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Livro conta detalhes da ”pequena África” da Zona Norte de São Paulo

13 de janeiro de 2020

Sociólogo Tadeu Kaçula buscou a origem do bairro mais negro da capital paulista e de suas tradições culturais

Texto e imagens / Juca Guimarães | Edição / Simone Freire

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A feitura do livro durou seis anos da rotina do escritor, sociólogo e sambista Tadeu Kaçula. Os três primeiros foram dedicados à escrita e os três seguintes à maturação, afeto e revisão das histórias da Casa Verde, um bairro na Zona Norte de São Paulo (SP). O resultado é a obra “Casa Verde – Uma pequena África Paulistana”, publicado pela editora LiberArs.

O livro reúne uma grande pesquisa em arquivos e fontes oficiais além das histórias de personagens da região como o atleta campeão olímpico Adhemar Ferreira da Silva; o jogador de futebol Serginho Chulapa; Seu Carlão da Peruche, Dionísio Barbosa; o jornalista Evaristo de Carvalho; Hélio Bagunça, fundador da Tom Maior; Idval e Zelão os dois maiores campeões de samba de enredo do Carnaval.

O autor conta também a história das festas negras tradicionais do bairro como a que acontece todo segundo domingo do ano e que é promovida pela irmandade de São Benedito dos Pretos Católicos, na rua Galiléia, com comida, samba, cortejo e congada.

Kaçula também é um dos idealizadores do Instituto Cultural Samba Autêntico, que já existe há 20 anos. Em 2020, o instituto terá uma sede e vai promover encontros mensais sobre a tradição da cultura negra no Brasil e no samba.

O lançamento do livro Casa Verde – Uma pequena África Paulistana será no dia 26 de janeiro, a partir das 14h, no Espaço Cruz da Esperança, na rua Marambaia, 802, no bairro da Casa Verde, Zona Norte de São Paulo. Confira a entrevista com o autor!

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Alma Preta: Qual a importância da Casa Verde para a negritude? E por que você escreveu este livro?

Tadeu Kaçula: Ele surge da necessidade de reafirmar territórios negros na cidade de São Paulo. Casa Verde, Brasilândia, Freguesia do Ó, Limão, Cachoeirinha, Imirim, entre outros, são bairros historicamente negros. É a região mais negra da cidade de São Paulo, a mais negra do Estado de São Paulo e também, segundo alguns estudos e relatos, é a região com mais negros no país. Existe em São Paulo uma forte investida para apagar as digitais negras, uma tentativa de apagamento da história negra que ajudou a edificar o Estado de São Paulo.

E principalmente a cidade de São Paulo…

Sim. E, em contradição, é a cidade mais racista e fascista do país. Por isso a necessidade de ressignificar e reafirmar esses territórios. Fazer com que, de fato, possamos mostrar por meio de publicações, fotografias, áudios, como a presença negra é importante.

O que te chamou a atenção no começo da pesquisa?

Foi a história do bairro da Liberdade [região central da cidade] e os impactos da especulação imobiliária é perversa em expulsar as populações. Eu uso o termo “higienização étnica” dos territórios. Se a gente não começar a escrever sobre isso, debater sobre isso e colocar luz sobre a história real desses bairros, a gente vai continuar sofrendo com esses apagamentos da cultura negra.

Você também tem um vínculo afetivo com a Casa Verde?

Sou nascido e criado na Casa Verde. Nasci na antiga rua Odete, número 930. Circulando pelo bairro você percebe uma identificação imediata porque tem uma grande quantidade de famílias negras que moram na região. Ali perto, na divisa com o Limão, tem o bairro Vila Carolina, que é conhecido como “Navio Negreiro”, é um território importante. São famílias que trazem consigo não apenas a questão da ocupação territorial mas também diversas tradições negras vindas do interior do Estado e de outras regiões do Brasil formando um território de cultura negra.

Essa cultura não é apenas o samba. Ela vai além, não é?

Existe uma gama significativa de cultura acontecendo na zona Norte além do samba. Tem presença de Ylês de Candomblé, tem Templos de Umbanda, tem Afoxés. O principal é o Afoxé Omo Dadá da mãe Vanda de Oxun, que faz parte da história não só da zona Norte, mas da cidade. Desde os tempos dos desfiles na avenida Tiradentes, o Omo Dadá é o afoxé que abre o Carnaval de São Paulo. Na zona Norte, você encontra famílias que cultuam o Batuque de Umbigada, vindo o interior do Estado de cidade como Tietê, Piracicaba, Capivari, entre outras.

Sobre o que mais fala o livro?

Tem a participação negra nas artes plásticas. A famílias do João Cândido Silva, conhecido como Cachimbo e que é um dos fundadores da Unidos do Peruche, é uma família muito importante nas artes plásticas com reconhecimento internacional e eles moram na Casa Verde Alta.

Você falou da Peruche. A zona Norte tem muitas escolas de samba.

Só na Casa Verde tem: Morro da Casa Verde, Império da Casa Verde, Unidos do Peruche,, Mocidade Alegre. Subindo um pouquinho tem a Rosas de Ouro, Tucuruvi, X-9 Paulistana. Tem as pequenas escolas, tem os blocos carnavalescos. É um número expressivo de manifestações carnavalescas. Mas quem foram os fundadores dessas escolas? Como elas surgiram? Qual o fator positivo que levou a zona norte a ser uma região tão cheia de arte e música. Foi aí que eu entrei na história da origem do bairro.

E qual é essa origem?

Era uma grande fazenda e a cor da sede dessa fazenda era verde. No processo de loteamento era para se chamar Vila Tietê, por conta do rio Tietê que é próximo da região, mas o nome Casa Verde já tinha pegado entre as pessoas. É um bairro grande que se subdivide entre Casa Verde, Casa Verde Alta e Casa Verde Baixa. No livro eu também falo da importância da Frente Negra Brasileira, que comprou um grande lote de terras e começa a alocar na região as famílias negras que são expulsas do centro. Isso por volta de 1930. Já naquela época, durante um processo de especulação imobiliária. Vieram famílias que moravam em cortiços do Bixiga, da Barra Funda, do Bom Retiro e tantos outros bairros.

Essa iniciativa da Frente Negra Brasileira foi um marco importante na luta antirracismo.

Foi fundamental. A elite brasileira, principalmente em São Paulo, tinha um projeto de transformar a cidade com um modelo de aspiração européia. Ter arquitetura européia com a presença apenas da população que tem origem europeia. A população negra não estava nesses planos, muito semelhante com o que aconteceu em Buenos Aires. Houve o processo de expulsão das famílias negras que já viviam nesses territórios. No livro eu chamo isso de pequena diáspora do povo negro do Centro para a Zona Norte.

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