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No Recife, vereadores cobram cotas raciais em todas seleções de cargos públicos

No ano em que se completa uma década da aprovação da política de cotas, parlamentares da capital querem estender a reserva de vagas para outros tipos de seleções; o objetivo é tentar equalizar racialmente a ocupação de cargos dentro da administração pública

A fachada da Câmara Municipal do Recife

Foto: Reprodução

23 de fevereiro de 2022

Como forma de incidir no eixo municipal, considerando que a Lei de Cotas completa, neste ano, 10 anos desde a sua implementação, parlamentares do Recife querem garantir políticas que trabalhem a igualdade racial dentro do âmbito da administração pública, reservando vagas para a população negra na cidade. 

Na capital, mesmo havendo a lei que assegura a reserva de 20% das vagas para esta população, para os parlamentares e movimentos sociais, a política não é totalmente efetiva. O motivo é que a porcentagem só é aplicada para concursos públicos, não abrangendo para outro tipo de seleções. 

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Foi nesse quesito que a vereadora Dani Portela (PSOL-PE), após imersão e pesquisa sobre as leis municipais existentes sobre enfrentamento ao racismo e projeção da igualdade, atentou para uma problemática: no município, quase 30% dos cargos da administração pública não estão ocupados por concursados, o que incide diretamente na ocupação por parte de pessoas negras.

Para reverter o quadro, a parlamentar apresentou, em março de 2021, um Projeto de Lei Ordinária que visava regulamentar o inciso XXI, do artigo 63, da Lei Orgânica do Município do Recife. Como diretriz da ação, o objetivo era reservar à população da raça negra 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos e seleções simplificadas de cargos efetivos e empregos públicos, fossem eles provenientes da administração direta, das autarquias, das fundações públicas ou das empresas públicas.

Entretanto, completando um ano desde a sua protocolação, o PLO ainda não foi votado pela Câmara Municipal do Recife, pois recebeu parecer negativo nas comissões. O pedido da vereadora, que conta com diálogo junto a movimentos sociais por igualdade racial, tramitou nas comissões de Legislação e Justiça e de Finanças e Orçamento, por exemplo, mas foi barrado sob a justificativa de que este recurso na Lei Orgânica não seria de responsabilidade parlamentar e, sim, do Poder Executivo. 

Dani Portela defende a necessidade de maior agilidade na extensão da política de cotas na cidade, tendo em vista as problemáticas sobre quem ocupa os cargos no poder público atualmente.

“Nós estamos falando de diversas funções e cargos que contam com contratos precarizados, temporários, até mesmo comissionados e dados de forma por aprovação simplificada. O problema disso é o perfil de quem ocupa e quais são os meios que se usam para equalizar o acesso a essas vagas”, dispara.

Questionada sobre a demora e a falta de priorização do tema por parte do município, a parlamentar reflete sobre a invisibilidade de políticas públicas de igualdade racial em uma cidade que é tida como a capital mais desigual do país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE). 

“É necessário falar da redução de desigualdades aqui, sejam elas de classe, gênero ou raça, tendo em vista, principalmente, que a nossa população, em sua maioria, se autodeclara preta ou parda. Isso em um contexto de cidade que, infelizmente, apresenta um dos piores índices de desenvolvimento social. Ao que parece, não há vontade política de redução da desigualdade de emprego e renda, além de outros setores, como a educação, moradia, transporte público, entre outros”, pontua. 

Leia também: Lei que proíbe homenagens a escravocratas e ao Golpe Militar é sancionada em Olinda

Cobrança se volta ao Executivo

Como forma de contornar a paralisação do PLO sobre as cotas, Dani Portela e demais mandatos progressistas pretendem, neste ano, pressionar a prefeitura do Recife para que a iniciativa tenha continuidade no executivo. Com isso, a lei passaria de ordinária para municipal e seria aplicada nos demais processos seletivos. 

Os mandatos acreditam que o município, ao expandir a política de cotas, vai atuar em consonância com os direitos previstos na Constituição Federal, possibilitando uma conquista expressa por cotas no serviço público para as populações mais excluídas destes espaços. 

De acordo com a atuação de Dani Portela, o também vereador Ivan Moraes (PSOL-PE) acredita que a mudança na lei municipal vai ser efetiva e possibilitará novos acessos à população negra da cidade. 

“É uma política que tem dado certo a nível nacional e atuado em dinâmicas de outros espaços, que vão para além da educação, como se era pautada em seu início. Por isso, nós estamos incidindo, junto ao mandato de Dani Portela, no Estatuto de Igualdade Racial, por mais políticas que prezam por igualdade racial no âmbito da administração pública do Recife, que, ao meu ver, não deveria abrir vagas simplificadas ou terceirizadas”, afirma o vereador. 

A ação também é apoiada por movimentos sociais. Para Hallana de Carvalho, representante da Coalizão Negra por Direitos em Pernambuco, de resultado das diversas experiências de Lei de Cotas na esfera pública, seja no serviço público ou na educação, o que se pode ver é a democratização do acesso a espaços de poder marcados historicamente pela exclusão de pessoas não brancas. 

“Por isso, ter pessoas negras atuando é de suma importância, pois somos nós, população negra, que mais usufruímos dos diversos serviços prestados neste setor. E, para além disso, é preciso chamar atenção para o fato de que pessoas negras no serviço público estão fortemente concentradas em cargos que são sistematicamente precarizados. Então é preciso, sim, que haja uma política de reserva de vagas que garanta a presença de pessoas negras no quadro de servidores dos diferentes cargo”, afirma. 

O que diz a prefeitura 

Enquanto aguarda os próximos passos, o desejo da vereadora continua sendo ‘enegrecer’ os serviços públicos, tendo servidores e servidoras negras representando exatamente o perfil racial da cidade.

“Precisamos chegar em um posto de saúde, por exemplo, e encontrarmos mais profissionais negros. Não por uma questão apenas de representatividade, mas para que o serviço público seja prestado por mais qualidade para a população, principalmente, por quem entende suas especificidades. Isso é um desejo que nós, este ano, não vamos cessar”, finaliza. 

Procurada pela Alma Preta Jornalismo, a assessoria de comunicação da Prefeitura do Recife afirma que, atualmente, o processo de contratações segue os ritos estabelecidos em legislação pertinente e afirma estar aberta a conversas sobre. 

“A Secretaria de Desenvolvimento Social, Direitos Humanos, Juventude e Políticas sobre Drogas (SDSDHJPD) vem acompanhando os debates e a Prefeitura ratifica que está sempre aberta ao diálogo com todas as representações dos recifenses. A gestão municipal vem ampliando políticas públicas para pessoas negras com o entendimento de fomentar e redistribuir de forma mais equânime as oportunidades para os munícipes”, finaliza a nota.

Leia também: MTST pressiona Prefeitura do Recife por desapropriação de área ocupada por 300 famílias

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