Melanina Digital cataloga obras, entrevistas, biografias e informações sobre os dramaturgos negros contemporâneos no Brasil
Texto / Divulgação
Imagem / Diney Araújo
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Autores de teatro, roteiristas, performers, que constroem suas narrativas e representações sobre o negro e a sociedade brasileira, com diferentes apelos estéticos, mas em comum o fato de serem negros. É o que demonstra a Plataforma Melanina Digital, um catálogo de dramaturgos negros disponível on line, reunindo a pesquisa realizada ao longo das cinco edições do Festival Dramaturgias da Melanina Acentuada, idealizado e coordenado pelo Doutorando em Artes Cênicas, dramaturgo e ator Aldri Anunciação.
Até não muito tempo atrás se dizia que não tínhamos muito autores negros, seja no teatro, seja no audiovisual. Com a inquietação de mostrar que esta não é uma realidade é que Aldri Anunciação promoveu as edições do Festival Dramaturgias da Melanina Acentuada, promovendo além de apresentações de espetáculos cujos textos eram assinados por autores negros, além de realizar encontros, entrevistas públicas e compartilhamento de processo. Mais de 60 dramaturgos passaram pelo festival e todo material compilado gera a base de dados da plataforma digital, onde será possível ter acesso aos autores negros de teatro, performance e audiovisual, bem como cadastrar novos nomes e obras.
De acordo com Aldri Anunciação, curador do Melanina Acentuada, ao longo desses cinco anos de existência no formato de itinerante (com três edições em Salvador, uma em São Paulo e outra no Rio de Janeiro), o evento se consolidou como um espaço de compartilhamento e visibilidade da produção negra no campo da dramaturgia, sendo referência para pesquisadores de todo país. “Nossa intenção foi mapear e catalogar autores negros, que estejam inseridos no mercado e quanto aqueles que produziram obras inéditas. Conhecer sua poética, os temas e elaborações que estes estão realizando” acrescenta o coordenador do projeto, que teve a ideia de criar uma mostra centrada nas questões sobre autoria negra a partir da constante escuta, em espaços diversos, que não havia dramaturgos negros no Brasil.
Para Aldri, o Melanina Digital torna o festival permanente, para além dos períodos de sua realização presencial e acessível a um amplo espectro de público de todo país. Neste ambiente virtual, os próprios dramaturgos poderão cadastrar suas obras e se fazer conhecer e reconhecer. Como o evento se tornou referência para criadores e pesquisadores negros, havendo sempre interesse em ter acesso aos dramaturgos, obras, entrevistas, surgiu a urgência de tornar todo esse manancial acumulado numa plataforma acessível a todos. “O Melanina Digital cataloga as discussões e produções que perpassaram no festival ao longo dos anos. Em nossa plataforma digital o festival seguirá permanente, disponibilizando as produções, minibiografias dos dramaturgos e seus pensamentos, as mesas de discussão”.
No site, o usuário encontrará todo conteúdo reunido ao longo das edições anteriores e atuais do Melanina Acentuada, a exemplo de entrevistas públicas, palestras, rodas de discussão, minibiografia dos dramaturgos, textos dramáticos disponibilizados, vídeos, artigos entre outros. A plataforma se configura numa inovação tanto por apresentar um raro espaço de mapeamento e catalogação tanto no campo das artes cênicas quanto das literaturas, bem como oferece um material privilegiado e que será permanentemente atualizado pelos próprios usuários que poderão enviar seus textos, contribuições e conteúdos.
Aldri Anunciação sinaliza que ao longo dos anos de realização do festival, sempre houve uma demanda de pesquisadores e ativistas que gostariam de ter acesso às obras e informações dos dramaturgos negros. A plataforma digital tornará acessível essas informações ao alcance de todos, além de permitir uma atualização e articulação constante entre autores, público e s pesquisadores. “Fica mais evidente o caráter do Melanina Acentuada como um espaço de pesquisa artística permanente, que inclusive vai alterando o entendimento sobre texto, autoria, dramaturgia a partir dos diálogos com os criadores” revela o idealizador do site.
Para o ator e autor Preto Amparo (MG) que participa da 5ª edição do Festival Dramaturgias da Melanina Acentuada com o espetáculo Violento, discutir sobre a dramaturgia negra é discutir também sobre estratégias de enfrentamento a modelos únicos de conhecimento, que excluem a experiencia do negro. O espaço da plataforma seria sobretudo um local de articulação e compartilhamento de estratégias criativas e de luta. “É importante pensar sobre a dramaturgia negra e a escrita preta. Entender como é que ela se dá e como os dramaturgos negros estão inseridos numa sociedade onde o modelo vigente é branco, eurocêntrico. Nós, dramaturgos negros, vivemos num contexto em que a negritude precisa pautar os espaços de conhecimento e do poder. Então interessa pensar em articulação entre artistas e criar modos de falar sobre esses novos processos e desses novos lugares, criar articulação entre os artistas da cena preta. Pensar e repensar as estruturas, de modo decolonial e compreender como essas novas práticas e novos processos podem contribuir na luta contra o processo colonial que ainda existe” explica o artista.
E a dramaturgia negra já não precisa seguir aquele antigo modelo, de escrita solitária, isolada. Mas ter modos dinâmicos de produção, como na experiencia de Tarina Quelho, diretora e dramaturga, que participa do Festival Dramaturgias da Melanina Acentuada e por consequência vai figurar entre os autores na Plataforma Melanina Digital. No espetáculo Isto É Um Negro?, a escrita não veio previamente à sala de ensaio, mas a partir dos diálogos dos criadores, com suas questões, dores e leituras de modo coletivo e colaborativo entre os diversos criadores da montagem. “A dramaturgia no Isto É um Negro? nasceu de um incômodo e na cena, foi o efeito do diálogo entre nós e também com as vozes daqueles autores com os quais nos encontramos. Nós dizemos entre nós, brincando, que o texto foi “pós-escrito” pois a primeira versão do texto só foi elaborada quase um ano após nossa estreia” compartilha.
Para a atriz e dramaturga Mônica Santana, um dos principais valores do Melanina Digital é de modo enfático contrapor ideias cristalizadas de que não há autores negros ativos no Brasil. “O lugar da autoria, enquanto lugar de pensamento, elaboração e subjetividade é historicamente negado ao negro, mais ainda às mulheres negras. Quando num espaço virtual, se cataloga e disponibiliza as obras, o pensamento, a experiência criativa e poética de escritores negros, rompe-se com os discursos que negam a nossa existência, bem como apresentamos nossas próprias narrativas e modos de ler o mundo” explica.
O Melanina Digital é uma realização da Melanina Acentuada Produções, com produção da Cardim Projetos Culturais e conta com patrocínio da OI e do Estado da Bahia, através do programa Fazcultura, Secretaria de Cultura e Secretaria da Fazenda.
Serviço:
Lançamento da Plataforma Melanina Digital