Nesta sexta-feira (19) é comemorado o Dia Mundial da Fotografia. A data marca o surgimento do daguerreótipo, considerado o primeiro equipamento que deu origem ao processo fotográfico, e a popularização do aparelho pelo mundo.
Apesar da data histórica, até os dias atuais, muitas são as lacunas entre a fotografia e a população negra, que, a partir do processo de colonização, foi retratada de forma pejorativa e atravessada por estereótipos.
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Em busca de ressignificar esse olhar, fotógrafas negras baianas buscam trazer as suas próprias narrativas contra os padrões coloniais e devolver o protagonismo do povo preto em suas obras. Confira abaixo o perfil de quatro profissionais negras:
Gabriela Palha (@gspalha)
Nascida em Moçambique, no sul da África, Gabriela Palha traz em seu trabalho um olhar íntimo das cores, expressões e cultura da Bahia, especialmente do recôncavo baiano, em Cachoeira, cidade onde estudou Cinema.
Ao trocar as lentes do celular por uma câmera profissional, Gabriela também criou uma relação de autoajuda com a fotografia, o que foi essencial para superar a timidez e fazer com que outras pessoas pretas enxergassem a sua própria beleza.
“O corpo preto sempre era visto nos jornais, na televisão, sempre nas matérias policiais ou como o corpo morto, ferido ou preso […] e o que eu sempre penso é como eu gostaria de ser vista? como eu gostaria que me fotografassem? E eu tento fazer isso com as pessoas que eu fotografo”, relata a profissional.
No seu trabalho, Gabriela conta que busca retratar uma leveza no cotidiano de pessoas pretas, além de construir um lugar de memória.
“Além da transformação, também tem um lance da memória. Durante muito tempo a gente não tinha nada registrado dos nossos antepassados e se tinha era esse lugar, feito por pessoas brancas. Muito dificilmente a gente tinha a gente pela gente, contando as nossas próprias histórias”, completa.
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Isabel Ramos (@ramosia_)
A relação de Isabel com a fotografia começou ainda na infância, com a paixão que foi repassada pela mãe e que hoje se tornou a sua principal profissão.
Moradora do Engenho Velho da Federação, comunidade de Salvador, Isabel também é poeta e produtora cultural e as suas obras trazem um olhar de cuidado e afeto entre as pessoas negras.
Como mulher negra, não-binária e lésbica, Isabel aborda questões que dialogam com a causa LGBTQIA+ e com a autoestima do povo negro.
“Eu quero que as pessoas se vejam, se reconheçam como belas, sendo quem elas são, do jeito que são […] porque o que a gente vê de fotografia de gente preta na mídia? Ou é extrema pobreza ou a sexualização do nosso corpo”, comenta a fotógrafa.
“O meu caminho é pelo afeto. Quero mostrar o afeto entre a gente, o afeto com os nossos semelhantes mas também com a gente mesmo, quero fotografar uma mulher preta à vontade com o corpo dela e com quem ela é”, completa Isabel Ramos.
Para o seu trabalho, Isabel fala sobre a importância das pessoas negras enxergarem a sua própria beleza na fotografia, com os seus traços e as suas diversidades.
“Isso também é uma coisa importante para os fotógrafos pensarem que pessoas pretas precisam se reconhecer nas fotos, elas precisam ser fiéis a cor de pele, aos traços das pessoas pretas […] Nós somos diversos e precisamos mostrar isso”, afirma.
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Alice Rodrigues (@alicerodriguesphotoart)
A paixão da fotógrafa Alice Rodrigues pela profissão veio junto com a dança. Enquanto dançarina, Alice passou a questionar os motivos por não se ver nas fotos dos espetáculos que participava e aquela interrogação se tornou um dos motivos em querer estar por trás e a frente das câmeras.
Foi quando se tornou fotógrafa e artista que ela passou a enxergar como o racismo se movimenta para excluir corpos pretos nos diversos espaços.
“Eu comecei na fotografia de dança pensando mesmo nessa democracia de fotografia e me questionava o porquê não tinha fotos minhas. Chegou um tempo que eu comecei a relacionar isso com a minha estética, com a minha cor e foi bem chato”, conta.
Por meio da “fotografia afrocentrada” – como define o seu trabalho – Alice Rodrigues busca trazer o protagonismo de pessoas pretas com exaltação da ancestralidade, estética e potência.
“A fotografia começa dentro de uma história racista onde nós não éramos destacados, onde não tínhamos o direito de ser fotografados, dentro disso, a fotografia afrocentrada é para entender e colocar o povo preto como centro do meu trabalho”, comenta a profissional.
Para a artista, a fotografia também é um instrumento de organização e criação de espaços onde o povo negro tenha a oportunidade de se reconhecer e conectar com a sua história. “Esse processo de afrocentrar o meu trabalho também traz para mim uma relação de me conectar e me reconectar com as pessoas pretas e com nossos e nossas ancestrais”
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Ellen Katarine (@_ekfotografia)
Natural de Valente, cidade da região sisaleira no sertão baiano, Ellen Katarine é graduanda em História e fotógrafa. O seu interesse pela profissão surgiu durante um processo de pesquisa da licenciatura. Em busca de descolonizar a imagem das pessoas negras escravizadas no Brasil, Ellen conta que o seu trabalho é romper com os estereótipos projetados em cima de corpos negros.
“Através da minha fotografia eu estou nesse corre de estar quebrando esses estereótipos, mostrando a nossa cultura, a nossa beleza e religiosidade”, conta.
Atualmente, Ellen pesquisa fotografias de pessoas negras em terreiros de candomblé e nos núcleos familiares. Para ela, a fotografia representa uma memória afetiva na sua história e ressalta a importância de retomar de forma positiva os símbolos relacionados à cultura negra.
“Tudo que é ligado a gente, à nossa cultura, sempre foi algo negativo, então a partir da minha fotografia eu quero ocupar esse espaço de estar registrando de forma positiva e exaltar tudo o que é nosso”, completa.
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