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“Enquanto não houver paz para o nosso povo, não haverá para ninguém”, afirma Erica Malunguinho

11 de outubro de 2018

Primeira mulher negra e trans a se tornar deputada estadual em São Paulo, Erica Malunguinho concedeu entrevista exclusiva para o Alma Preta sobre os projetos políticos a serem desenvolvidos, a eleição, a importância do movimento negro para a vitória, entre outros temas

Texto / Aline Bernardes e Pedro Borges
Imagem / Pedro Borges

Artista e fundadora da Aparelha Luzia, espaço descrito como um quilombo urbano em São Paulo, Erica Malunguinho é a terceira deputada estadual mais votada pelo PSOL no estado, a primeira trans eleita na casa e a terceira mulher negra na história a entrar na Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP). A primeira foi Theodosina Ribeiro, e a segunda, Leci Brandão.

Na primeira tentativa a ocupar um cargo no legislativo, Erica Malunguinho atingiu mais de 53 mil votos e passará a compor, a partir de 2018, o time do PSOL na ALESP ao lado da Bancada Ativista, de Carlos Gianazzi e Isa Penna.

No dia 9 de Outubro, terça-feira, Erica Malunguinho recebeu a equipe do Alma Preta em sua residência, no centro da cidade, para uma entrevista. Enquanto conversava com a dupla de jornalistas, Yaisa Alves, também mulher preta, retocava os dreadlocks, cultivados há mais de 10 anos, da agora deputada estadual.

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Yaisa Alves retoca os dreadlocks de Erica Malunguinho (Foto: Pedro Borges/Alma Preta)

A artista contou que estava apreensiva no dia da votação, por conta da conjuntura política vivida pelo país. Sabia, porém, que independente do resultado a luta continuaria, com ou sem o mandato.

“É importante sim ganhar, mas independente disso a nossa luta permanece, antes, durante e depois. A sensação que dá é que essa luta continuará, só que dentro de outro lugar”.

Ela ressalta a importância histórica do movimento negro para que essa conquista fosse alcançada. Cita os quilombos, o samba, o Teatro Experimental do Negro (TEN), os Panteras Negras, entre outros movimentos de resistência do povo negro.

“Se não fosse antes, não haveria o agora. O corpo negro vivo é um corpo em luta, uma vez que estamos em uma sociedade racializada. Tudo isso faz com que seja possível esse agora”.

Durante a conversa, Erica também contou o porquê de optar por dialogar primeiro com um canal de mídia negra e não priorizar a conversa com outros veículos da grande imprensa.

“Isso faz parte do ciclo produtivo da alternância de poder. É uma informação preta, no sentido de uma luta política preta sendo primeiramente mediada por pessoas pretas, para um grupo de pessoas pretas e outras que quiserem acessar”.

Propostas

O pilar das medidas a serem defendidas na (ALESP) está ancorado no fundamento racial, expresso com ênfase por Erica Malunguinho.

“Esse vai ser o vetor para pensar todas as práticas dentro de um legislativo, pensando o fundamento de raça e gênero como vetores para se elaborar uma política institucional”.

Em todas as áreas, a candidata apresenta propostas direcionadas para a população negra, feminina e LGBT. Na educação, por exemplo, pretende fortalecer as leis 10.639 e 11.645, que versam sobre o ensino da história africana, afro-brasileira e indígena, e no sistema carcerário, quer que o Estado se responsabilize pelos egressos e tenha medidas propositivas de apoio para a inserção social.

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Deputada estadual do PSOL em entrevista para a equipe do Alma Preta (Foto: Pedro Borges/Alma Preta)

Para essas lutas, Erica Malunguinho terá a companhia de Leci Brandão, fato histórico, afinal essa será a primeira vez que duas mulheres negras comporão o corpo legislativo paulista. Erica acredita que esse é o primeiro passo para a alternância de poder, e que a comunidade negra precisa de mais.

“Precisamos de mais. Eu lembro de uma vez quando a Leci foi na Aparelha e ela falava que não poderia estar lá sozinha. E eu lembro muito como um recado muito direto para a gente entender que precisamos de um discurso político alinhado com as nossas pautas históricas. Então as duas são muito importante. Três, mais ainda. Nós precisamos, por uma questão de reparação, ser além da proporcionalidade em termos de povo preto e representantes na ALESP”.

Conjuntura

A possibilidade de Jair Bolsonaro (PSL) ser eleito presidente da república e o crescimento de legisladores conservadores nas câmaras estaduais e federal, no mesmo período histórico em que São Paulo elege a primeira mulher trans e a terceira negra para ALESP, mostram a existência de diferentes imaginários e projetos políticos, de acordo com Erica Malunguinho.

“O conservadorismo e essa onda têm força, mas não são únicos. Significa dizer que existem vozes que clamam por liberdade, emancipação, prosperidade. É isso que essa pessoa, imagem, candidatura representam”.

O anúncio de tempos difíceis assusta, mas não paralisa a artista. Para a nova deputada estadual, o povo negro está acostumado com a luta e a resistência.

“Nós estamos enfrentando o genocídio há muito tempo. Nós estamos enfrentando a transfobia há muito tempo. Nós somos o país que mais mata transsexuais, população LGBT, mais estupra mulheres, que mata o jovem negro. Então a gente conhece essa violência viva já”.

Enquanto a violência sobre a comunidade negra persistir, Erica e o quilombo que traz consigo para dentro da ALESP prometem fazer barulho em defesa daquelas e daqueles que descendem da diáspora africana.

“Para a gente não tem escolha, é um caminho natural. Enquanto não houver paz para o nosso povo, não haverá para ninguém”.

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