“Com certeza um dos maiores desafios que nós temos é o orçamento, além do machismo e do racismo estrutural que impede o nosso povo de chegar ao poder”, disse Célia Xacriabá, pré-candidata à deputada federal pelo Psol de Minas Gerais. Neste ano, candidatas indígenas se organizaram em uma frente com mais de 15 mulheres que disputarão cadeiras nas Câmaras estaduais e federal.
Mestra em Desenvolvimento Sustentável e Doutoranda em Antropologia, Célia Xacriabá, que é professora e militante pelas causas dos povos indígenas, contou à Alma Preta Jornalismo que competir com outras candidaturas que já estão no poder a bastante tempo é desigual, tanto financeiramente quanto em questão do reconhecimento popular.
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“A luta das mulheres indígenas para adentrar o parlamento perpassa pela deslegitimação da força e da intelectualidade. Nós também não somos conhecidas, temos que conquistar a credibilidade e a confiança das pessoas. Tudo isso precisa de dinheiro para fazer uma boa campanha, de estar nos meios de comunicação”, disse a pré-candidata.
O povo Xakriabá vive às margens do rio São Francisco e, de acordo com Célia, só foram demarcados um terço do seu território original. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima em 1.108.970 pessoas residentes em áreas indígenas. O estudo, feito em 2021, combina o ultimo Censo, de 2010, com a versão mais atualizada da Base Territorial.
Atualmente, os povos originários têm buscado ocupar espaços de poder para lutar pelos seus direitos. Hoje, existe uma junta de juristas indígenas especializados em defender e prestar auxílio aos seus parentes. Além disso, na presença de candidaturas de mulheres indígenas demonstra que os conhecimentos ancestrais se adaptam à realidade contemporânea para se manterem vivos.
“Não estamos chegando na política cedo ou despreparados, como muitos pensam. São 522 anos de luta e resistência e também de teimosia, mesmo com toda a necropolítica do governo brasileiro”, afirmou Célia Xacriabá.
Simone Karipuna, pré-candidata à deputada federal pelo Partido Verde (PV), do Amapá, declarou que os desafios são diversos para adentrar os espaços políticos. “As pessoas querem uma fala polida e não uma fala cultural, nós, muitas vezes, não temos essa fala intelectual”, afirmou.
Ela, que pode ser a primeira indigena deputada pelo Amapá, diz que existe uma força contrária enorme para a inserção de mulheres, ainda mais as indígenas, no poder. “O que tem de mais desafiador é o racismo que nos mata. Quando a gente vê que, no Congresso Nacional, somente em 2018 chega Joênia Wapichana como deputada, sofrendo várias repetições, percebemos que a luta não é sobre ser a primeira, mas é sobre não deixar ser a última”, reiterou Karipuna.
A coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e pré-candidata a deputada federal pelo Psol de São Paulo, Sônia Guajajara, relatou que o lançando uma bancada de mulheres indígenas é preciso para impedir os retrocessos impostos pelo governo. “É uma forma de enfrentamento direto e de garantir a nossa presença”, afirmou.
Durante o Acampamento Terra Livre, que reúne mais de 100 povos e cerca de 8 mil pessoas, em Brasília, foi lançada a pré-candidatura de 15 mulheres indígenas.
União entre indígenas e mulheres negras
Além do capital político e financeiro, as candidatas falaram que o mais importante seria fortalecer a candidatura de mulheres indígenas com a candidatura de mulheres negras “por serem corpos tão marginalizados e resistentes quanto os nossos”. , disseram as lideranças em unanimidade. Mesmo representando cerca de 30% da população brasileira, as mulheres negras são sub-representadas na política. No pleito de 2018, apenas 13 negras foram eleitas, sendo cinco mulheres pretas.
“Não existe como não sentir medo, mas eu escolho ter coragem porque, quando nosso povo estava sendo dizimando, nossas ancestrais não tiveram escolha e, sim, coragem. Somos fortes e somos apenas o instrumento de um candidatura que pertence a espiritualidade”, ressaltou Célia Xakriabá.
Telma Taurepang, que foi candidata ao Senado em 2018, vai sair como deputada federal pelo PSD de Roraima. Ela já passou na pele o cerceamento de direitos à terra imposto por fazendeiros. Para a pré-candidata chegar dentro do Congresso é uma questão de caráter.
“Não temos políticas públicas voltadas para as mulheres indígenas. Estou aqui para fazer diferente, uma política diferente que se destaque dessa feita por homens brancos. Os desafios são muitos, mas as mulheres unidas fazem a diferença”, declarou.
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