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Baile da Vogue investe em convidados negros e gera nova polêmica sobre racismo

26 de março de 2019

É válido criticar as pessoas pretas que foram ao Baile? O que é mais estratégico: ocupar os espaços ou boicotar?

Texto / Sheila de Oliveira
Imagem / Reprodução / Instagram / @alexandraloras

O debate sobre racismo e representatividade na revista Vogue, considerada a publicação de moda mais influente e conceituada do mundo, voltou à tona após a realização do Baile da Vogue 2019, no dia 23 de março, em São Paulo (SP), da qual participaram dezenas de homens negros e mulheres negras.

Isso porque a revista foi duramente criticada após a festa de aniversário, em fevereiro, da ex-diretora da revista no Brasil, Donata Meirelles, que pediu demissão após o episódio no qual foi acusada de ser racista.

Além de ter resultado na saída da executiva, a comemoração com decoração que lembrava ao período colonial, remetia à escravidão e usava uma cadeira de candomblé como adereço para os convidados tirarem fotos, foi responsável pelo adiamento do tradicional Baile que sempre acontece uma semana antes do início do Carnaval.

“Com o objetivo de transformar o Baile de Gala da Vogue numa plataforma de inclusão no universo da moda, a Vogue entende que precisa de tempo hábil para implementar ações importantes e garantir que o baile seja efetivamente um marco deste novo momento”, disse a revista, em nota oficial.

Porém, o site Meio & Mensagem informou no dia 15 de fevereiro, que a editora Globo Condé Nast, responsável pela revista, adiou a festa devido ao desconforto dos patrocinadores por causa dos acontecimentos envolvendo a ex-diretora.

“As marcas que já estavam confirmadas no evento demonstraram incômodo ao ter sua imagem vinculada à revista neste momento conturbado”, pontuou o texto, se referindo, especialmente, às marcas que trabalham com as plataformas de diversidade e representatividade.

Outro ponto questionável nas reais intenções da Vogue se refere ao tema do Baile 2019 – “Opera D’Oro” – uma homenagem aos grandes impérios da história, que usavam o ouro como adorno e cultuavam o metal.

Uma análise histórica mais sensível, empática e comprometida mostra que esses grandes impérios só existiram graças à trajetória de dor, sofrimento e exploração de negros e negras escravizados nas minas de ouro no Brasil.

Diante de tudo isso, surgiram uma série de questionamentos: a Vogue está de fato engajada nesse novo perfil de inclusão? É válido criticar as pessoas pretas que foram ao Baile? Ir à festa diminui a luta antirracista? O que é mais estratégico: ocupar os espaços ou boicotar? Cobrar de pessoas negras determinadas posturas também não é racismo na medida que negamos a humanidade delas?

Pontos de vista

O ‘novo momento’ da Vogue, segundo uma pessoa negra que esteve no Baile e não quis ser identificada, não se limita ao Baile. Segundo ela, a empresa mandou embora funcionários que foram favoráveis à festa de aniversário de Donata, está realizando uma parceria com a EmpregueAfro para que a revista tenha diversidade étnico-racial em seus quadros e irá promover treinamentos com os empregados para falar de preconceito racial, cotas, entre outros temas.

“A polêmica só acontece porque algumas pessoas não entendem a importância de a empresa se abrir ao diálogo com os negros após a repercussão da festa de Donata”, afirma.

De acordo com a pessoa convidada, é preciso afinar a pauta negra, estreitar os laços com as empresas e garantir a inclusão de pretos e pretas em espaços de visibilidade que sempre foram ocupados majoritariamente por brancos ricos.

“Estamos sempre reivindicando avanços para a negritude e quando somos ouvidos não deveríamos dialogar?”, questiona. “Não se trata apenas do Baile, mas sim de como estar na estrutura, fazendo networking necessário para construir oportunidades. Precisamos usar os nossos aliados que estão no poder, mesmo que recém chegados, na luta contra o racismo”, completa.

Há pessoas que discordam deste posicionamento. Para o escritor Hamilton Borges, por exemplo, a Vogue é racista e o Baile tem o DNA da “Casa Grande”, onde, segundo ele, os negros e negras não passam de mais uma mercadoria.

O escritor já havia feito duras críticas à festa de aniversário da ex-diretora da revista, chamando de “farra neocolonial de uma branquitude estúpida e sem noção, nostálgica da escravidão, servidão e zombaria”.

Segundo Hamilton, os negros deveriam lutar para criar seus próprios espaços e não ficar correndo para serem aceitos nos locais brancos privilegiados, colaborando para limpar a barra da empresa que faz uma política cosmética e de fachada. “O que precisamos é ter outro tipo de debate que diga claramente qual a direção de luta racial nós queremos”, defende.

Por fim, o escritor reforçou o que já havia expressado diante da polêmica que tomou conta da internet após o aniversário de Donata em Salvador (BA). “Muita gente ainda estranha quando a gente fala que existe um sistema de supremacia branca que precisa ser combatido de forma direta e sem tréguas. Quando anunciamos que não precisamos dessa representação fajuta de ter meia dúzia de pretos com os mesmos trejeitos da elite, provando que ‘podemos chegar lá’, quando optamos por fazer uma militância desde o chão das ruas, das cadeias e favelas, muita gente franze a testa”, conclui.

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