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Em São Paulo, polícia mata duas vezes mais negros do que brancos

Estudo exclusivo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) mostra que 70% das vítimas da letalidade policial na capital paulista são negras

21 de novembro de 2019

Na cidade de São Paulo, a maioria das pessoas mortas pela polícia são negras. É o que revela um estudo exclusivo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) para a Alma Preta.

O levantamento foi elaborado com base no perfil racial de 365 vítimas de 2017 e 344 de 2018. Em 2017, o número de vítimas negras foi de 242, e o de brancas, 108.

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Em 2018, o número de vítimas negras caiu para 240, e o de brancas, para 101. Apesar da pequena queda na mortalidade negra, em ambos os anos a média de vítimas negras foi maior.

De acordo com o pesquisador do FBSP, Dennis Pacheco, existem duas possíveis causas para os negros, segmento que representa 35% da população paulistana, serem 70% das vítimas de mortes decorrentes de intervenção policial.

“A primeira hipótese é de que a polícia aborda negros e brancos na mesma proporção, com mais que o dobro da disposição para puxar o gatilho contra negros. A segunda é de que a polícia é discriminatória e mais violenta com o negro desde a escolha de quem deve ser abordado ou não. As pesquisas apontam as duas possibilidades como complementares”, afirma.

Para o pesquisador, os dados comprovam que a polícia escolhe abordar negros com mais frequência e é mais disposta a atirar em negros do que em brancos. “Independente da hipótese, é fato que a raça/cor da vítima é determinante nas ações policiais”, acrescenta.

Jovens negros são os mais mortos pela polícia paulista

O estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) também analisou a faixa etária das vítimas de letalidade policial na cidade de São Paulo. Independente da idade, a população negra é mais atingida do que a branca. Os jovens negros, no entanto, são os que mais morrem.

Em 2018, a maior disparidade entre vítimas negras e brancas, por faixa etária, foram na idade de 15 a 17 anos. Com 37 mortes, os negros foram 80% das vítimas. Os brancos foram 17% das vítimas, com 8 mortes.

A subnotificação da faixa etária de vítimas negras também foi expressiva no ano passado. A idade de 78 dos negros mortos pela polícia paulista não foi registrada (75%). No caso dos brancos, não houve registro da idade de 26 das vítimas (25%).

“O fato de os dados apontarem os negros como maioria entre as vítimas nas faixas etárias mais jovens é reflexo de eles serem a maior parte das vítimas da letalidade policial em qualquer faixa etária”, avalia o pesquisador do FBSP, Dennis Pacheco.

É preciso reconhecer o problema

A redução do número de pessoas mortas pela polícia, especialmente negras, depende primeiramente do “reconhecimento da existência de um problema” por parte do Estado, conforme avalia o pesquisador do FBSP, Dennis Pacheco.

“Quando o governador [João Doria (PSDB)] afirma que a polícia deve atirar para matar e que não é responsabilidade da instituição reduzir a própria letalidade, ele demonstra despreparo e falta de conhecimento. A disposição da polícia paulista em atirar para matar contraria protocolos internacionais que orientam qualquer polícia que cumpra seu papel como instituição de segurança pública no mundo”, explica.

De acordo com o pesquisador, é necessário garantir que a polícia siga os protocolos de uso progressivo da força. Para Dennis Pacheco, a medida está atrelada ao racismo que leva a população negra à morte duas vezes mais que a branca na capital paulista.

“É preciso negar a ideia absurda de que é normal matar mais de o dobro de negros que brancos em uma cidade na qual os negros são menos da metade da população. Tudo isso é essencial no enfrentamento ao racismo”, sustenta.

Em nota enviada à Alma Preta, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou não comentar pesquisas nas quais desconhece a metodologia.

Segundo o órgão, o combate ao racismo faz parte da formação das polícias Civil e Militar e todas as mortes decorrentes de intervenção policial são investigadas pelo Departamento de Homicídios e Proteção a Pessoas (DHPP) e pelas corregedorias das corporações, com o acompanhamento do Ministério Público e do Poder Judiciário.

Confira a íntegra da nota:

“A Secretaria da Segurança Pública não comenta pesquisas cuja metodologia desconhece. Todos os casos decorrentes de intervenção policial (MDIP), independentemente de raça, cor, credo, gênero, idade, etnia da vítima, são rigorosamente investigadas pelo Departamento de Homicídios e Proteção a Pessoas (DHPP) e pelas corregedorias das corporações, com o acompanhamento do Ministério Público e do Poder Judiciário para constatar a legitimidade das ações, de acordo com a determinação da própria secretaria – resolução SSP/40.

Desde 2006, São Paulo conta com a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) que atua especificamente na investigação de delitos de diversas espécies de intolerância. A especializada possui um cadastro de integrantes de grupos intolerantes. Recebe denúncias de diversos órgãos, como Ministério Público Estadual, Disque 100, 181 e Ordem dos Advogados do Brasil.

Durante a formação, todo o policial, civil e militar, cursa a disciplina de Direitos Humanos, que aborda o combate ao racismo e a outros crimes de intolerância, inclusive com discussões sobre abordagem e atendimento de vítimas. A SSP aumentou a carga horária dessa matéria nas academias.”

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  • Nataly Simões

    Jornalista de formação e editora na Alma Preta. Atua há seis anos na cobertura das temáticas de Diversidade, Raça, Gênero e Direitos Humanos. Em 2023, como editora da Alma Preta, foi eleita uma das 50 jornalistas negras mais admiradas da imprensa brasileira.

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