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Páginas negras: Léa Garcia, os rappers e as influências do movimento negro

4 de julho de 2016

Entrevista com Léa Garcia sobre a vida nas favelas, as opressões vividas pelas mulheres negras e seus desafios e um pouco da importância da música carioca através do rap e do funk.

Texto / DJ Cortecertu para o Zona Suburbana
Edição de imagem / Pedro Borges

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No livro Damas Negras, de Sandra Almada, a atriz Léa Garcia fala sobre a força da mensagem do rap e do funk carioca. Reunindo entrevistas com quatro atrizes negras e militantes, a obra de Sandra Almada destaca os trabalhos e ideias de Chica Xavier, Léa Garcia, Ruth de Souza e Zezé Motta. Abaixo, leia parte da conversa entre Almada e Léa. A situação do povo das favelas, o preconceito e o machismo contra a mulher negra, a luta dos pioneiros do movimento negro e a continuidade na arte dos DJs e MCs são os principais temas.

Contexto
O ano é 1995. Em São Paulo, músicas de grupos como Racionais MCs, DMN, FNR, Face Negra, MT BRONKS, Comando DMC, entre outros, abordam o racismo e a violência policial.

O rap, que começou como forma de diversão e se espalhou pelos bailes da cidade, passa a ter um significado importante para a personalidade do jovem negro. A juventude branca também curte e faz rap, mas o canto falado tem um efeito enorme na formação da autoestima dos pretos que vivem nas periferias e sofrem com a desigualdade social e com o racismo. Vivências diferentes, resultados estéticos e sociais diferentes. O jovem negro sente o rap, precisa do rap, fica informado e informa por meio do canto falado. Nos discos, riscos e palcos Mano Brown diz: “A juventude negra agora tem voz ativa”.

ENTREVISTA

Sandra Almada: Com relação à identidade negra…(Léa interrompe a pergunta)

Léa Garcia: Eu gosto muito dos meninos do rap, eu os amo. A primeira vez que ouvi esse rap – ‘’Eu só quero é ser feliz, andar tranquilamente na favela onde eu nasci / E poder me orgulhar de ter a consciência que o pobre tem seu lugar…” – estava no caixa do supermercado e comecei a chorar. E a funcionária me perguntou: “Você vai conseguir paga?” Eu não parava de chorar.

Sandra Almada: O que a comoveu tanto?

Léa Garcia: Além dessa realidade que é vivenciada nas favelas, os desaparecimentos, essa agressividade que as pessoas sofrem. Tudo isso.

Sandra Almada: Não lhe traz satisfação saber, por exemplo, que os rappers estão de alguma forma ocupando espaço no mercado fonográfico, ganhando dinheiro, entrando na mídia?

Léa Garcia: Mas foi isso. A letra me tocou, mas com ela veio a felicidade de ver esses meninos conquistando toda uma sociedade, já que em todas as classes sociais se canta o rap. Pararam agora o baile (no morro do Chapéu Mangueira), porque disseram que a Benedita da Silva (senadora do PT/Rio) estava fazendo “conchavos” com os marginais. Se ela nasceu e se criou no morro, ninguém melhor para fazer uma negociação saudável, sem agressividade, sem armas, porque conhece todo mundo, porque é respeitada lá em cima.

Não temos como negar que há necessidade de se “negociar”, já que eles também são poderosos. Foi uma cretinice tão grande, fiquei tão desesperada quando li isso…Uma mulher negra, quando ganha notoriedade, está sempre sofrendo discriminação. Aliás, estão sempre querendo denegrir a imagem da mulher negra, em qualquer circunstância.

Sandra Almada: Interessante…enquanto falava dos rappers, foi o momento da entrevista em que a senhora mostrou-se mais feliz.

Léa Garcia: (Sorriso). Outro dia, eu assisti a um debate que aconteceu em São Paulo entre alguns rappers e delegados de polícia. Esses rapazes se mostraram inteligentes, saudáveis, debatendo com chefes de polícia, de comportamento padronizado, formais, preconceituosos, sem alcançarem, sem atingirem a proposta dessa garotada.

Sandra Almada: Você integra um movimento social que buscou mobilizar grande parcela da população negra pobre, essa mesma parcela cuja juventude se expressa no rap. E, para muitos, essa iniciativa não teve o alcance esperado. Onde vocês acham que erraram, já que, ao que parece, essa juventude sozinha, sem interferência direta dos movimentos de conscientização negra…(Léa interrompe a pergunta)

Léa Garcia: Esses meninos são filhos de pessoas que fizeram lá, naquelas comunidades, um trabalho de conscientização, outros tiveram influência indireta desse tipo de atuação, e há também a questão de eles estarem vivenciando um outro momento. Como eu já disse, a gente não retrocede.

Saiba mais sobre o livro Damas Negras

Sandra Almada: Os rappers teriam recebido influência dos movimentos negros?

Léa Garcia: É lógico. Toda essa luta repercutiu de alguma forma, porque vários trabalhos foram feitos em várias comunidades. Eles deviam ser pequeninos, alguma coisa chamou-lhes a atenção, porque eles têm uma posição política muito boa.

Sandra Almada: Os rappers são filhos bastardos do movimento negro?

Léa Garcia: As coisas ficam registradas dentro da gente, no útero da mãe, no inconsciente, até o momento em que afloram. Tudo tem sua validade.

Sandra Almada: Nossa conversa comeuçou focalizando o lado árduo da luta do negro no Brasil. Com os rappers falamos sobre o retorno positivo. Eu gostaria que a senhora falasse um pouco mais disso. Quem acompanha a carreira de vocês quer saber sobre o lado bonito do sucesso…

Léa Garcia: O sucesso, para mim, é poder representar, trabalhar, desenvolver minha carreira. Eu adoro o palco, adoro representar. O meu conceito de sucesso está ligado à realização de trabalho, à realização interior.

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