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Nas 18 capitais com segundo turno para prefeito, apenas um candidato se autodeclara preto

18 de novembro de 2020

Entre os 36 candidatos com chance de se eleger para as prefeituras no dia 29 de novembro, o único preto é Nilvan Ferreira (MDB), de João Pessoa (PB)

Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões I Imagem: Shutterstock

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As eleições municipais de 2020 foram marcadas por vitórias significativas de negros e negras para cargos de vereadores, também foi registrado um aumento no número de candidaturas negras. No caso da disputa para prefeitos, a participação negra ainda é baixa, inclusive para o segundo turno.

De acordo com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), das 5.570 cidades do país, 2.134 (38%) não teve uma única candidatura negra para prefeito. Ou seja, em quatro de cada dez cidades, os eleitores não tinham pretos ou pardos como opções de escolha para prefeito.

Levantamento feito pelo Alma Preta constatou que das 18 capitais que ainda vão decidir no segundo turno o futuro prefeito, 13 têm candidatos brancos na disputa. Em sete destas 13, as duas opções de nomes no segundo turno são de candidatos brancos. Das 36 candidaturas no segundo turno nas capitais, há um candidato autodeclarado preto, 15 se dizem pardos e 20 têm o registro de candidaturas como brancos.

O único preto é Nilvan Ferreira (MDB), que disputa à Prefeitura de João Pessoa, capital da Paraíba, com Cícero Lucena (PP). É a primeira vez que Nilvan disputa um cargo majoritário e antes da eleição seu nome foi sondado como possível candidato pelo PSL.

“A disputa para se candidatar a prefeito começa nos partidos, com indicações de caciques e burocracias internas. Além disso, são instituições e como tal são afetadas pelo racismo, que no Brasil se institucionaliza e se estrutura na sociedade. Por isso negros têm menores chances de se tornarem candidatos para prefeitos”, explica o cientista político Leonardo Fabri. “O Douglas Belchior [professor e ativista do Movimento Negro] já fez críticas a partidos de esquerda como Rede e PSOL por conta das dificuldades encontradas pelas candidaturas negras para conseguir recursos, que são recursos públicos”, acrescenta Fabri, que também é mestrando em Administração Pública e Governo na FGV (Fundação Getulio Vargas).

As sete capitais com apenas candidatos brancos na disputa dos segundo turno são: Vitória (ES), Recife (PE), Fortaleza (CE), Porto Alegre (RS), Cuiabá (MT), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). Já as onde a disputa envolve um candidato branco e um pardo são: Belém (PA), São Luís (MA), Rio Branco (AC), Porto Velho (RO), Maceió (AL) e Goiânia (GO).

As quatro capitais com dois candidatos autodeclarados pardos no segundo turno para prefeito são: Aracaju (SE), Boa Vista (Roraima), Teresina (PI) e Manaus (AM). Em Macapá (AP), as eleições foram adiadas por conta do apagão. Em oito capitais, o prefeito foi escolhido em primeiro turno. Foram sete autodeclarados brancos e um pardo, eleito em Salvador (BA).

Eleitores não votam em negros para prefeito?

A questão regional e da equidade racial, segundo Leonardo Fabri, também teve impacto nas eleições para prefeito nas capitais. “Pessoas negras têm conseguido se desenvolver dentro dos partidos porque as legendas estão espalhadas em territórios onde a disputa é muito menos transparente. O problema não é que o eleitor vota pouco em pessoas negras, embora isso também deve ser discutido, mas eu acho que não se consegue construir candidaturas coerentes com opções válidas que componham e contemplem a população negra para o restante do eleitorado”, considera.

Em São Paulo, com exceção de Orlando Slva (PCdoB) e da Vera Lucia (PSTU), dois da Esquerda, não havia opção de negros para a Prefeitura. “É preciso analisar como é a discussão interna dos partidos no tocante à equidade racial”,a complementa o cientista político, especialista em pesquisas de padrões de desenvolvimento, políticas públicas e as múltiplas dimensões da desigualdade.

Desempenho nas urnas

Para o deputado estadual Orlando Silva, que concorreu à Prefeitura da capital paulista, é motivo de comemoração o avanço de candidatura de negros para a vereança e a decisão do TSE que aprovou o financiamento proporcional para candidaturas negras com os recursos do Fundo Eleitoral.

Orlando comenta que em capitais como Belo Horizonte e Rio de Janeiro tiveram candidaturas negras com chances de ir para o segundo turno, Áurea Carolina (PSOL) e Benedita da Silva (PT), respectivamente, Para ele, elas tiveram bom desempenho nas urnas, mas há uma questão fundamental apresentada nos resultados.

“Para vereador, todos os partidos têm candidatos negros. Dessa forma, o eleitor escolhe dentro do seu partido uma candidatura. Já para prefeito, para fazer um voto antirracista, você precisa ir além da questão partidária. Essa é a reflexão que Sueli Carneiro [fundadora do Geledés] sempre faz: ‘Entre a Direita e a Esquerda, eu continuo sendo uma mulher negra’. Temos que construir uma linha para atravessar as fronteiras partidárias. Precisa ter uma agenda antirracista dentro dos partidos”, avalia.

Ainda segundo o deputado federal e ex-candidato, a campanha feita por ele com foco na luta antirracista foi uma decisão certeira uma vez que levou aos debates da maior cidade do país uma agenda de resistência e combate ao racismo. “Pautar o racismo estrutural foi importante e o nosso apoio para o segundo turno à candidatura de Boulos vai depender do compromisso dele com uma agenda antirracista, com propostas objetivas. A minha candidatura semeou um trabalho para avançar nas políticas institucionais. Com racismo não existe democracia”, reforça.

Vera Lúcia, que tentou ser prefeita de São Paulo pelo PSTU, avalia que o tema racial na política deve ser incorporado na luta de classe para unir a classe trabalhadora. “As eleições são determinadas pelo poder econômico. O maior problema que enfrentamos na condição de negros é que a sociedade, dividida em classes, se utiliza do fato de sermos negros para intensificar a exploração. Uma prefeitura comprometida com as causas dos negros e negras da classe trabalhadora, consequentemente requer que você governe em confronto com a classe dominante de empresários brancos e negros, que têm acordo com este tipo de política. O fato de ser negro, não sustenta que você governa para os negros ou para a classe trabalhadora”, conclui.

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