João Lucas Pereira de Oliveira Muniz, jovem negro de 21 anos, foi morto pelos policiais militares Caio Fontes Lourenço e José Alcione Bento da Silva, no dia 28 de março, às 2h30, na cidade de São Vicente (SP).
A polícia afirma que estava em patrulha pela Avenida Augusto Severo quando um motociclista avisou os agentes de segurança sobre a presença de três homens armados na área do Dique do Piçarro. O motociclista ainda disse ter ouvido dos homens que eles pretendiam atacar uma viatura.
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Os policiais acionaram a Força Tática, com o deslocamento das equipes para a região. Quando chegaram a um beco, afirmaram ter visto três homens, que logo sacaram as armas contra os agentes de segurança. Os policiais contam que dispararam contra os homens, que fugiram, e foram seguidos pelos funcionários públicos.
Os policiais então chegaram a um local depois de perceberem uma poça de sangue e ouvirem ruídos advindos de uma casa. Os agentes de segurança então entraram na residência e pediram para a pessoa sair da área de serviço, onde estava escondida. Segundo relato dos PMs, a pessoa levantou-se de arma em punho e tentou efetuar disparos contra a equipe. Neste momento, cada um dos policiais efetuou dois disparos de arma de fogo.
Os policiais afirmam que chamaram o serviço de Samu e que a vítima dos disparos veio a óbito somente no hospital, não no local do crime. O caso foi registrado pelo Investigador Diego Lopes e pelo delegado Armando Prado Neto na Delegacia de Polícia de São Vicente.
“Primeiro atiram, depois perguntam quem é”, diz mãe do jovem negro
Os familiares do jovem contestam a versão dos agentes de segurança e contam que João Lucas havia ido para a casa do pai e, quando foi abordado, retornava para a sua residência. Naquele dia, fechou a loja mais cedo para checar a saúde do pai, que estava doente. A família também nega que João Lucas tivesse arma ou cometia qualquer ato ilícito. Ele não tinha passagem pelo sistema carcerário.
Em entrevista para a Alma Preta, a mãe Regina de Oliveira afirmou que o jovem foi morto por estar na periferia e criticou o trabalho dos policiais. “Foi morto porque eles não trabalham como deveriam, não fazem uma abordagem como se deve fazer. Primeiro atiram, depois perguntam quem é”.
Ela acredita que o fato do filho ser um jovem negro influenciou na ação da política. “Ser negro e morar na periferia já se torna um fato. A polícia aborda jovens negros como bandidos, não só na Baixada Santista, mas em qualquer lugar, basta ser negro”.
Regina de Oliveira relata que o pai do jovem está deprimido, assim como os amigos. Ela sente dificuldades para sair de casa, porque diz que as pessoas a param na rua para consolar e elogiar João Lucas. “Vou trabalhar, volto pra casa e não saio mais. Tudo me lembra ele. Vou fazer uma comida, aí lembro do gosto dele. Eu nunca pensei que iria sentir tanta dor, só quem vive sabe a dor, e sabe que não vai cicatrizar”.
João Lucas Muniz trabalhava com conserto de bicicletas
O jovem negro João Lucas Muniz era um Microempreendedor Individual (MEI), com um negócio voltado para o conserto de bicicletas, meio de transporte popular na Baixada Santista. Ele tinha a empresa aberta desde agosto de 2023 e havia montado uma oficina na garagem de um colega. Com a empresa, registrada em agosto de 2023, ele havia faturado R$ 118 mil.
Familiares contam que ele começou a trabalhar na oficina com 12 anos de idade, como auxiliar de mecânico. Com o passar do tempo, o dono do espaço ofereceu para João Lucas assumir a empresa.
Com o dinheiro do trabalho, o jovem pagava o aluguel e as contas de água, luz e internet da mãe. “Já estou começando a sentir as dificuldades”, afirmou Regina. João Lucas ainda pagava uma moto que havia comprado, de maneira parcelada.
“Ele tinha muitos sonhos. O primeiro era comprar um imóvel para me tirar da periferia. Depois, queria fazer faculdade, comprar um carro e fazer uma viagem para os Estados Unidos”, relatou a mãe.
Apaixonado pelo Santos Futebol Clube, João Lucas Muniz tinha o hábito de ir para frente da Vila Belmiro, para aguardar a saída dos jogadores e tirar fotos com eles. O jovem fazia parte da Torcida Jovem, maior grupo de torcedores organizados do clube.
Outro lado
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP) afirmou que “o caso é investigado pelas polícias Civil e Militar, com acompanhamento das respectivas corregedorias, Ministério Público e Poder Judiciário”.
No dia dos fatos, a pasta contou que os “policiais militares foram recebidos a tiros ao chegarem no Dique do Piçarro para verificar uma denúncia de indivíduos armados. Houve intervenção e os criminosos fugiram. Posteriormente, um deles foi localizado em um imóvel e houve novo confronto. O suspeito foi atingido e não resistiu. Com ele, foi apreendida uma arma de fogo. Exames periciais foram solicitados e o caso, registrado como tentativa de homicídio, resistência e morte decorrente de intervenção militar na Delegacia de São Vicente”.