-Alvarado, o acesso à educação é um fator decisivo para reverter esse cenário. “A melhora na educação promove uma melhora na saúde das pessoas”, argumenta em publicação da Unicamp.
Bahamondes, por sua vez, defende políticas públicas voltadas à ampliação do acesso a métodos contraceptivos de longa duração, como o Dispositivo Intrauterino (DIU) com hormônio e o implante hormonal. Segundo ele, o Brasil ainda falha ao não garantir essas opções de forma ampla e contínua.
O estudo reforça que uma gravidez não planejada tem efeitos duradouros sobre a vida da mulher. Gallardo-Alvarado observa que, diante das desigualdades de gênero, os homens tendem a não arcar com as consequências de uma gravidez inesperada. “Para a mulher, há um antes e um depois”, afirma.