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Saúde Mental nas Periferias: projeto acolhe pessoas em vulnerabilidade social a partir da escuta

“É impregnado dentro das periferias uma falsa abordagem sobre saúde mental, que distorce e faz com que não busquemos esse autocuidado”, explica idealizadora 

Imagem: arquivo pessoal

Foto: Imagem: arquivo pessoal

19 de outubro de 2022

“Quando entramos no debate da saúde mental, rompemos vendas dos olhos e tampões dos ouvidos de quem precisa entender sobre o tema, quebrando essa estigmatização existente. Saúde mental é de extrema importância. Dentro das periferias há mais pessoas adoecidas do que em bairros nobres”. É o que aponta a idealizadora do projeto Saúde Mental Nas Periferias, Géssica de Paula.

Moradora da zona oeste de São Paulo, Géssica conta à Alma Preta Jornalismo que é necessário tirar do imaginário social que os cuidados e a prevenção aos transtornos psicológicos sejam atrelados à elite, pelo contrário, é uma demanda que afeta principalmente a população mais carente. Com encontros que desmistificam a temática, o projeto, segundo sua idealizadora, pretende levar informações de qualidade para quem mais precisa de amparo psicológico e social e garantir uma escuta acolhedora. 

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“Nosso primeiro encontro teve como tema ‘saúde mental é coisa de burguês?’. A elite branca até nisso nos tirou o direito do autocuidado. Ainda é impregnando dentro das periferias uma falsa abordagem sobre saúde mental, distorcendo e fazendo com que nós não busquemos esse autocuidado”, comenta Géssica de Paula. 

O projeto

“Por volta do mês de fevereiro comecei a pedir ajuda nas minhas redes sociais para uma moça que estava gestante e estava com a saúde psicológica bem debilitada. Essa moça é a minha irmã, mas ocultei essa parte como uma preservação, precisava achar caminhos para poder ajuda-lá”, lembra a idealizadora. 

A partir do contato com mulheres que hoje fazem parte da rede de apoio do Saúde Mental Nas Periferias – Ana Carolina Luz, Brenda Silva, Lyn Sagaz e Natasha Helsinger – Géssica criou um grupo para manter o diálogo mais fácil na busca de caminhos necessários para encontrar ajuda para a sua irmã, que corria o risco de perder a guarda do filho temporariamente devido ao seu estado emocional.

“Minha irmã parecia estável, até que começou os picos de surtos novamente. O Conselho Tutelar teve que tirar o bebê dela, porque ela estava morando sozinha. Ela foi internada por 30 dias, em que fiquei cuidando do meu sobrinho. A rede de apoio ali foi fundamental”, salienta. 

Com tudo isso vivido, Géssica sentiu a necessidade de promover soluções nas regiões periféricas acerca de cuidados com a saúde mental, temática que, segundo ela, ainda causa muita dúvida nos moradores de locais vulneráveis. 

“O que pra nós chega é uma visão muito preconceituosa sobre a loucura e sobre o que é saúde mental, em vez de chegar que a nossa mente é parte do nosso corpo e precisa de cuidados”, enfatiza.

Desconforto e dificuldade de acesso

“Quando falamos de saúde mental dentro das periferias, o que o olhar de muitos demonstra é desconforto. Nota-se que no entendimento do outro, estamos o tratando como uma pessoa ‘louca’. Não gosto muito de usar essa palavra, mas é algo popular em uma sociedade que não se tem o direito de conhecimento sobre a temática”, explica. 

Para Géssica, um dos principais entraves que pessoas pobres encontram ao buscar amparo profissional é o valor das consultas, que muitas vezes não é compatível com o salário das pessoas periféricas. Com isso, a iniciativa tenta também mostrar para esse público que existem projetos sociais com escuta gratuita ou com preço social, prestando atendimento de qualidade. 

“Pessoas pobres têm o dobro de chances de estarem deprimidas. Essas pessoas têm o direito de saber aonde recorrer e como recorrer, que a dor delas pode ser dividida com um profissional, que a escuta de qualidade é um direito de cada um de nós”, pontua. 

Urgência e futuro

“Imagine uma mãe solo, com três filhos, sem emprego, faltando alimento dentro da sua casa? Imagine o que rola dentro dessa mulher, o tanto de conflitos existentes, a frustração por estar sozinha, a falta de emprego e alimentos, seus filhos chorando. Essa mulher entra em um desespero, que a leva a uma depressão ou até mesmo a cometer algo contra sua própria vida”, lamenta Géssica de Paula. 

Com histórias assim, o projeto Saúde Mental Nas Periferias pretende marcar um segundo encontro de acolhimento no mês de novembro, mas para a idealizadora, a iniciativa deve ir além. Os encontros são marcados pelas redes sociais do projeto e quem se interessar deve entrar em contato para participar das rodas de conversa.

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A idealizadora do projeto Saúde Mental nas Periferias Géssica de Paula | Imagem: arquivo pessoal

“Os planos são que o projeto crie raízes, que tenhamos nosso local de acolhimento e que possamos levar esse projeto para dentro das periferias de São Paulo e fora também, mostrando a importância da saúde mental dentro das nossas existências”, destaca. 

“Eu como mulher negra, me sinto preenchida, pois proporcionar esse conhecimento para a periferia e conhecer também as vivências de quem está passando por algo envolvendo saúde mental podendo traçar caminhos para ajudar essas pessoas é algo grandioso. É saber que posso fazer algo para os meus”, finaliza. 

 

Leia também: ‘Quem olha para a saúde mental das mulheres negras?’

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