O Alma Preta também conversou com as deputadas Áurea Carolina (Psol-MG) e Benedita da Silva (PT-RJ) para entender as mudanças na previdência social
Texto / Pedro Borges | Imagem / EBC / Arquivo | Edição / Simone Freire
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O projeto que visa mudanças na Previdência Social do Brasil, proposto pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, terá efeitos desastrosos para mulheres e homens negros, segundo as deputadas Talíria Petrone (Psol-RJ), Áurea Carolina (Psol-MG) e Benedita da Silva (PT-RJ).
Mesmo com a dificuldade encontrada pelo governo até o momento para encontrar o número de deputados federais para aprovar o projeto, com o apoio de Rodrigo Maia (DEM-RJ), o governo deve seguir todos os trâmites para colocar ainda no primeiro semestre a reforma da Previdência em votação. No dia 24 de abril, a proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa.
As principais mudanças do texto são: fim da aposentadoria por tempo de contribuição; mudança do tempo mínimo para se aposentar para mulheres, com 62 anos, e homens com 65; alteração do tempo mínimo de contribuição de 15 para 20 anos, para homens e mulheres; diminuição da pensão por morte para viúvos de 100% para 60% do dependente; redução do benefício inicial para o idoso pobre de R$ 998 para R$ 400.
Citando parcelas da população como as trabalhadoras domésticas, os terceirizados e terceirizadas, bem como os trabalhadores informais como os camelôs, Talíria Petrone denuncia o que caracteriza como “desmonte racista do Estado”. “A reforma da Previdência é também uma forma de matar o povo negro”, diz.
De quem é o lucro?
O governo brasileiro alega que uma “reforma” no sistema é necessária, pois há um rombo na Previdência que, em alguns anos, pode fazer com que o montante gasto com a política no país seja insustentável para as contas públicas.
Benedita da Silva (PT-RJ), Talíria Petrone (Psol-RJ), Áurea Carolina (Psol-MG). Foto: Pedro Borges.
Dados oficiais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mostram que a dívida com o INSS passaram de R$ 174,9 bilhões para R$ 476,7 bilhões, de 2008 para 2018. Já Procuradora Geral da Fazenda Nacional tem uma lista com as 500 maiores devedoras da Previdência Social. O levantamento, com dados até 2016, inclui grandes empresas, bancos estatais e privados, entre outros.
De acordo com os números, a Varig, empresa área falida em 2006, deve cerca de R$ 3,713 bilhões. Companhias ativas e com poder significativo dentro do mercado como a mineradora Vale, tem dívida de R$ 275 milhões, a JBS, déficit de R$ 1,8 bilhão, e o Bradesco, de R$ 465 milhões.
Para Talíria Petone, a conta é criada pelos milionários e bilionários no país, que será paga pelo povo negro, pobres, mulheres, e gerará lucro para os bancos. “É um desmonte. É transformar a possibilidade de se aposentar, que hoje é um direito, em algo para os bancos, sempre na lógica da capitalização”, afirma.
Mais do que perdoar a dívida dos multimilionários no Brasil, a reforma da Previdência deve gerar lucros importantes para os bancos. Estudo realizado pela revista Dinheiro calculou que em 35 anos, o sistema de capitalização dos bancos geraria um patrimônio de R$ 54 trilhões, ou seja, um faturamento anual em média de R$ 388 bilhões.
Vulnerabilidade
A reforma na Previdência, no formato apresentado, com a possibilidade de lucro para os bancos, perdão para a dívida das grandes empresas e corte de direitos sociais tende a recair sobre os grupos sociais mais marginalizados e vulnerabilizados dentro do mercado de trabalho.
O impacto dessas medidas deve ser mais sensível para os grupos inseridos no mercado de trabalho de maneira mais informal, como é o caso dos negros, segundo Benedita da Silva.
“A reforma da previdência, que somada a reforma trabalhista, tira a possibilidade de nós termos o sonho de se aposentar. Imagine quem tem uma avançada idade e que só depois de muito tempo pôde assinar a carteira de trabalho, como é o caso das domésticas”, diz
As estatísticas mostram que mulheres e homens negros estão inseridos dentro do mercado de trabalho de maneira mais informal, o que dificulta a possibilidade de receber todos os encargos sociais.
Estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e a ONU Mulheres mostrou que em 2015, o Brasil tinha registrado o número de 6,2 milhões de empregadas domésticas no país, sendo que 5,7 eram mulheres. Dessas, 3,7 eram pretas ou pardas.
Benedita da Silva acredita que o povo negro já sinta os efeitos desse processo. “A maioria da população negra está desempregada com essa economia brasileira que leva recurso para quem já tem. Nós já estamos vendo famílias negras inteiras dormindo na rua. Inteiras! Da criança, à mãe e ao pai. [Eles] Perderam suas casas porque não tiveram condições de pagar porque perderam o emprego”, explica Benedita.
Outro fator que se soma a essa condição é a menor expectativa de vida para esse segmento social. Pesquisa publicada pelo IBGE apontou que em 2015, a liderança da expectativa de vida no país era do estado de Santa Catarina, com média de 78,7 anos entre homens e mulheres. A última posição ficava com o estado do Maranhão, com média de 70,3 anos.
O estado de Santa Catarina tem 83,97% de população autodeclarada branca, o que o concede a posição de estado mais branco da nação, proporcionalmente. O Maranhão, por outro lado, é o terceiro mais negro, com 76,2% da população preta ou parda, atrás somente dos estados do Pará, com 76,7% e Bahia, 76,3%.
Áurea Carolina, de Minas Gerais, afirma que a proposta é antidemocrática e anti-povo. “Para a população negra tem todo esse agravante, que já é ser uma medida anti-povo, antidemocrática, mas que produz sobre nós uma piora das condições de vida, um empobrecimento, e a nossa morte gradual”, diz.
Além disso, a deputada acredita que a medida proposta pelo governo desconsidera a opinião dos movimentos sociais. “A reforma da Previdência atinge as populações que estão em condição de maior vulnerabilidade nesse momento crítico no Brasil, em que as políticas públicas de assistência social, saúde, segurança, todas aquelas que podem assegurar direitos básicos, estão sendo desmontadas num processo muito acelerado de desinvestimento”, pontua.