Dos 513 deputados federais eleitos, 125 se autodeclaram negros, o que não corresponde com a representação da população negra brasileira. Conheça alguns nomes
Texto / Pedro Borges e Thalyta Martins
Imagem / Reprodução
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A nova Câmara dos Deputados que começa a agir no ano que vem contará com 21 pretos e 104 pardos. Juntos, eles representam parte da população negra brasileira, que, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), corresponde a 55,9% (47,1% pardo e 8,8% preto) dos cidadãos. Pela primeira vez na história da política brasileira, uma mulher indígena, Joênia Wapichana, foi eleita por Roraima.
Se comparado com as eleições de 2014, o número cresceu em 5%, de 103 para 125. Mas negros continuam sub-representados, haja vista as 75% das cadeiras ainda ocupadas por deputados brancos e alguns destes muito ricos: 241 políticos declararam patrimônio superior a R$ 1 milhão ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Orlando Silva (PC do B), novamente eleito para deputado federal por São Paulo, reitera a ausência de negros nesse espaço e a necessidade de lutar para que essa situação seja revertida.
“Ainda somos poucos, nossa representação no Parlamento está longe de significar o que é a sociedade, assim como a sub-representação feminina. Muito ainda a lutar, ainda mais a conquistar”.
Áurea Carolina (PSOL), eleita pela primeira vez como deputada federal, acredita que a histórica ausência de grupos sociais marginalizados, como negros e mulheres, nos espaços de poder gera um barreira para a superação das desigualdades no Brasil.
“Sem representatividade no sistema político, a nossa luta é ainda mais árdua, porque a gente resiste no cotidiano, com a nossa ancestralidade, com as nossas muitas formas de lutar, mas a gente precisa conquistar direitos, políticas públicas que melhorem nossas condições de vida. E para isso é preciso ocupar a política”
O avanço em termos de representatividade é considerado tímido, porque as eleições deste ano foram marcadas pelo aumento de candidaturas negras inscritas em 9,2%, quase o dobro do número de candidaturas eleitas para o cargo de deputado federal.
O número total de candidaturas para todos cargos saltou de 11.580 para 12.651, se comparados com as eleições de 2014. Nas eleições de 2018, os negros representaram 46% do total de candidaturas, contra 44,3% do que representavam no pleito de quatro anos atrás.
Bianca Santana, autora da obra “Quando me descobri negra”, participou da articulação da campanha do candidato Douglas Belchior (PSOL), que não conseguiu a eleição para o cargo de deputado federal. Para ela, negras e negros deixam de pleitear a vaga porque sabem da dificuldade do processo e da ausência de apoio.
“Pessoas negras se jogam menos a essa possibilidade, tanto por saber que vai ser muito difícil, quanto por uma condição financeira para isso. Quem consegue não trabalhar para ser candidato ou candidata ou para apoiar alguém? Tem aí um teto material muito triste, que nos coloca em condição de muita precariedade. Quando vamos para a disputa, a gente já vai desse outro lugar”, diz.
Bianca também acredita que o imaginário social existente sobre mulheres e homens negros dificulta a recepção do voto, que simbolizaria um gesto de confiança para outra pessoa.
“A maior parte dos homens negros é visto como o perigoso, que não tem condição de fazer essa liderança política, e isso é o racismo arraigado dentro das pessoas, que é expresso também no voto, na escolha das pessoas por representantes”, ressalta.
Apesar do aumento de candidaturas negras, políticos questionaram a diferença de recursos destinada para postulantes negros e brancos a cargos públicos. Segundo denúncia feita pelo ativista do movimento negro, Douglas Belchior, mesmo partidos à esquerda privilegiam candidaturas brancas.
Uma pesquisa feita pelo jornal O Estado de S. Paulo apontou que nas eleições de 2016, os partidos políticos investiram em média 216% a mais em candidatos brancos, do que nas candidaturas negras.
“Se for uma vontade trazer mais pessoas negras para os espaços de poder, teria que existir ações afirmativas para isso. Essa pessoa que tem menos condição precisaria de mais recurso, mais condições, mais suporte para conseguir estar no páreo. O que a gente viu foram os partidos oferecerem menos dinheiro e menos possibilidade”, explica Bianca Santana.
