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Museu da Pessoa tem acervo de mais de 30 anos de histórias de vidas brasileiras

Com uma coleção de mais de 18 mil histórias, uma exposição em comemoração aos 30 anos do Museu mostra parte desse acervo no Sesc Bom Retiro, em São Paulo, com um eixo temático dedicado às Vidas Negras

Imagem de parte da exposição do Museu da Pessoa no Sesc Bom Retiro. Na foto, estão retratos de algumas pessoas, sendo que algumas delas são negras.

Foto: Imagem: J.R. Costa

1 de fevereiro de 2023

“Toda história importa. Toda história vale a pena”. Esses são alguns dos lemas que compõem o manifesto do Museu da Pessoa, uma organização social sem fins lucrativos cuja trajetória possui mais de 30 anos. Em comemoração à sua existência, foi inaugurada uma exposição no Sesc Bom Retiro, em São Paulo, que vai até o dia 2 de abril e que traz as vidas negras registradas no museu como um dos seus focos temáticos.

De acordo com Karen Worcman, diretora e fundadora do Museu da Pessoa, a sua data simbólica de criação se deu em 3 de dezembro de 1991, quando foi inaugurada a exposição “Memória & Migração”, no Museu da Imagem e do Som (MIS) em São Paulo. O evento incluía a proposta de gravações de histórias de pessoas que visitaram a exposição.

“Era a primeira experiência aberta desta ideia de que toda e qualquer pessoa é convidada a se tornar acervo do museu e, com isto, ter sua história eternizada. O formato efetivo disso era um estúdio montado dentro da exposição. O estúdio ficou aberto durante os 15 dias da exposição”, conta Karen.

A diretora do museu também relata que o convite de contar a própria história foi amplamente aceito pelo público. Entre grupos que contavam suas histórias e indivíduos, foram gravadas 44 histórias de vida e 5 rodas com cerca de 15 pessoas em cada rodada, que eram compostas por grupos de imigrantes. Este foi considerado o marco inicial que se desenrolou em outros workshops e oficinas, até a construção de protótipos do Museu da Pessoa virtual.

“Um grupo [de pessoas envolvidas na construção do museu] foi se constituindo ao longo desse primeiro ano. O grupo era composto pelo jornalista Mauro Malin, pelo jornalista, documentarista e escritor José Santos e pelas historiadoras Claudia Leonor Guedes de Oliveira e Marcia Ruiz”, explica Karen.

Hoje, após quase 32 anos, o Museu da Pessoa possui um acervo colaborativo, totalmente digitalizado e que pode ser acessado gratuitamente. Carregando como missão “transformar a história de toda e qualquer pessoa em patrimônio da humanidade”, o acervo conta com mais de 18 mil histórias de vida de diversas origens, classes sociais, etnias, cores/raças, regiões e cidades do país. Além disso, são mais de 60 mil fotos e documentos, mais de 16 mil horas de conteúdo audiovisual e mais de 90 publicações.

“Creio que acabamos de viver momentos que nos mostram a importância em ter a memória sempre presente. O Museu da Pessoa ressalta o valor da história de cada pessoa como forma de democratizar a construção histórica do país. Uma história que foi construída com base na exclusão de muitas culturas, pessoas, grupos e comunidades”, comenta Karen Worcman. “Um país só se constrói de forma mais justa se enfrentar sua própria história e se puder rediscutir seus legados (ainda que sejam coloniais)”.

Vidas negras registradas

“Não há uma história de vida igual a outra. Isso significa dizer que não há uma vida igual a outra. As vidas são únicas, assim como as formas de contá-las. Quantas delas escutamos? Quantas delas são escutadas? O que muda, ou poderia mudar, se passássemos a prestar mais atenção nas histórias das pessoas que estão sobre a Terra?”. Esses são alguns dos questionamentos que fazem parte do manifesto do Museu da Pessoa, compartilhado no portal da organização.

Girlei Luiza Museu da PessoaFoto do acervo tem Girlei Luiza, uma das criadora do grupo afro Ilú Obá De Min | Crédito: Arquivo pessoal

Para a educadora social Bel Santos Mayer, curadora convidada do eixo Vidas Negras da exposição “Qual é o seu Legado? 30 anos de Museu da Pessoa no Brasil” no Sesc Bom Retiro, o Museu da Pessoa garante que a subjetividade e também o cotidiano e a história das famílias, sobretudo das populações historicamente invisibilizadas, sejam registradas em primeira pessoa.

