No Recife, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) e outras frentes populares se reuniram em frente ao Palácio do Campo das Princesas na manhã desta quarta-feira (26), em ato pacífico e simbólico. Com uma grande faixa escrita “Despejo Na Pandemia é Crime”, ativistas denunciaram uma ação de desapropriação de 200 famílias do Acampamento Bondade, no município de Amaraji – a 96 km da capital pernambucana – executada pela Polícia Militar na última terça-feira (25). O pedido de despejo foi feito por uma usina local chamada União.
Representantes do MST afirmam que a população aguardava a suspensão da reintegração de posse do local quando foi surpreendida pelo Batalhão Especializado de Policiamento do Interior (BEPI), o Batalhão de Choque e a Cavalaria da PM, que chegaram ao local com gás lacrimogêneo, balas de borracha e atearam fogo nos barracos.
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Os ativistas ainda afirmam que, durante o confronto, uma criança de 10 anos foi alvejada e sete pessoas foram detidas, incluindo uma criança de 12 anos de idade, que, segundo testemunhas, foi vítima de coerção em interrogatório feito por PMs antes da chegada do delegado responsável pela ação. Com muitos militantes feridos, os outros acampados, por medo, fugiram para o canavial, deixando pertences.
“A forma com que chegaram nas terras mostra pra nós, da militância, que mais uma vez eles se acham os donos da Zona da Mata Sul do estado. O que ocorreu é uma ação conjunta de empresários e que tem o aval do poder público. Um ato que deixa a população, já vulnerável, mais triste e apreensiva”, relata Jaime Amorim, representante da direção nacional do MST em Pernambuco.
O líder afirma que há uma movimentação jurídica contra o estado sobre o direito à terra em Amaraji. Segundo o representante, advogados do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra do estado estão entrando com uma ação cível pública contra o Governador Paulo Câmara.
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As parlamentares Juntas (PSOL-PE), representadas pela deputada Kátia Cunha, como presidentas da Comissão de Cidadania, Direitos Humanos e Participação Popular (CCDH) da Assembleia Legislativa de Pernambuco (ALEPE) estiveram presentes durante a ação de desapropriação. A mandata denuncia que a Usina União além de ser autora do pedido de despejo, já foi denunciada pelo Ministério Público por trabalho escravo, como atividades de corte, carregamento e transporte da cana-de-açúcar da usina, em condições degradantes de trabalho e com jornadas exaustivas.
Para o MST, em nota veiculada nas redes sociais, a ação de despejo contraria a notificação do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), que alerta sobre o aumento da vulnerabilidade das famílias desalojadas durante a pandemia, com relação à exposição ao novo coronavírus, que já deixou mais de 450 mil mortos no país.
No texto, o MST aponta o descumprimento da recomendação de nº 90, do Conselho Nacional de Justiça, aprovada em março deste ano e que recomenda aos órgãos do Poder Judiciário a adoção de cautela em casos de solução de conflitos que envolvam a desocupação coletiva de imóveis, sejam eles urbanos ou rurais durante o período de crise sanitária.
Junto ao posicionamento, uma campanha com a hashtag “Despejo Zero” está sendo veiculada, induzindo a população a questionar, por meio de envio de e-mails ao Governo de Pernambuco, quais medidas serão tomadas sobre as famílias desalojadas. O movimento espera que sejam tomadas providências no âmbito estadual para garantir o direito à moradia, à saúde e à vida dessa população.
Como via de reparação ao ocorrido, a mandata das Juntas está buscando aprovar junto à ALEPE o Projeto de Lei Ordinária 1010/2020, de sua autoria, que pede a suspensão do cumprimento de mandados de reintegração de posse, despejos e remoções judiciais ou extrajudiciais enquanto Pernambuco estiver em situação de calamidade pública, como forma de assegurar os direitos cobrados pelo movimento.
Procurada pela Alma Preta Jornalismo, a assessoria de comunicação do Governo de Pernambuco não apresentou retorno até o fechamento da publicação.