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ENTREVISTA I Larissa Luz ressignifica a deusa Afrodite e fala sobre afroafetividade em novo EP

‘Deusa Dulov Vol. 1’ chegou às plataformas de streaming na última semana e retrata as camadas das relações afrocentradas; em conversa com a Alma Preta Jornalismo, a artista revela o que motivou falar da temática nesta nova fase

 

Imagem mostra cantora deitada em uma piscina com cabelo rosa trançado

Foto: Imagem: Divulgação/Caio Lírio

31 de janeiro de 2022

A cantora baiana Larissa Luz lança mais um trabalho musical, o EP ‘Deusa Dulov Vol. 1’. Neste novo momento, a artista abre espaço para trabalhar com camadas que envolvem as relações amorosas, dando enfoque nas afrocentradas. Misturando o dancehall, dub, batidas eletrônicas e ritmos jamaicanos, o novo disco ainda promete desconstruir e reconstruir a deusa Afrodite sob o olhar de uma mulher preta. 

“A construção dessa narrativa perpassa pelo entendimento de que fortalecer a autoestima e cultuar o amor próprio é essencial para que a gente se disponha a viver uma relação saudável com outra pessoa. Pretendo repensar por onde passa a nossa construção do amor próprio para que a gente possa achar caminhos de fortalecimento da nossa autoestima”, conta a cantora.

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Neste novo trabalho, Larissa Luz contou com produção musical de Tropkillaz, projeto de música eletrônica formado em 2012 pelos DJs e produtores brasileiros André Laudz e Zé Gonzales, com composições de Coruja Bc1 e Bruno Zambelli. Ao todo, cinco faixas dão luz ao novo trabalho: ‘Afrodate (Dreadlov)’, ‘Cupido Erê’, ‘TBT’, ‘Montanha Russa’ e ‘Brinco Só’. 

Em conversa com a Alma Preta Jornalismo, a cantora fala sobre o processo de criação, as parcerias, o conceito do novo trabalho, a oportunidade de mostrar ao público uma nova faceta e de apresentar o EP ao vivo. Confira:

Leia também: Afroafeto é tema do novo videoclipe da cantora Larissa Luz

Alma Preta Jornalismo (APJ): Na faixa ‘Não Tenha Medo de Mim’, que antecede o EP, é possível identificar uma mudança na narrativa e estética desde o ‘Trovão (2019)’, seu último álbum lançado. Isso acompanha um processo de vivência e descobertas da Larissa Luz?

Larissa Luz (LL): Normalmente, os meus trabalhos refletem coisas que estou vivenciando, vivendo na pele, no meu dia a dia. Então, esse tema passou a ser um tema recorrente não só dos meus enredos, mas nas narrativas em minha volta. Refletir sobre isso se tornou mais constante de um tempo para cá. Naturalmente, fui externalizando isso na minha poesia, na minha música, na minha arte.  

APJ: Para o EP ‘Deusa Dulov’, você se apresenta ressignificando a deusa do amor, do sexo e fertilidade, Afrodite. Como é representá-la aos seus olhos nesse novo projeto? 

LL: A ideia é ressignificar essa deusa por ser uma deusa muito popular e conhecida, em uma tentativa de trazer a nossa realidade para o centro e aguçar a nossa percepção para que esse padrão de beleza e de fertilidade seja também representado por corpos como os nossos. Então, o conceito é fazer uma sátira e trazer esse símbolo, que é tão marcante dentro da nossa sociedade, para dizer que as deusas também podem ter as nossas caras, simbolicamente falando, nossos corpos e as nossas histórias também. 

APJ: E essa figura central reflete nas temáticas das canções que compõem o trabalho, que reúne ritmos diversos, como o dancehall, pagodão baiano e dub. Como você pensou nessa pluralidade de ritmos que atravessam a história cultural e musical preta? Tem a ver com quem somou ao projeto, como Tropkillaz e Coruja BC1?

LL: Sim, sim. Tropkillaz, por exemplo, sugeriu vários outros elementos rítmicos, por já ter uma bagagem sonora do pop e eletrônica, mas muita coisa partiu de mim. Já é uma pesquisa que venho fazendo sobre esses ritmos diaspóricos e negros e de como eles se desenvolveram ao redor do mundo quando se encontraram com outras culturas, sabe? Então, já é um universo que eu venho passeando e explorando de outras formas, combinações e de modos diferentes de fazer. Isso já venho construindo há um tempo para retratar um universo que é o meu e é nosso, enquanto pessoas pretas com uma pegada futurista e eletrônica, referenciada de ‘músicas da pista’. Para o EP, peguei elementos que já tenho familiaridade para testar novas combinações.   

APJ: Também faz parte do projeto esse jogo com o corriqueiro e a referência espiritual de matriz africana, como no trecho de ‘Afrodate (Drealov)’, quando você canta: “Enquanto seus dreads passeiam na minha trança nagô / Nossa sintonia é fogo, pique Iansã e Xangô, preto”. Explica um pouco sobre esse elo nas composições e se isso faz parte de um processo de naturalização de termos ligados à religiões de matrizes africanas?

LL: Super! É isso mesmo. A ideia é naturalizar nossos símbolos. Dentro desse processo de ressignificação, acho que tem essa etapa de naturalizar nossos símbolos, os nossos deuses, os nossos mitos, as nossas histórias e a nossa mitologia, sabe? Então, eu estou sempre trazendo por, primeiro, ser algo natural, é a minha linguagem, é a minha história cotidiana, está no meu dia a dia. Segundo, acredito que a pode naturalizar esses símbolos, esses termos, essas práticas que a gente sabe que não são vistas, por muitos, da forma como deveria e, muitas vezes, sofrendo muita violência por conta disso. Por isso, trazer de uma forma natural, como é para a gente, é uma forma de movimentar as coisas, no sentido de mais que aceitação, respeito mesmo à nossa cultura e a nossa história. 

APJ: É perceptível que não só a narrativa e a estética mudam sua carreira com esse trabalho. É possível perceber tons de humor para falar, por exemplo, dos processos de recaídas amorosas. É uma nova faceta da Larissa Luz que o público vai poder conhecer?

LL: Sim, sim. Eu falo que Iansã é o búfalo e todo mundo já conhece. Agora, vai conhecer a borboleta. Gosto de brincar com as situações, mesmo quando elas parecem ser problemáticas. Às vezes, é bom a gente ter leveza para ressignificar as coisas e achar soluções, caminhos. Caso não, a gente vai viver o tempo inteiro com o fardo de resolver as nossas questões e nossas pautas, sem desfrutar e sentir o prazer de estar vivo, de ser, de viver e não só sobreviver. Então, acredito que essa forma de compor e essas letras mais divertidas e bem humoradas, no fundo, tem tudo isso aí nas entrelinhas. É uma tentativa de perpassar pelas situações e todas as questões que atravessam a gente nesse movimento de se relacionar, de se dispor, de trocar com alguém, de construir algo ou não e ver tudo isso com mais tranquilidade, entendendo que vai dar tudo certo. Na verdade, já está dando. 

APJ: Para quem quer assistir ao show do novo trabalho, o que pode esperar? Já tem apresentação do EP marcada? 

LL: Pois é. A gente tinha algumas datas, porém tudo mudou por agora por conta do nosso cenário, que estávamos achando que estava acabando, mas não. Fomos todos com sede ao pote e acabou que o setor cultural está dando uma nova recuada, né? Então, a gente dá uns passos para trás para contribuir com esse movimento de fazer tudo ficar mais seguro para todo mundo. Por agora, sem datas ao vivo, mas eu quero que seja logo! 

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