PUBLICIDADE
PUBLICIDADE
Pesquisar
Close this search box.

Dia Nacional da Saúde: o que nos ensina Omolu, o orixá da cura?

Em agosto, mês em que se comemora o Dia Nacional da Saúde, também é marcado pelo ritual Olubajé, em que os adeptos pedem ao senhor da terra que retire as doenças da comunidade

Imagem mostra uma ilustração do orixá Obaluaiê, coberto de palhas e com pipocas ao redor.

Foto: Imagem: I’sis Almeida/Alma Preta

5 de agosto de 2022

“Silêncio, ele está entre nós. Atotô”. É dessa forma que os adeptos de religiões de matriz africana saúdam o grande senhor da terra, Omolu ou Obaluaiê. Relacionado à saúde e àquele que detém todas as mazelas do mundo, a divindade do panteão africano é o símbolo do mês de agosto no Brasil e anfitrião de uma das cerimônias mais emblemáticas no candomblé: o Olubajé, ou grande banquete do rei.

Para quem cultua orixá, pipoca é o principal remédio e agosto é o mês de Obaluaiê. Segundo o babalorixá André Gomes, os rituais de candomblé em homenagem a Omolu e Obaluaiê sempre contam com as pipocas devido a uma lenda – ou itãn.

Quer receber nossa newsletter?

Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!

“Omolu se cobria todo de palhas por seu corpo ser marcado por chagas. Vendo isso, Oyá soprou seus ventos e transformou as feridas em pipocas, mostrando ao mundo a beleza desse orixá. É simbólico para nós: o ato de transmutar uma situação difícil em algo que nos alimenta o corpo”, explica o sacerdote.

O líder religioso conta que uma das características do orixá é a observação e o silêncio. Seus filhos, segundo ele, são instrospectivos, ressentidos, “mas donos das maiores virtudes humanas: a lealdade e a empatia”. As lendas dizem que Obaluaiê correu o mundo e se compadeceu com o sofrimento da humanidade. Sentiu na pele a fome, as dores e doenças, e mostrou que nada é mais importante do que a saúde – uma das poucas coisas que o dinheiro não pode comprar.

“Entenda: Omolu não é apenas a cura, ele é quem carrega as doenças e quem permite que elas sejam restauradas. A vida e as melhores intenções das pessoas aparecem na doença. Não é punitivismo cristão, é a aceitação do ciclo da vida, que brota das entranhas de Omolu. Ele tem o poder sobre a vida e a morte”, comenta o babalorixá.

“Que ele retire as doenças”

O sacerdote de candomblé conta que, para os adeptos da religião, existe um consenso quando se pede algo a Obaluaiê, ensinamento este que é passado de geração em geração nos ilês do Brasil.

“Ele [Omolu] é a febre, a doença, a ferida, a alergia, porque para que haja empatia é preciso sentir no próprio corpo o que o outro sente ou pode sentir. Então, não pedimos saúde. Pedimos para que ele veja se somos dignos e que ele retire a doença do meio de nós”, enfatiza.

O Olubajé, de acordo com o pai de santo, é o ritual anual voltado a homenagear o orixá e momento para que os iniciados no candomblé peçam a Omolu que retire as doenças da comunidade. Na ocasião, são preparadas as comidas de todos os orixás.

“Fui visitar uma casa de candomblé como última esperança. Não sabia que estava rolando Olubajé, nem conhecia a religião, mas pensei que não tinha nada a perder. No momento em que Omolu começou a circular pelo barracão jogando pipocas a minha vida mudou para sempre”, conta Djalma da Conceição, iniciado na religião em 2021.

Pai zeloso

Djalma, ou dofono d’Omolu — como é chamado entre seus irmãos de santo – relembra em entrevista à Alma Preta Jornalismo que sofria de uma doença chamada erisipela. O diagnóstico se trata de um processo infeccioso da pele, que pode atingir a gordura do tecido celular, causado por uma bactéria que se propaga pelos vasos linfáticos.

A doença causa feridas vermelhas na pele, sensação de queimação na região e manchas vermelhas irregulares. Djalma afirma que sentia muitas dores e que já havia procurado diversos médicos em busca de tratamento.

“Nada resolvia. Eu sentia tanta dor que não conseguia dormir, e isso foi me deixando abatido. Fui afastado do trabalho e fiquei muito deprimido. Foi aí que um amigo me chamou para o Olubajé na casa que ele frequentava. Devido a pandemia, a festa era para pouquíssimas pessoas, mas o sacerdote liberou a minha participação quando soube do meu estado de saúde”, diz o iniciado.

“Quando vi Omolu dançando no salão me deu uma vontade tão grande de chorar, eu nem sabia do que se tratava ou o motivo de tanta emoção. Pela primeira vez na minha vida eu senti o que poderia ser amor de pai, de um pai zeloso. Fui criado como agnóstico e nunca tive a oportunidade de conhecer meu pai biológico”, completa.

Durante a dança do orixá, Djalma relembra que Omolu jogava pipocas em todos os presentes da casa. Conforme o orixá foi se aproximando, ele relembra que sentiu o coração acelerar de um jeito diferente.

“Ele foi chegando perto e eu esqueci até da dor. No momento que Omolu jogou as pipocas na minha cabeça eu desmaiei. Perdi a consciência por uns instantes. Quando acordei, me disseram que eu precisava me iniciar para aquele orixá. E nunca mais a minha perna doeu. Ele retirou a doença do meu corpo e me curou com suas pipocas”, emociona-se Djalma.

Terra

“É importante compreendê-lo e enxergar o que Omolu transmite enquanto mensagem. Ele é a terra, e a terra é a maior boca do mundo. A terra come tudo, mas também devolve para nós. Obaluaiê é isso, reciprocidade, como a terra. Ele é um pai presente, que permanece ao lado do filho, mas permite que ele faça suas escolhas e sofra as consequências, para que possa mostrar seu valor”, comenta o líder religioso André Gomes.

O iniciado Djalma da Conceição pondera que é uma grande coincidência comemorar o Dia Nacional da Saúde e o Dia dos Pais em agosto, mês dedicado ao orixá Obaluaiê, mas que, para ele, representa tudo aquilo que sempre precisou: família e saúde.

“Eu nunca tive boa saúde e nunca tive pai. Então, para mim, agosto tomou outro significado, sabe? Antes eu ficava triste em agosto, mas Omolu mudou tudo isso. Antes eu vivia triste, agora eu tenho alegria. Antes eu vivia doente, e agora eu tenho saúde para dar e vender. Ele me ensinou isso, a sobreviver às adversidades e acreditar que a terra é recíproca a nós, pois ela devolve tudo que plantamos”, finaliza.

Leia também: ‘Orixá não tem cor? Sincretismo religioso e o apagamento da negritude’

Leia Mais

PUBLICIDADE

Destaques

AudioVisual

Podcast

papo-preto-logo

Cotidiano