O Movimento Negro Unificado (MNU) publicou uma nota nesta sexta-feira (5) onde repudia a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara de Vereadores de São Paulo para investigar ONGs que atuam na Cracolândia, sobretudo, a Pastoral do Povo de Rua em que o padre Júlio Renato Lancellotti atua como Vigário Episcopal.
Desde a sua criação, no início de dezembro de 2023, a CPI, requerida pelo vereador Rubinho Nunes (União), cofundador do Movimento Brasil Livre (MBL), foi alvo de críticas por defensores do trabalho realizado pelo vigário.
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
Apesar do documento já ter recolhido assinaturas suficientes, segundo o gabinete do vereador, isso não significa que a comissão será instalada, pois ainda precisa de aprovação em plenário.
No pedido, Rubinho diz que a comissão tem a “finalidade de investigar as Organizações Não Governamentais (ONGs) que fornecem alimentos, utensílios para uso de substâncias ilícitas e tratamento aos grupos de usuários que frequentam a região da Cracolândia”.
Em nota publicada nas redes sociais, o MNU demonstra “surpresa” com a criação da comissão que também pretende investigar o coletivo “A Craco Resiste”, movimento contra a violência policial na região.
Segundo a publicação, essa não é a primeira vez que a extrema-direita realiza ataques ao padre, conhecido pelo trabalho como ativista de direitos humanos. Para o MNU, a ação “demonstra de forma muito nítida a perseguição e a criminalização que eles fazem contra os que combatem a fome e a pobreza” de forma cotidiana na capital paulista.
“Padre Julio Lancellotti é alvo preferencial por sua atuação frente a Pastoral do Povo da Rua em São Paulo e sempre denunciar a situação da população que mora na rua e também fazer seu acolhimento frente a pobreza e fome que tem se aprofundado em nossa cidade de forma brutal nos últimos anos”, denuncia o texto. “Mais uma vez se manifesta o racismo estrutural e institucional com iniciativa da extrema-direita paulistana sem o respaldo da população da cidade.”
A publicação enfatiza que, conforme indicam dados do censo da população de rua realizado pela Prefeitura de São Paulo em 2022, 71% das pessoas em situação de rua na capital se autodeclaram negras.
“Ao perseguir a atuação do Padre Julio Lancellotti também se apresenta política eugenista de que a população de rua desta cidade não carece de acolhimento e deva viver a própria sorte e ser tratada com violência”, reitera a organização, que reconhece nas ações do vigário “não apenas os sinais do verdadeiro cristianismo, caracterizado pela humanidade, solidariedade e cuidado com os mais vulneráveis, mas também sua aliança concreta com o combate ao racismo que tanto impacta nossas vidas e é ignorado por aqueles que visam criminalizá-lo”.
“Nos somamos a todos que cerram fileiras para defender Padre Julio Lancellotti, por entender que ele é e sempre foi nosso aliado para enfrentar as mazelas que impactam a vida do nosso povo nessa luta contra a extrema-direita em São Paulo e sua perversa face eugenista que só visa violentar a população de rua desta cidade e não garantir políticas públicas substanciais pra enfrentar o aumento dessa população e a negação de seus direitos”, conclui a publicação.
Autoridades saem em defesa do padre Júlio Lancellotti
Na quinta-feira (4), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) expressou apoio ao trabalho do padre Júlio Lancellotti. Em publicação nas redes sociais, onde aparece abraçado ao vigário, Lula agradeceu pela dedicação do padre, destacando a importância de seu trabalho em fornecer amparo às pessoas em situação de maior vulnerabilidade.
Em nota de repúdio, a Arquidiocese de São Paulo também manifestou solidariedade e se disse “perplexa” com a proposta da CPI. No texto, a instituição defende e reitera a importância do trabalho desenvolvido há décadas pelo padre Júlio.
Para as CPIs serem instaladas na Câmara Municipal da capital paulista, são necessárias 19 assinaturas. No requerimento apresentado à Mesa Diretora por Rubinho Nunes, há assinaturas de 22 parlamentares. No entanto, até o momento quatro deles já retiraram os seus nomes, são eles Thammy Miranda (PL), Xexéu Tripoli (PSDB), Sidney Cruz (Solidariedade) e Sandra Tadeu (União).