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Movimento negro mobiliza centenas de organizações para denunciar assassinato de João Pedro

27 de maio de 2020

Manifestação, com mais de 4h, foi organizada pela Coalizão Negra por Direitos e contou com a participação dos familiares de João Pedro Matos

Texto / Pedro Borges I Imagem / Reprodução

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Cerca de 150 organizações do movimento negro e de favelas articularam uma manifestação em solidariedade e como forma de denúncia ao assassinato de João Pedro Matos, jovem negro morto durante operação policial em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, no dia 18 de maio.

A manifestação, construída pela Coalizão Negra por Direitos e movimentos de favelas do Rio de Janeiro, contou com a participação dos familiares de João Pedro Matos. No início da transmissão, Neilton Pinto, pai do adolescente, agradeceu a solidariedade e relatou as dificuldades do momento vivido.

“É um momento difícil, que eu não desejo para ninguém. Perder um filho é como perder a própria vida. Nós sabemos que o estado é falido, porque entraram dentro de um quintal e tiraram a vida de um menino de 14 anos. A gente espera por justiça e quer que ela seja feita no nosso país”, afirmou.

João Pedro Matos brincava no quintal de um tio, quando foi baleado durante operação da Polícia Civil e Polícia Federal. Enquanto a família alega que o adolescente foi atingido pelos policiais, os agentes de segurança dizem que o disparo ocorreu depois de uma troca de tiros com criminosos. A Polícia Civil identificou que o calibre da arma que matou João Pedro Matos é 5,56, o mesmo utilizado pela corporação.

A manifestação online contou com a participação de organizações de todo o país, segundo Rafael Miranda, integrante da Coalizão Negra por Direitos. “Foi uma construção a muitas mãos, e não foi uma construção só do Rio de Janeiro, mas foi uma articulação nacional”.

A dificuldade de acesso a internet, realidade de periferias do país, não foi uma barreira determinante para a construção do ato, conta Paola Belchior, integrante do Coletivo Massa, do bairro da Penha, cidade do Rio de Janeiro. “Muito importante estarmos juntos em momentos de justiça. O mais importante é ressaltar como a gente conseguiu se organizar em meio a tantas desigualdades, inclusive na área das tecnologias. O aquilombamento acontece independente das estruturas”.

O ato online foi transmitido pela página da Coalizão Negra por Direitos, das 18h às 22h, e replicada em 82 páginas de Facebook e no Youtube da Coalizão. De acordo com os organizadores, foram 1 mil compartilhamentos, 1 mil curtidas, 47 mil visualizações, 100 mil pessoas alcançadas.

Simone Nascimento, integrante do Movimento Negro Unificado (MNU) e uma das articuladoras do ato, acredita que o houve uma grande mobilização por parte da sociedade civil, com o objetivo de denunciar a violência sistemática contra jovens negros.

“Nesses dias duros de pandemia para o nosso povo, além das perdas para doença estão crescentes as nossas perdas para o Estado. Conseguimos unir diversas iniciativas do Rio de Janeiro e de todo Brasil, para esse grande ato on-line, por João Pedro e por todos os jovens negros vítimas do Estado brasileiro. Foi muito potente. Em poucos dias conseguimos envolver organizações de todo o país nessa ação, construída por muitas mãos”.

Outro organizador, Douglas Belchior, Uneafro Brasil e Coalizão Negra por Direitos, reitera a importância do ato. “Solidariedade, empatia e revolta são matéria prima para toda luta por justiça. Não podemos aceitar que famílias negras continuem a ser despedaçados pela brutalidade policial, pela violência do estado e por um genocídio que nunca termina. O ato de ontem foi uma expressão de amor e revolta. Amor pela família de João Pedro e todas atingidas pela violência. E revolta contra o Estado, seus governos e suas polícias assassinas”.

O protesto foi impulsionado por um texto manifesto, assinado por 1.200 organizações. O documento e a denúncia do assassinato de João Pedro Pinto foram enviados para órgãos de fiscalização da atividade policial, como o Ministério Público do Rio de Janeiro, a Corregedoria da PM-RJ, e também para o Comando Geral da PM, a Secretaria de Segurança Pública e o Governador do estado do Rio de Janeiro.

A denúncia também foi direcionada para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), como forma de pressionar a investigação do caso no âmbito internacional.

Renato Noguera, professor de filosofia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), ressalta a importância do ato, enquanto forma de denúncia de um projeto sistemático de morte de jovens negros.

“Entendo que o ato de luto e luta por João Pedro é fundamental não só pela morte do João Pedro, mas por todas mortes que aconteceram antes e depois, por uma necropolítica e política de segurança pública equivocada que tem matado jovens negros em todas regiões do país”.

Ele acredita que a partir de manifestações como essa, é possível planejar diferentes políticas na área da segurança pública. “P potencial maior do ato é da gente poder chorar pela morte desse jovem, mas também que a gente possa construir políticas públicas antirracistas na área da segurança pública do país. Não é possível assinar essa ideia de combater a violência com a morte sistemática de jovens negros”, completa.

Investigações do caso

A Corregedoria da Polícia Civil instaurou uma sindicância interna e três policiais, envolvidos na operação, foram afastados e fazem serviços administrativos na corporação. A Polícia Federal também anunciou a abertura de uma sindicância interna, para averiguar os fatos.

A Polícia Civil do Rio de Janeiro quer fazer uma simulação do caso, com a garantia de participação do Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública do Ministério Público e a Defensoria Pública poderão. O objetivo é o de encontrar os responsáveis pelo disparo que tirou a vida de João Pedro Matos.

A investigação do caso localizou cerca de 70 marcas de tiros nas paredes da casa onde João Pedro Matos brincava.

O Ministério Público, em nota divulgada no dia 25 de maio, pediu que as operações da Polícia Federal sejam realizadas apenas em casos de extrema urgência. A Defensoria Pública, órgão responsável por representar a família, pede investigação por parte do Ministério Público.

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