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Pretos Saudáveis: conheça a iniciativa que busca descolonizar a corporeidade negra

18 de março de 2019

O que começou como um diário da rotina em busca de uma vida mais saudável tornou-se um projeto

Texto / Simone Freire
Imagem / Reprodução / Facebook

A correria do dia a dia, uma vida sedentária e uma má alimentação. Quantas pessoas não resumem suas próprias vidas a partir destes elementos? E quantas não sentem sua saúde e disposição sendo afetada cada vez mais?

Com a publicitária May Solimar e o mestre em educação física Netto Silvério a situação não era diferente. Os dois viviam uma rotina que os desanimava cada vez mais. Foi então que junto, decidiram mudar a alimentação e se cadastrar em alguma academia.

Mas as ideias não pararam por aí. Ativista social, antirracista; da experiência com salto triplo em Presidente Prudente, interior de São Paulo, Silvério começou a perceber as desigualdades étnico-raciais no esporte, sobretudo no alto rendimento. Já Solimar, que seguiu pelo caminho da comunicação, percebeu que através da comunicação e das ações do casal poderiam alcançar mais pessoas pretas.

“Em uma brincadeira falei para Netto que seria bacana gravarmos ou tiramos fotos de nossos treinos para nos motivar a continuar e quem sabe incentivar outras pessoas pretas a cuidarem melhor de sua saúde”, diz Solimar.

O que começou como um diário da rotina em busca de uma vida mais saudável tornou-se um projeto, o Pretos Saudáveis. A iniciativa completou, recentemente, três meses e já conta com a participação de diversas pessoas.

Atualmente os dois realizam encontros quinzenais a preços acessíveis para grupos de pessoas pretas que gostariam de uma orientação profissional e de vivenciar uma experiência de comunidade.

Em entrevista ao Alma Preta os dois falaram melhor sobre o projeto. Confira:

Alma Preta: No que consiste a iniciativa? Como o projeto se consolida pra fora do mundo virtual?

May Solimar: O Pretos Saudáveis nasceu com o objetivo de incentivar pessoas pretas a cuidarem melhor de sua saúde, através de práticas de atividades físicas e esportivas. Inicialmente, funcionava como um “diário de bordo” nosso, onde postávamos em nossas redes sociais nossa busca por uma vida mais saudável. Em pouco tempo acabamos formando uma turma de amigos que estavam interessados em praticar exercícios juntos.

O Netto que é mestre em Educação Física montava os treinos e eu registrava. Com o tempo formamos uma segunda turma e tomamos gosto em estar ativamente, fora do mundo virtual, na vida das pessoas. Esse contato é extremamente importante, e essencial para nossa proposta.

Para além dos encontro quinzenais realizados em grupos, ainda damos treinamentos individuais, palestras, consultorias e comercializamos produtos como camisetas dry-fit, ecobags, squizes, adesivos, e outros itens, para tornar o projeto cada vez mais sustentável. Todos os nossos produtos carregam a nossa narrativa de sermos uma alternativa à essa cultura fitness excludente e alienante.

Alma Preta: Que pessoas podem participar destes encontros? Tem pré-requisitos?

May Solimar: Nós temos uma narrativa de superação da desigualdade racial no universo fitness. Para isso, assim como qualquer política de ação afirmativa que busca equilibrar as injustiças sociais focando suas ações em públicos específicos, nós, Pretos Saudáveis, atuamos assim. Nosso diálogo é com as pessoas pretas, com o nosso povo, por motivos óbvios. Nós, pretas e pretos, temos que enfrentar muitas barreiras sociais para acessar os serviços e produtos de saúde disponíveis pelos mercados fitness.

Alma Preta: Como tem sido a experiência até aqui?

May Solimar: O mais legal é que estamos conseguindo criar um diálogo que ultrapassa as barreiras de classes sociais e formação acadêmica, de modo que pessoas pretas de diferentes condições socioeconômicas e níveis de escolaridade têm se identificado com as nossas ações, nossas camisetas e nossa narrativa. Isso tem sido uma grata surpresa, não esperávamos um resultado tão positivo em tão pouco tempo.

Alma Preta: E qual a importância de um projeto desse atualmente?

Netto Silvério: Viver uma vida saudável tem se tornado um grande desafio para muitas pessoas que têm visto na cultura fitness a possibilidade de estarem ativos fisicamente. Para as famílias negras com baixa condição socioeconômica é ainda pior. As famílias se alimentam mal, consumindo alimentos ultra-processados de baixíssimo valor nutricional, são pouco ativos fisicamente ou absolutamente sedentários por conta das rotinas de trabalho e das horas gastas com mobilidade urbana.

Desta forma, grande parte da população negra ainda está à margem das experiências da cultura fitness. A própria cultura fitness, que também podemos nomear de mercado fitness, é uma cultura excludente, que vende o conceito de saúde atrelado à imagem de um homem ou mulher musculoso, com baixíssimo percentual de gordura, com músculos definidos, e, é claro, brancos em sua maioria.

Com base nestas problemáticas e em muitas outras, o Pretos Saudáveis tem como objetivo principal a construção de uma narrativa focada na promoção da saúde e bem estar da população preta. Entendemos que construir uma via alternativa a estes enlatados fitness que sufocam as pessoas é fundamental para pensarmos a saúde da população negra.

Alma Preta: Muita gente confunde saúde e estética, certo? Como vocês avaliam isso?

May Solimar: A confusão entre saúde e estética tem muito a ver com o que a cultura e o mercado fitness produz de narrativas do que é saúde e do que é ser uma pessoa saudável. Nós entendemos que isso faz parte de uma lógica de mercado que só contribui para aumentar as desigualdades sociais e os preconceitos contra pessoas que não representam estes modelos de saúde enlatadas.

As pessoas gordas são tão saudáveis quanto as pessoas magras. A condição de saúde não está em ser gordo ou magro, nem em ser musculoso, ou musculosa, mas sim em ter uma rotina saudável, em não ser uma pessoa sedentária, em consumir alimentos com alto valor nutricional. Nós, Pretos Saudáveis, atuamos no sentido da descolonização dos nossos corpos e da nossa corporeidade!

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