Eleitos e negros
Entre os nomes que vão, entre outras funções, aprovar, discutir e propor leis, e aceitar ou não medidas provisórias propostas pelo presidente da República, fiscalizar e controlar as ações do Poder Executivo por meio de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e chancelar o Orçamento da União, estão Vicentinho (PT), atual deputado federal no seu o quarto mandato, Orlando Silva (PCdoB), atual deputado federal, Talíria Petrone (PSOL), vereadora na Câmara Municipal de Niterói, e Áurea Carolina (PSOL), vereadora do município de Belo Horizonte.
Vicentinho
Vicentinho, formado em Direito, já foi trabalhador rural e minerador em Acari, no Rio Grande do Norte, e metalúrgico. Fez parte da fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e foi um dos fundadores do PT.
Como parlamentar, foi eleito pelo DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), por cinco anos consecutivos, um dos 100 parlamentares mais atuantes do Congresso Nacional.
Na Câmara, já presidiu a Comissão da Reforma Trabalhista; a Comissão da Redução da Jornada de Trabalho e Comissão sobre a Crise – Geração de Empregos e Serviços, além de atuar na Comissão Permanente do Trabalho, Administração e Serviço Público. O parlamentar também integrou a CPI do Trabalho Escravo e foi membro da Câmara de Negociação de Desenvolvimento Econômico e Social. Foi presidente da Frente Parlamentar Pró-Guardas Municipais, membro da Frente Parlamentar em Defesa da Igualdade Racial e dos Quilombos e coordenador da Frente Parlamentar Pela Saúde e Segurança no Trabalho.
Áurea Carolina
Quarta deputada federal mais votada pelo estado de Minas Gerais, Áurea Carolina recebeu mais de 159 mil votos nas eleições do dia 7 de outubro.
A eleita é cientista social, especialista em Gênero e Igualdade e mestre em Ciência Política. Foi subsecretária de Políticas para as Mulheres de Minas Gerais e é uma das fundadoras do Fórum das Juventudes da Grande BH. Atualmente, participa do movimento Muitas pela Cidade que Queremos.
Seu atual mandato de vereadora na Câmara Municipal de BH fortaleceu a luta por direitos das mulheres, negros e LGBTs. Entre suas bandeiras estão a plena efetivação do direito à ocupação do espaço público e o fomento à participação popular na política.
Orlando Silva
Formado em Direito, o deputado federal reeleito para mais um mandato, já foi presidente da União da Juventude Socialista (UJS) e da União Nacional dos Estudantes (UNE). No governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Orlando exerceu o cargo secretário Nacional de Esporte Educacional, secretário-executivo do Ministério do Esporte, e posteriormente em 2006, foi empossado como Ministro da pasta.
Como ministro, Orlando implantou o Programa Bolsa-Atleta e o Plano Brasil Medalha, além de programas sociais como Esporte e Lazer das Cidades, oferecendo atividade física orientada para um número de jovens e crianças do Brasil.
Em 2013, foi empossado Vereador de São Paulo, onde permaneceu até o pleito de 2014 no qual se elegeu Deputado Federal. Na Câmara, Orlando foi relator da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, presidiu a Comissão de Trabalho, onde barrou o projeto de privatização da Eletrobras.
Talíria Petrone
Atual vereadora em Niterói, a professora da rede pública de ensino Talíria Petrone também ingressa na Câmara dos Deputados em Brasília no ano que vem. Formada em História e mestre em Serviço Social, Talíria é socialista, feminista militante dos direitos LGBT, dos Direitos Humanos e do Movimento Negro. Ela foi a nona candidata mais votada no estado do Rio de Janeiro para o cargo de deputada federal.
Seu mandato terá atuação nos temas mulheres, questão racial, LGBT, democracia e participação popular, educação, saúde, assistência social, economia, território e meio ambiente, direitos humanos, segurança pública, acesso à justiça e cultura.