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“Há empresas brasileiras que ainda não empregam negros”, critica Martinho da Vila

26 de agosto de 2019

Com grande envolvimento com movimentos da África, o sambista admite que os negros brasileiros enfrentam problemas no mercado de trabalho

Texto / Lucas Veloso | Edição e Imagem / Pedro Borges

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Nome importante para a música brasileira, Martinho da Vila acredita que mesmo em 2019, 131 anos pós abolição da escravatura, os negros do país enfrentam grandes desafios no cotidiano. Um deles é a busca por emprego. “Arranjar emprego é difícil ainda. Tem empresa nacional que ainda não contrata negros”, define o compositor.

Martinho se refere a algo apontado em pesquisa do Instituto Ethos, realizada em 2016. O estudo revelou que pessoas negras ocupam apenas 6,3% de cargos na gerência e 4,7% no quadro executivo, embora representem mais da metade da população brasileira.

Neste contexto, a presença de mulheres negras, em comparação aos homens, é ainda mais desfavorável: elas preenchem apenas 1,6% das posições na gerência e 0,4% no quadro executivo. A situação só se inverte nas vagas de início de carreira ou com baixa exigência de profissional, como em nível de aprendizes (57,5%) e trainees (58,2%).

Por outro lado, o sambista reconhece que nem tudo são coisas ruins à população negra. Neste sentido, lembra a importância do samba para a construção da identidade no país. “O samba é um símbolos do Brasil. É representativo como o Hino Nacional”, admite. “Mas eu não gosto de falar da importância do samba, pois eu sou em quem faz o samba. Os críticos é que devem falar se é importante ou não. Eu só sei fazer”, completa, aos risos.

Conhecido como um grande otimista, em 1974, Martinho da Vila lançou “Canta Canta Minha Gente”, umas das suas composições mais famosas. “Deixa a tristeza pra lá / Canta forte, canta alto / Que a vida vai melhorar / Que a vida vai melhorar” dizem os versos.

Mas em fevereiro deste ano, em entrevista à jornalista Marina Caruso, o músico afirmou que estava cansado de cantar que a vida vai melhorar, devido ao cenário político brasileiro. Ele também comenta sobre o governo Bolsonaro, que para ele, não assumiu os compromissos com a população, como havia prometido no discurso de posse.

Um pé na África

Martinho fez sua primeira viagem ao continente africano na década de 70. Durante muitos anos, foi o interlocutor entre o Brasil e Angola – sendo considerado um embaixador cultural entre os países. Naquela época, Angola não tinha embaixada no Brasil.

No início dos anos 80, fez parte do projeto Kalunga. A ideia era reunir grandes nomes da música brasileira, como Dorival Caymmi, Djavan, Clara Nunes e Dona Ivone Lara para aproximar Angola e o Brasil.

Em 83, Martinho criou o Canto Livre de Angola e trouxe ao Brasil vários artistas angolanos, como Elias Dia Kimuezo, considerado o rei da música em Angola. Foram realizados shows no Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador.

No ano seguinte, organizou, o Grupo Kizomba um grupo de trabalho que promoveu o primeiro Encontro Internacional de Arte e Negra, no Pavilhão de São Cristóvão, Rio de Janeiro. O evento reuniu delegações de Angola, Moçambique, África do Sul, Senegal, Cabo Verde, Cuba e Estados Unidos.

Apresentados por Milton Gonçalves, Jacira Silva, Jorge Coutinho e Grande Otelo, foram realizados três encontros. Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Bebeto, Sivuca, Da Fé, Rildo Hora, Luiz Melodia, Elba Ramalho, Dona Ivone Lara e Moraes Moreira foram alguns dos artistas participantes.

Em 85, foi o coordenador de uma manifestação política suprapartidária na Praça da Sé, com um ato ecumênico que teve a participação de sacerdotes, freiras, babalorixás, ialorixás e pastores protestantes. O objetivo era protestar contra a reclusão de Nelson Mandela, e contra o regime de apartheid.

Trajetória

Martinho é carioca, criado na Serra dos Pretos-Forros, no Rio de Janeiro. Sua primeira profissão foi auxiliar de químico industrial. Mais tarde, serviu o Exército Brasileiro como sargento burocrata. Foi nesta época que entrou na Escola de Instrução Especializada, tornando-se escrevente e contador.

Na década de 70, deixou as ocupações de lado para se dedicar a música.

Aos 81 anos, Martinho tem oito filhos, incluindo Mart’nália, além de outros dez netos. Hoje é reconhecido como um dos principais compositores do Brasil. Em 1991, ganhou o Prêmio Shell de Música Popular Brasileira. Em 2014, seu álbum Enredo foi indicado ao Grammy Latino de Melhor Álbum de Samba/Pagode.

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