“É um jeito da gente preencher, na história do nosso país, lacunas que foram abertas por considerar as nossas existências pretas menos importantes”, afirma Bel.

Além disso, Bel Santos afirma que essa é a possibilidade de se conhecer histórias de pessoas negras que chegaram a uma maior visibilidade no país, a partir de suas trajetórias e ancestralidades, mas também acessar as histórias de uma população preta que sempre esteve na base da pirâmide mantendo o país de pé e sendo silenciada.

“No Museu da Pessoa, as histórias registradas são um exercício e uma prática de humanização, ao contrário do que a gente costuma ter que são histórias de transformação para justificar a meritocracia”, acrescenta.

Fotos da Exposição no Sesc Bom RetiroImagens da exposição no Sesc Bom Retiro | Crédito: J.R. Costa

Segundo a educadora social, essa também é uma maneira de ter pessoas olhando para a câmera e trazendo as imagens e fotografias que elas escolheram para contar suas próprias histórias. Além disso, elas podem falar sobre suas existências com a cabeça para cima e olhando para a frente, o que fortalece quem conta, mas, sobretudo, quem ouve.

“Eu diria que o museu da pessoa, ao registrar essas vidas pretas, diz pra todos e todas aquilo que o ministro Silvio Almeida trouxe no seu épico discurso de posse: você existe e é importante. Mas aí a gente faz isso na primeira pessoa. Eu existo. Isso é importante para a história geral do nosso país”, enfatiza.

Algumas das histórias de pessoas negras que compõem o acervo são da filósofa e ativista antirracista Sueli Carneiro, do escultor e museólogo Emanoel Araújo, da escritora Geni Guimarães e da quilombola mineira Maria de Lourdes, mais conhecida como Dona Ducha.

Qual é o seu legado?

A exposição “Qual é o seu Legado? 30 anos de Museu da Pessoa no Brasil” está em cartaz no Sesc Bom Retiro desde o dia 3 de dezembro de 2022. Além de Bel Santos Mayer como curadora convidada do eixo Vidas Negras, a mostra tem o escritor, músico e cineasta Cristino Wapichana, como curador convidado do eixo Vidas Indígenas, o escritor e curador de fotografia Diógenes Moura, como curador do eixo Retratos do Brasil, e Karen Worcman, como curadora geral.

A mostra tem mais de 250 histórias representadas, entre fotos, trechos de depoimentos e recortes audiovisuais.

Em sua curadoria para o eixo de Vidas Negras, Bel Santos Mayer conta que se voltou especialmente a trazer aspectos das vidas negras que as pessoas estão menos habituadas a olhar, como as relações em família, para mostrar que as famílias negras, apesar de todas as dificuldades enfrentadas, se amam, riem e festejam.

“É para perceber que a nossa história é de muita luta e de muita resistência, mas atravessada por muita amorosidade. Eu me preocupei muito em trazer esses espaços do cotidiano. Cuidei para encontrar imagens e palavras, vozes dizendo sobre o cuidado, o aconchego, o colo, sobre tudo aquilo que aconteceu nessas casas”, destaca.

Assim, ela explica que seu olhar para a curadoria da mostra foca na casa, no colo e no quilombo. “Colo, casa e quilombo como espaços de fortalecimento, como espaços de sustentação desse país. As nossas pautas reivindicatórias, os nossos movimentos, eles partem desse lugar de acolhimento, de cuidado e eu fui procurando também os autores e as autoras literários e literárias que nos ajudam a trazer também metáforas e poesias a sustentar essas imagens e esses imaginários, como Conceição Evaristo e vários outros autores”, acrescenta.

Para contar sua história

A diretora do museu Karen Worcman conta que há diversos canais para recebimentos de histórias para o acervo. “O Museu possui um estúdio aberto ao público, um programa de entrevistas online (todos estes dois programas são feitos por inscrições), a ferramenta virtual ‘Conte sua história’ e cabines de captação de histórias que circulam por espaços públicos diversos”, explica.

Atualmente, uma dessas cabines de captação de histórias está instalada no Sesc Bom Retiro, na exposição “Qual é o Seu Legado?”.

Serviço

Exposição “Qual é o seu legado? 30 anos de Museu da Pessoa no Brasil”
Período expositivo: até 02 de abril de 2023
Visitação: terça a sexta, das 9h às 20h; sábado, das 10h às 20h; domingo e feriado, das 10h às 18h
Sesc Bom Retiro (Alameda Nothmann, 185 – Bom Retiro – São Paulo)
Entrada gratuita. Não é necessário realizar agendamento.
Agendamento de grupos: [email protected]

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