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‘É preciso resgatar o espírito da lei para punir quem é racista’, diz professor Juarez Xavier

Professor de Jornalismo da Unesp foi alvo de racismo e de uma tentativa de homicídio no dia da consciência negra; conheça a trajetória do profissional e militante

22 de novembro de 2019

Juarez Tadeu de Paula Xavier, professor de Jornalismo da Universidade Estadual Paulista (Unesp), concedeu diversas entrevistas a veículos de mídia nesta semana após ter sido alvo de racismo e de uma tentativa de homicídio no estacionamento de um supermercado em Bauru, no interior de São Paulo.

Juarez Xavier, de 60 anos, possui uma longa trajetória no movimento negro e na área acadêmica. Ele foi orientador do projeto que deu origem ao Alma Preta e é conselheiro editorial do portal.

Nascido na Vila Mazzei, zona norte da capital paulista, o primeiro contato do docente com o jornalismo aconteceu na infância. De origem pobre, Juarez começou a trabalhar antes dos 10 anos de idade em uma banca de jornal.

“O dono da banca acreditava que ninguém poderia trabalhar lá sem conhecer as notícias, por isso ele incentivava a leitura. Eu acompanhava as edições da extinta revista Realidade e uma reportagem belíssima sobre o candomblé me chamou atenção, além de outra sobre o racismo no Brasil”, lembra.

Por causa da violência na região onde morava, Juarez não frequentou a escola dos 10 aos 17 anos. Ele passou a adolescência em uma casa de candomblé na zona leste da cidade. Até hoje, ele nutre uma forte ligação com a religião de matriz africana, além da prática da capoeira e a paixão pelo samba.

Depois dos 30 anos, Juarez se formou em Jornalismo na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). Durante a graduação, foi eleito para o Diretório Central dos Estudantes (DCE), onde esteve envolvido na mobilização política da instituição.

“Eu sempre achei interessante o poder de influência do jornalismo na esfera pública. Depois de terminar a graduação, atuei como assessor sindical e articulador político”, conta.

Como é ser um professor negro

O desejo de Juarez Xavier de lecionar se intensificou com o mestrado e doutorado na Universidade de São Paulo (USP), onde realizou pesquisas sobre as dinâmicas do racismo. Atualmente, Juarez é Pesquisador do Núcleo Negro da Unesp para Pesquisa e Extensão (Nupe).

“Costumo dizer que a comunicação me escolheu como atividade profissional e política, pois a imprensa tem um papel muito importante na sociedade. Tenho uma relação muito próxima com o jornalismo crítico e isso é imprescindível para as mídias que temos hoje no país”, destaca.

Em 2015, pichações em um banheiro da Unesp traziam o xingamento de “macaco” contra Juarez Xavier. A instituição de ensino criou uma comissão para investigar o ataque, mas a apuração foi finalizada sem que os autores do crime fossem dentificados.

Essa não havia sido a primeira vez que o docente foi alvo de racismo na instituição. Ele reitera que já atuava no movimento negro quando começou a lecionar, na década de 1990, e que já imaginava que a trajetória como professor não seria fácil.

“Eu já imaginava que o racismo estaria presente na minha vida de professor, assim como foi no período em que eu era aluno, então foi algo que não me chocou. Ao chegar no departamento da Unesp, um professor me disse que eu parecia um pagodeiro. Isso só fortaleceu minha luta antirracista”, sustenta.

Xingado e esfaqueado no Dia da Consciência Negra

Juarez Xavier voltava de uma consulta médica na quarta-feira (20), Dia Nacional da Consciência Negra, quando foi atacado por Vitor Munhoz, de 30 anos, com um canivete. O agressor o chamou de macaco várias vezes enquanto o atingiu no ombro esquerdo, no braço e nas costas. A vítima foi socorrida e recebeu alta no mesmo dia.

A família do agressor alegou que ele passava por um tratamento psiquiátrico e o delegado determinou o pagamento de fiança de R$ 1 mil para que ele pudesse responder em liberdade por injúria racial e lesão corporal dolosa.

A defesa de Juarez Xavier discordou da decisão e recorreu para que Vitor Munhoz responda pelo crime de racismo e por tentativa de homicídio. Para o professor da Unesp, o delegado não ter tratado o caso como crime de racismo, que é inafiançável, é uma consequência do racismo estrutural.

“Desde a Constituição Federal de 1988, não vemos ninguém preso por racismo. É preciso resgatar o espírito central da lei que é punir quem pratica atos racistas como um método pedagógico”, avalia.

Juarez Xavier conversou com deputados estaduais como Leci Brandão (PCdoB-SP) para promover atividades a fim de colocar o resgate ao cumprimento à Constituição no debate nacional.

“Esse crime me incomodou e eu não poderia deixar de agir. A ideia é tipificá-lo como racismo e tentativa de homicídio. Não é um êxito individual, é uma ação importante para todos”, finaliza o docente.

  • Nataly Simões

    Jornalista de formação e editora na Alma Preta. Passagens por UOL, Estadão, Automotive Business, Educação e Território, entre outras mídias.

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