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Quase metade das crianças negras de 6 e 7 anos não sabem ler e escrever no Brasil

Segundo a ONG Todos Pela Educação, os percentuais de crianças pretas e pardas de 6 e 7 anos de idade que não sabiam ler e escrever passaram de 28,8% e 28,2%, em 2019, para 47,4% e 44,5%, em 2021

A imagem mostra crianças pequenas usando máscara na sala de aula. Elas estão sentadas em suas carteiras e brincam com um jogo. A professora está próxima a elas, usa máscara e protetor facial

Foto: Mary leal / Secretaria de Educação

11 de fevereiro de 2022

Isaac Levi estuda o terceiro ano na Escola Classe 302, na Asa Norte, em Brasília. Devido à pandemia, o menino de nove anos vai precisar refazer a série e não sabe ler fluentemente. De acordo com a mãe, a gestora de Recursos Humanos, Caroline Nascimento, de 30 anos, ele entende apenas as letras básicas do alfabeto. Ele é apenas mais uma das milhões de crianças com dificuldade de alfabetização no país.

Segundo uma nota técnica feita pela pela organização não-governamental Todos Pela Educação, entre 2019 e 2021, houve um aumento de 66,3% no número de crianças de 6 e 7 anos de idade que, segundo seus responsáveis, não sabiam ler e escrever. O número passou de 1,4 milhão em 2019 para 2,4 milhões em 2021. A pesquisa foi realizada com base em dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) desde 2012. 

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O Todos pela Educação mostra que o impacto da pandemia na alfabetização reforçou a diferença entre crianças brancas e crianças negras. Os percentuais de crianças pretas e pardas de 6 e 7 anos de idade que não sabiam ler e escrever passaram de 28,8% e 28,2% em 2019 para 47,4% e 44,5% em 2021, sendo que entre as crianças brancas o aumento foi de 20,3% para 35,1% no mesmo período.

Também é possível visualizar uma diferença relevante entre as crianças residentes dos domicílios mais ricos e mais pobres do país. Dentre as crianças mais pobres, o percentual das que não sabiam ler e escrever aumentou de 33,6% para 51,0%, entre 2019 e 2021. Dentre as crianças mais ricas, o aumento foi de 11,4% para 16,6%.

Isaac tem um irmão mais novo, de 7 anos, que faz o 2° ano este ano e está se desenvolvendo dentro da normalidade, de acordo com com a família. “A pandemia dificultou muito porque somos uma família com pais separados e o Isaac teve que ficar um tempo com o pai, já que a escola não estava funcionando e eu estava trabalhando normalmente”, disse Caroline. 

A mãe conta que, apesar de o garoto ter tido acompanhamento particular, o tempo de reclusão causou muitos problemas emocionais o que fez com que ele não conseguisse manter os estudos. “Ele tinha total desinteresse pelas matérias básicas dadas na escola”, conta. 

A família de Issac mora em Sobradinho, bairro a 25 km do centro da capital federal e tem acesso à internet e aos aparelhos eletrônicos necessários para as aulas. Essa não é a realidade de muitas das casas no país. 

Acesso a internet

De acordo com o IBGE, apesar do crescimento do acesso à internet entre estudantes maiores de 10 anos, 4,3 milhões ainda não utilizavam o serviço no último trimestre de 2019. A maioria desses estudantes, 95,9%, eram alunos da rede pública de ensino. Na rede privada de educação, apenas 174 mil alunos não tinham conexão à rede mundial de computadores no mesmo período. 

No Norte e Nordeste, o percentual de estudantes da rede pública que utilizaram a internet foi de 68,4% e 77,0%, respectivamente. Nas demais regiões esse percentual variou de 88,6% a 91,3%.

Uma das saídas possíveis para ajudar a resolver a deficiência no acesso à rede para os estudantes seria a utilização dos recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) para conectar escolas, professores e também permitir a compra de equipamentos eletrônicos.

Na lei do Fust, publicada no Diário Oficial da União (DOU) no final de março de 2021, está prevista a conexão das escolas públicas até 2024 e a garantia que os recursos do fundo sejam investidos em áreas de baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Porém, os recursos foram bloqueados.

Além do Fust, o Congresso aprovou o PL 3.477/2020, que previa o repasse de R$3,5 bilhões do Fundo para estados, municípios e o Distrito Federal para garantir serviços de internet para alunos e professores da rede pública de ensino. Mas o governo Bolsonaro vetou integralmente o texto. 

Políticas públicas

Segundo o Todos Pela Educação, “o aumento expressivo no número de crianças não-alfabetizadas e o maior impacto entre alunos negros e mais pobres são dois dos principais desafios”, afirma o líder de políticas educacionais Gabriel Corrêa.

Este mês entrou na pauta do Senado Federal a criação do Sistema Nacional de Educação (SNE). De autoria do senador Flávio Arns (Podemos-PR), o PL 235/2019 seria apreciado em plenário, nesta quarta-feira (9), mas foi retirado de pauta a pedido do próprio relator da matéria, senador Dário Berger (MDB-SC), para que possa avaliar sugestões que lhe foram encaminhadas pelo Ministério da Educação. 

Com o SNE haverá o alinhamento de políticas, programas e ações entre União, estados e municípios, em articulação colaborativa dos entes da Federação na área educacional. A ideia é universalizar o acesso à educação básica e garantir seu padrão universal e integral, assim como foi feito com o Sistema Único de Saúde (SUS). A proposta também tramita na Câmara dos Deputados.

A Alma Preta Jornalismo entrou em contato com o deputado Idilvan Alencar (PDT-CE), relator da pauta na Câmara, para entender melhor o andamento da matéria no parlamento e os desafios que a impedem de ser levada adiante. De acordo com o parlamentar, essa semana se conquistou as assinaturas para o requerimento de urgência na Casa, para que seja apreciado no plenário.

“Estamos conversando com os líderes e com o MEC para chegarmos a um texto que seja aprovado nas duas Casas. Não creio que as coisas estejam difíceis, é o tempo normal de tramitação de um projeto tão importante e complexo”, afirmou Alencar.

Leia também: Após denúncia de racismo, alunos de projeto social são perseguidos

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