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‘Não me calarei diante dos ataques’, diz primeira presidente negra da UNE

Bruna Brelaz nasceu em Manaus (AM) e desde de julho é presidente nacional da UNE; em sua luta pela promoção da agenda estudantil, ela tem que enfrentar o racismo e o machismo presentes no debate político

Texto: Juca Guimarães I Edição: Nadine Nascimento I Foto: UNE divulgação

Bruna é presidente da UNE e enfrenta o racismo

19 de outubro de 2021

A estudante de Direito Bruna Brelaz é uma mulher negra de 26 anos, que foi eleita presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), entidade que teve papel importante na campanha das ‘Diretas Já’ e no impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Melo. No entanto, a primeira presidente negra, nascida em Manaus (AM), da UNE tem enfrentado ataques racistas e machistas que tentam silenciar suas pautas de luta, que incluem uma agenda antirracista e de defesa da Amazônia.

Em entrevista exclusiva para a Alma Preta Jornalismo, Bruna Brelaz falou sobre as políticas afirmativas, a continuidade da lei de cotas nas universidades federais e a situação da educação no Brasil. “É preciso que os estudantes tenham condições de estudar, com políticas públicas que ofereçam alimentação, moradia e transporte”, afirma.

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Confira a íntegra da entrevista com a presidente da UNE, que recentemente foi alvo de ataques por defender uma frente ampla em favor do impeachment do presidente Bolsonaro (sem partido). Sergio Camargo, presidente da Fundação Palmares, que teve sua autonomia de gestão limitada pela Justiça, chegou a questionar, em uma rede social, a origem negra de Bruna.

Alma Preta Jornalismo (APJ): Você é uma mulher negra presidente de uma entidade de estudantes que historicamente esteve na vanguarda das mudanças políticas. No entanto, há uma violência latente contra as suas colocações que não existia com presidentes anteriores da UNE. Como você avalia isso?

Bruna Brelaz (BB): Sou a primeira mulher negra a presidir a entidade e isso é um espaço de representatividade muito importante, um avanço. Após as minhas decisões pela Frente Ampla, muitos ataques que sofro tem cunho misógino e racial, como se eu não pudesse opinar, não fosse capaz de formular. O que é muito diferente de outras pessoas que já presidiram a entidade ou mesmo figuras da esquerda, que também articularam lutas, com pessoas de pensamento divergente.

Mas eu quero dizer que não me calarei diante desses ataques, não retrocederei. Não arredarei o pé das convicções que acredito ser o melhor para o povo. E esse espaço de representatividade não me será retirado ou invalidado, e meu desejo e minha luta é que nenhuma mulher preta, nenhum homem preto seja também em seus espaços.

APJ: Qual a importância de uma aliança ampla o quanto antes pelo impeachment de Bolsonaro, do ponto de vista das questões que mais afetam a população negra?

BB: A crise gerada pelo governo Bolsonaro tem cor. A necropolítica, o desmonte dos direitos, o desemprego, a evasão escolar e a miséria atingem em cheio e em esmagadora maioria a população negra. Até mesmo entre a maioria das vítimas da Covid-19 está a população negra e periférica. É preciso barrar esse processo que atravessamos urgentemente. Chegamos a um patamar de destruição, que retomar ao nível que estávamos, de segurança alimentar, ampliação do acesso à educação, levará tempos para ser retomado. Por isso, é hora de elevar e ampliar toda nossa luta para barrar Bolsonaro. Até 2022, esses projetos podem causar ainda muito mais tragédias, não podemos esperar.

APJ: Ano que vem teremos a avaliação da política de cotas raciais para o ingresso nas universidades. Em dez anos, com as cotas, o percentual de alunos negros nas universidades cresceu de 9% para 18%. A que distância estamos de trazer equidade e quais são os riscos que as políticas afirmativas estão correndo?

BB: As cotas raciais nos trouxeram muitos avanços para a democratização do acesso à universidade. Mas ainda estudantes de baixa renda sofrem com as questões da permanência estudantil e isso ainda não temos mensurado, mas a evasão nas universidades públicas deve aumentar muito com a crise que atravessamos. É preciso que os estudantes tenham condições de estudar, com políticas públicas que ofereçam alimentação, moradia, transporte. E as universidades federais sofreram um corte bilionário esse ano, que afetou muito o PNAES (Plano Nacional de Assistência Estudantil).

APJ: Foi um erro dos partidos de esquerda não colocarem a questão racial na centralidade da agenda política no pós-ditadura?

BB: Ainda é um erro. Vemos o genocídio da juventude negra, a miséria, falta de moradia, desemprego, atingindo a população negra, e esse é o retrato de não termos representatividade no Congresso, nas Câmaras e Assembleias. Não há políticas públicas e projetos de lei para sanar todos esses danos. Temos muitos pretos e pretas em movimento para estar nos espaços de poder e de decisão do nosso país, e é preciso que toda esquerda e campos progressistas os apoiem.

APJ: Como está a situação das universidades públicas e das políticas de financiamento estudantil no atual governo e o que a UNE tem feito em relação a isso?

BB: Nós estamos em uma luta muito árdua para repor o orçamento das universidades federais. Muitas delas, após o corte em 2021, correm o risco de fecharem as portas. Quanto ao FIES [Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior], defendemos a aprovação imediata do Projeto de Lei 1133/21, que prorroga a suspensão temporária das parcelas de amortização do FIES, por conta da alta do desemprego, a crise social e econômica que o país atravessa. Precisamos combater o endividamento da juventude para avançar e retomar o desenvolvimento do país.

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