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Racismo recreativo: conteúdo protagonizado por casais inter-raciais associa negritude à escuridão

De acordo com especialista, apesar da pretensão aparentemente inofensiva, os vídeos reafirmam a branquitude como norma
Imagem mostra capturas de tela de trecho dos vídeos.

Foto: Reprodução/Tiktok

20 de janeiro de 2024

Tem ganhado popularidade nas redes sociais – sobretudo no Tiktok – uma trend protagonizada por casais inter-raciais apontada como racista por pessoas negras. O conteúdo apresenta jovens brancos sozinhos, em um primeiro momento, com a legenda: “Antes eu tinha medo do escuro”; na sequência, a pessoa aparece ao lado do parceiro negro, com a mensagem: “Agora eu namoro com ele”.

Apesar da pretensão aparentemente inofensiva, de promover relações inter-raciais, segundo especialista ouvida pela Alma Preta Jornalismo, os vídeos promovem racismo recreativo e reafirmam a branquitude como norma, na medida que os parceiros negros são associados à escuridão pelos pares brancos.

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A coordenadora de pesquisa do Observatório da Branquitude, Carol Canegal, acredita que o conteúdo favorece a reprodução do racismo no âmbito das relações afetivas.    

“É possível observar nos vídeos alguns elementos do ponto de vista dos estudos das relações raciais, como a mobilização do racismo recreativo e a reafirmação da brancura como norma, símbolo de superioridade moral e de humanidade. O racismo versa sobre dominação e hierarquia racial e, quando interiorizado e apropriado pelos sujeitos, produz inferiorização”, analisa.

Termo cunhado pelo doutor em Direito e especialista em Direito Antidiscriminatório, Adilson Moreira, o racismo recreativo consiste na propagação do humor e piadas racistas em tom de “brincadeira inofensiva”.

“O racismo recreativo contribui na perpetuação do menosprezo e do temor presentes no ideário negativo atribuído à população negra. Os estereótipos raciais dão sustentação às hierarquias, que necessitam desses estigmas para serem legitimadas”, diz Carol.

Relações inter-racias

Na avaliação dos estudiosos do Observatório da Branquitude, pessoas brancas em dinâmicas de relações com pessoas negras devem ser aliadas da luta antirracista e por equidade. Para a pesquisadora Lia Vainer Schucman, na obra “Famílias inter-raciais: tensões entre cor e amor”, considerada referência para Carol Cenegal, núcleos familiares inter-raciais devem ser permeados pela convivência não hierarquizada.

De modo contrário, os pares brancos em relações inter-raciais podem, sim, ser racistas e contribuir para a alimentação do sistema de opressão racista que adoece pessoas negras diariamente e faz parte da construção da sociedade. É o caso das pessoas negras expostas nos vídeos da trend por parceiros brancos.

Regulação das redes sociais

Na avaliação da especialista do Observatório da Branquitude, uma forma de combater o racismo recreativo nas redes sociais é a regulação das plataformas. Para Carol Canegal, essa regulação deve prever, inclusive, a responsabilização dos aplicativos de mídia e o emprego de sanções em casos de propagação de conteúdos de ódio.

“Longe de se tratar de censura, as plataformas devem ser monitoradas e reguladas pela transmissão de conteúdos avessos à democracia. É fundamental o estabelecimento de regras de combate à desinformação e que responsabilizem as plataformas, garantindo a fiscalização e o emprego de eventuais sanções. A propagação de conteúdos racistas se conecta à propagação de conteúdos de ódio”, conclui.

A assessoria de comunicação do Tiktok, plataforma onde a trend viralizou, foi contatada pela reportagem para se posicionar acerca do conteúdo. Até a publicação deste texto não houve resposta. O espaço continua aberto.

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  • Fernando Assunção

    Atua como repórter no Alma Preta Jornalismo e escreve sobre meio ambiente, cultura, violações a direitos humanos e comunidades tradicionais. Já atua em redações jornalísticas há mais de três anos e integrou a comunicação de festivais como Psica, Exú e Afromap.

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