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Entidades dos Lençóis Maranhenses repudiam construção de condomínio de luxo

Entidades declaram que a implementação do empreendimento e pavimentação de sua via de acesso podem causar impactos ambientais, entre outros problemas
Parque dos Lençóis Maranhenses.

Parque dos Lençóis Maranhenses.

— Beatriz Mazzei

2 de dezembro de 2024

A construção de um condomínio de luxo com 232 lotes residenciais a apenas 200 metros das dunas dos Lençóis Maranhenses preocupa a população e organizações da sociedade civil de Santo Amaro, no Maranhão. O projeto “Terra Ville” oferece lotes de no mínimo 300 metros quadrados com mais de 20 equipamentos de lazer como salão de festas, piscina e até heliponto. As obras foram iniciadas esse ano.

O Parque dos Lençóis Maranhenses foi declarado como Patrimônio da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em julho. A titulação busca incentivar a preservação cultural e natural de pontos considerados significativos para a humanidade. 

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Com isso, o Conselho Municipal de Turismo, de Cultura e do Meio Ambiente de Santo Amaro enviou uma carta denúncia à UNESCO em outubro. Na denúncia, as entidades declaram que a implementação do empreendimento e pavimentação de sua via de acesso podem causar impactos ambientais, desordenamento da atividade turística, perda do controle de acesso às dunas, acúmulo de lixo e colapso no centro urbano da cidade.

Os responsáveis pelo documento alegam que a cidade de Santo Amaro do Maranhão se encontra na borda do campo de dunas. O território do município abriga ecossistemas diversos e frágeis, como restingas, manguezais, lagos, campo de dunas e a bacia do Rio Alegre, que se trata de uma massa de água permanente que banha a cidade e irriga o Lago de Santo Amaro. Também aponta que desde o ano de 2023, os ecossistemas supracitados vem sofrendo grande ameaça de danos por parte de empresas construtoras e incorporadoras. 

Segundo as entidades, essas empresas vêm realizando lançamentos de vários empreendimentos imobiliários com características de parcelamento urbano do solo, loteamentos e condomínios, gerando extensa especulação imobiliária na região da Zona de Amortecimento do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses. 

As Zonas de Amortecimento são as áreas de entorno de uma unidade de conservação respaldadas por lei, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas, com o propósito de minimizar impactos negativos sobre a unidade. 

Os Lençóis Maranhenses estão dentro de uma Área de Proteção Ambiental (APA), o que significa que há regras de uso e ocupação do solo. Qualquer construção na área precisa seguir essas regulamentações específicas para proteger o ecossistema local. Para as obras iniciarem, o empreendimento precisou da Licença de Instalação (LI), emitida pela SEMA – Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais.

O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela conservação ambiental do Parque, levou o caso para a justiça e o Ministério Público Federal moveu ação civil pública contra a empreendedora no último dia 18 de outubro. O Ministério Público pede que a Justiça suspenda a licença ambiental concedida pela Sema. A ação também foi proposta contra o Estado do Maranhão e o município de Santo Amaro por terem liberado as obras.

Para a reportagem, representantes do Terra Ville alegaram que o condomínio está sendo construído de uma forma sustentável e que foram feitos estudos em relação ao meio ambiente e questões populacionais. Também alegaram que irão melhorar as vias de acesso do parque.

De acordo com Clarice Gomes, moradora de Santo Amaro e condutora de turismo do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, o ecossistema frágil da região requer uma distância de construções de grande porte.

“Existem pessoas morando dentro do Parque Nacional. De acordo com o último senso, são mais de 3 mil pessoas vivendo na região, porém elas estão distribuídas em diversades comunidades, elas não estão alocadas em um único ponto sobrecarregabdo o ecossistema. Elas causam impactos mínimos porque suas casas são adaptadas para aquela região. São construções de pequeno porte.”

Ela também aponta para a questão da falta de tratamento de esgoto de lixo de Santo Amaro, que poderia piorar com mais pessoas residindo na região.

Preservação cultural

Segundo Guilherme Cajueiro, historiador e presidente do Conselho de Cultura de Santo Amaro, o território em questão faz parte de um trecho de forte conexão com a história e a cultura local. O especialista alega que por ser próxima da área denominada “Santo Amaro Velho”, podem haver resquícios da passagem dos Padres Jesuítas que fugiram das investidas da Coroa, no final do século XVII. 

Também pontua que o local da via de acesso, chamado de Estrada Velha da Betânia, foi trajeto de várias gerações desde o século XVIII e faz parte da história do repovoamento de Santo Amaro atribuída a Emídia Brazuca, uma escravizada negra, reconhecida como a responsável por dar início à população do local.

“A construção está localizada em uma área que liga o povoado de Betânia. Este povoado tem uma história muito marcada pelas populações negras e indígenas. Ele foi habitado pelos tremembés. Ou seja, é um território que deve ser melhor preservado por sua importância histórica”, conta Guilherme.

Para além da beleza natural das dunas, que atrai milhares de turistas todos os anos, o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses compreende os municípios que abrigam povoados responsáveis por manter uma cultura negra centenária. Essas regiões são repletas de comunidades remanescentes de quilombos, que ainda resistem na área. 

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  • Beatriz Mazzei

    Jornalista com especialização em Diversidade & Inclusão. Atua com pautas voltadas para questões raciais, sociais e culturais. Nascida durante o carnaval, tem interesse especial pelas manifestações da cultura popular brasileira.

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